“Faz um pix” incorporou-se rapidamente ao vocabulário econômico das ruas. A ponto de, no ano passado, de todas as transações de pagamento – excluídas as feitas em espécie –, 39% terem sido por meio dessa modalidade, crescimento de 75% em relação ao ano anterior. São 151,2 milhões de pessoas que utilizam a solução. Contingente que supera a população da Rússia (145 milhões) e deixa a ‘Nação Pix’ como o nono maior país do planeta. No mundo corporativo, há 14,6 milhões de empresas que usam a tecnologia. Os dados são do Banco Central (BC). Apenas em junho, foram registradas 5,3 bilhões de transações, 60% a mais do que em igual mês em 2023, movimentando quase R$ 2,2 bilhões.
Não se trata apenas de crescimento. E sim de um crescimento vertiginoso: foram realizadas 176 milhões de transações via Pix em 2020 (ano de implementação do sistema, que começou a funcionar em novembro). Depois foram 9,4 bilhões (2021), 24 bilhões (2022) e quase 42 bilhões (2023). Assim, em três anos, a quantidade de operações aumentou 238 vezes. O Pix já praticamente empata com os cartões (créditos, débito e pré-pago), cujas transações representaram 41% do total no ano passado. Embora ainda lidere, o mercado de cartões não segue no mesmo ritmo do Pix. Na modalidade crédito, por exemplo, o crescimento foi de 12%. No débito, 5%.
No total, as transações eletrônicas no Brasil em 2023 somaram 108,7 bilhões – 624 per capita, atingindo R$ 99,7 trilhões. Ou nove vezes o PIB (R$ 10,9 trilhões em 2023, segundo o IBGE). A digitalização dos meios de pagamento reflete, obviamente, no lado oposto. O uso de cheque recua continuamente. Assim como o de boletos, que caíram de 7% para 5% do share. No caso do dinheiro físico em circulação, em 31 de julho deste ano, também segundo o BC, havia 7,6 bilhões de cédulas nas mãos dos usuários ou nos bancos (somando R$ 339,5 bilhões). Em igual data de 2020, o ano de nascimento do Pix, eram 8,3 milhões de notas (R$ 338,5 bilhões), retração de 8,4%.
O BC já informou que as primeiras notas de Real, lançadas em 1994, na criação do plano, vão sair de circulação. As cédulas da segunda tiragem, surgidas a partir de 2010, um pouco menores e com acréscimo da de R$ 200, continuarão circulando normalmente. Em 31 de julho, havia 148,6 milhões de notas de R$ 1 – o segundo menor volume, mais apenas que as de R$ 200 (144,4 milhões). Havia ainda 1,9 bilhão de cédulas de R$ 100, 1,7 bilhão de notas de R$ 50 e R$ 1,6 bilhão das de R$ 2. Em menor quantidade, as de R$ 20 (713 milhões), R$ 5 (689 milhões) e R$ 10 (673 milhões). Segundo a Casa da Moeda e o BC, neste ano serão produzidas 1,5 bilhão de cédulas e 942,5 milhões de moedas. A única nota que terá redução na quantidade fabricada é a de R$ 50 (192,5 milhões). E as maiores quantidades serão para as de R$ 100 (458,9 milhões) e R$ 2 (263,4 milhões).
TOKENIZAÇÃO – Num caminho sem volta, a digitalização dos modelos de pagamentos mostrou-se integralmente bem aceita pelos brasileiros. O Pix foi lançado de forma oficial em 16 de novembro de 2020. “O que muda com a chegada do Pix? Primeiro, a inclusão financeira, Segundo, uma competição no sistema financeiro nacional que gera a oferta de novos produtos. Depois, podemos falar de eficiência e segurança”, disse na ocasião o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Em 30 de junho deste ano, último dado disponível no site do BC, havia 765,5 milhões de chaves Pix, sendo 728,4 milhões pertencentes a pessoas físicas. Ao fazer apresentação em 24 de julho no Blockchain Rio, evento de tecnologia e inovação, Campos Neto também usou o termo tokenização para se referir à agenda de inovação promovida pelo BC para um sistema financeiro cada vez mais digitalizado. Isso inclui o Drex, projeto de moeda digital desenvolvido pelo banco. No mesmo evento, Campos Neto disse que o BC não pretende acabar com as notas físicas, mas que é preciso oferecer opções.
No caso do Pix, a ideia surgiu e se desenvolveu em 2018, quando o BC estava sob o comando de Ilan Goldfajn, atual presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). “Você vê que o Pix é o contrário do [Paul] Volcker, é exatamente o contrário, é para não precisar do dinheiro, você não precisar nem do caixa”, disse Goldfajn durante edição de 2021 do programa O Sistema Financeiro em Debate, promovido pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE-UFRJ). Ele se referia a comentário do economista Paul Volcker, ex-presidente do Federal Reserve (FED), o BC dos Estados Unidos, que destacou a inovação trazida pelos caixas eletrônicos, permitindo às pessoas sacar dinheiro em locais públicos. “Tudo indica que em algum momento a gente vai prescindir do dinheiro físico”, afirmou à época Goldfajn.
A segurança ainda é uma preocupação no uso do Pix. No último dia 22 de julho, o BC anunciou mudanças nas regras do sistema, incluindo uma que prevê limite de R$ 1 mil para transações diárias (até R$ 200 por operação) no caso de dispositivos de acesso não cadastrados, que nunca foram usados para realizar uma transação via Pix. Isso valerá a partir de 1º de novembro. Além disso, o BC aprovou nova data (16 de junho de 2025) para o lançamento do Pix Automático, para cobranças recorrentes. Nessa modalidade, o usuário permite débitos periódicos sem necessidade de autenticação cada vez que for efetuar um pagamento.
Mais um passo numa solução sem volta. Um exemplo é o clássico paulistano Bar e Lanches Estadão, tradicional ponto na região central de São Paulo, aberto em dezembro de 1968. “Dinheiro está entrando muito pouco. Raríssimas vezes alguém paga em espécie”, afirmou o gerente do estabelecimento, Rogério César. Ali, segundo ele, ainda predominam os pagamentos com cartões (débito e crédito): 70% do total. Os clientes que pagam em dinheiro são no máximo 10%, metade dos que utilizam o Pix (20%). O bar Estadão tem como lanche mais pedido o sanduíche de pernil – são vendidas até 1,5 mil unidades por dia, a R$ 28 cada. O prato está prestes a se tornar Patrimônio Cultural Imaterial da cidade, conforme o Projeto de Lei (PL) 18/2022, já aprovado em primeiro turno no plenário da Câmara Municipal. E dá para pagar no Pix.