O libanês Arab Chafic Zakka ainda era um menino de 6 anos quando começou a pensar que gostaria de ser um comerciante, como o pai. Nessa mesma época, sua família deixou o Oriente Médio para tentar a vida no Brasil, onde seu sonho de criança se tornaria realidade. Em 1978, Zakka abriu sua primeira loja. Batizada de Preçolândia, ficava na Zona Leste de São Paulo e foi criada, segundo seu fundador, com a proposta de ser um lugar bonito e que tivesse produtos variados, de qualidade e a preços baixos. Hoje, 46 anos depois, a empresa tem 700 funcionários e 44 lojas espalhadas por dez estados do Brasil.
E esses números poderiam ser ainda melhores, não fosse a Covid, que assombrou o mundo de 2020 a 2022. Antes da pandemia, a Preçolância tinha 50 unidades e 1 mil colaboradores. Ou seja, a crise causada pelo coronavírus provocou uma queda de 12% no número de lojas e de 30% na equipe. Nesta entrevista exclusiva concedida à DC NEWS, Zakka, 80 anos, destaca o período da pandemia como o pior momento da história para os comerciantes, critica a postura do Governo Federal em relação aos varejistas e fala sobre as mudanças causadas pelo e-commerce. “Chegamos a vender no online quatro vezes mais do que a nossa melhor loja”, disse.
DC NEWS – Muitas empresas afirmam que ainda sofrem os efeitos da pandemia. Como o senhor analisa essa situação?
Arab Chafic Zakka – Nós estávamos com 50 lojas e mil funcionários antes da Covid-19. Agora, temos 44 unidades e 700 colaboradores. Tivemos de passar por uma grande reestruturação durante os últimos anos e fechar lojas mais caras e menos rentáveis. Três pontos da história foram muito ruins para o varejo: a hiperinflação, [a partir de] 1979; o Plano Cruzado, em 1986; e o pior de todos, a pandemia, em 2020.
DCN – Há planos para ampliar a presença física da Preçolândia?
Zakka – Hoje, temos lojas em dez estados – Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe. A gente quer chegar a outros estados, mas com a pandemia os negócios mudaram bastante. O virtual ganhou força e tivemos de nos adequar. Estamos trabalhando para recuperar o faturamento e, assim, retomar os planos de expansão.
DCN – Qual o faturamento da Preçolândia e de quanto foi essa queda?
Zakka – Nós não divulgamos essa informação. Mas posso dizer que o difícil, hoje, não é o faturamento. É o resultado. Você faz uma promoção e fatura, mas o resultado é que está difícil atualmente. A pandemia já passou faz dois anos e ainda estamos no processo de recuperação. Ficamos muito tempo fechados. Por isso, os comércios começaram a pedir dinheiro emprestado e perderam o controle sobre as dívidas, ainda mais com os juros altos. Muitos varejistas estão pedindo Recuperação Judicial. Na Preçolândia, nunca pedimos empréstimos bancários, até a pandemia chegar. Felizmente, conseguimos retomar as rédeas da situação e estamos nos recuperando.
DCN – Com o varejo online cada vez mais forte, como a Preçolândia se adaptou?
Zakka – Com a pandemia, a gente teve de enfrentar o fornecedor que foi para a internet, o fechamento das lojas, o ladrão de carga que vai para internet vender produtos roubados, o pessoal que sonega imposto. O site da Preçolândia vivia da lista de casamentos, mas quando acabou [a pandemia] a gente começou a trabalhar em cima dele. E isso leva tempo. Só agora estamos sentindo que o nosso faturamento está crescendo. Chegamos a vender no online quatro vezes mais do que na melhor loja. Por isso, estamos investindo no nosso market place e fizemos um aplicativo. Hoje, o site da Preçolândia tem o preço mais baixo do país. Estamos com um preço muito competitivo, tentando trazer o maior número de parceiros possível.
DCN – E como manter um preço competitivo?
Zakka – A gente fez um cálculo. Se a gente perder um porcentual da rentabilidade e aumentar o faturamento em 15%, 20%, 30%, ele é compensado, porque eu não estou deixando o custo subir. Se você vende mais, paga mais imposto. Mas quando você vende mais barato, paga menos imposto. Outra coisa é que nós temos tudo montado. Então, estamos usando esse potencial. Fizemos uma redução de preços para chegar ao volume de vendas que a gente tem como objetivo. Com um site barato, a gente atrai pessoas de outros players.
DCN – Quem são os maiores concorrentes da Preçolândia?
Zakka – A nossa empresa é 100% formal e temos de enfrentar uma concorrência totalmente desleal. Há grandes portais que não são fiscalizados pelo governo. Por isso, podem vender mercadoria roubada, sem nota. O governo agora está fazendo o favor de botar 20% para produtos importados de até US$ 50. Essa gente não tem os encargos que nós temos, não precisa cumprir as normas rígidas do Inmetro para que o produto seja comercializado. Só de imposto de importação, pagamos 20%, mais 18% de ICMS, 9,25% de PIS-Cofins e de 10% a 15% de IPI. Eu acho que o governo não sabe dessas coisas. Se quer que eu venda mais barato, é só tirar os meus impostos.
DCN – Como o senhor avalia as ações do Governo Federal para o varejo?
Zakka – (Jair) Bolsonaro não me agrada nem um pouco. Não gosto da extrema direita e não concordo com os projetos deles. Por outro lado, também não está dando para concordar muito com Lula atualmente. No atual governo, ele está falando muita bobagem, arrumando muita encrenca e não está governando. Ele só está batendo boca com o Banco Central, com o (Javier) Milei (presidente da Argentina). O governo bom foi o de Michel Temer. A gente cresceu acima da média, havia segurança jurídica. Os dois anos e meio de Temer foram bons. Os quatro anos de Bolsonaro foram ruins e esse início de Lula está mal. Eu não espero nada do Governo Federal. Até agora, em mais de 60 anos trabalhando no comércio, eu nunca vi um governo do Brasil fazer algo pelos varejistas.