Disputa entre governo e TCU pode atrasar ainda mais leilão de megaterminal

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma disputa entre governo federal e TCU (Tribunal de Contas da União) pode atrasar ainda mais o leilão do Tecon 10, o megaterminal do porto de Santos.

Segundo pessoas próximas ao tribunal, ministros da Corte se irritaram com a disposição do Executivo em realizar a licitação em fase única. A informação foi publicada pela Folha de S.Paulo no último sábado (22).

A contrariedade é porque o governo não poderia escolher uma modelagem de edital rejeitada pelo TCU. Se fizer isso, de voltar ao Tribunal com suas novas diretrizes e política pública. O assunto teria de ser novamente analisado pelos ministros.

A consequência seria retardar de maneira significativa a concessão do ativo. O leilão não será realizado neste ano, como o Ministério de Portos e Aeroportos planejava.

Conforme reportagem da Folha de S.Paulo mostrou, pessoas ligadas à Casa Civil defendem a realização do leilão em apenas uma fase, o que tem contrariado o TCU.

O assunto está em discussão na Corte. A decisão foi adiada após pedido de vista do ministro Augusto Nardes. A tese do ministro Bruno Dantas, revisor do projeto, deve sair vencedora. Seu parecer é que o leilão aconteça em duas rodadas. Na primeira, estaria vetada a participação de armadores que possuem terminais no complexo portuário.

É uma versão bem parecida com a recomendação da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), mas o órgão regulador propõe que, na fase inicial, todos os interessados que tenham ativos em Santos estejam barrados, sejam armadores ou não.

A avaliação de participantes do mercado é que apenas os armadores, empresas de grande porte e donas de navios, teriam condições financeiras para administrar o Tecon 10. A expectativa é que o megaterminal movimente a metade da carga do maior porto da América Latina.

Se prevalecer, a restrição excluirá do certame algumas das principais companhias do planeta no setor, como Maersk, MSC (sócias no terminal BTP) e a CMA CGM (dona da Santos Brasil).

A sessão para que o relator, ministro Antonio Anastasia, apresentasse seu parecer, aconteceu na última terça-feira (18). O placar até o momento é de 3 a 1 a favor da tese de Dantas. O ministro Jorge Antônio de Oliveira falava que iria pelo mesmo caminho, mas foi interrompido pelo presidente do Tribunal, Vital do Rêgo Filho. A definição poderá ser no próximo dia 8.

Ao sair da Corte, a recomendação de modelo vai para a Antaq, que vai elaborar o edital, no prazo que lhe for conveniente e publicá-lo no Diário Oficial. O leilão pode acontecer 30 dias úteis após a publicação.

A posição do TCU é que o governo não pode, na reta final do processo, ter um mero ato de vontade. Irritaram ainda mais afirmações de que o conselho do PPI teria a palavra final e soberana porque é comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O raciocínio da corte é que a Antaq é a agência reguladora do governo federal, com competência para definir a modelagem do certame. É baseado nisso que o TCU tem deliberado. Ignorar a recomendação da Tribunal seria visto como um desprestígio.

“[Se o governo optar por fase única] Tem de passar de novo pelo TCU. Quem tem competência para fazer o desenho desse processo de licitação é a Antaq. O PPI não tem competência para alterar o modelo da Antaq, que tem a decisão soberana”, afirma Vera Monteiro, professora de Direito da FGV (Fundação Getúlio Vargas), em São Paulo.

“A característica do TCU tem sido participar desses desenhos licitatórios antes de o edital ser publicado. Isso tem acontecido por um jogo de poder na esfera federal.”

Há ministros, apurou a reportagem, que chegaram a cogitar mudar o voto na sessão do próximo dia 8.

O TCU tem a prerrogativa de recomendar ou determinar como será o edital. Neste caso, por enquanto o tribunal tende a fazer uma recomendação. Segundo a reportagem apurou, alguns ministros cogitaram transformar o edital em uma determinação, depois de conversas internas, decidiram manter apenas a recomendação, a partir do entendimento que, se a modelagem aprovada em plenário no TCU não prevalecer, caberia medida cautelar para suspender o leilão.

Segundo a assessoria do Tribunal, recomendações estão relacionadas a oportunidades de melhorias no processo administrativo, sendo a implementação facultativa. Em setembro, o ministro Benjamin Zymler disse ser praxe do governo acatar essas recomendações.

As determinações têm natureza impositiva e devem ser cumpridas em um prazo determinado. A questão é resolvida em plenário pelos nove ministros da corte.

O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, já havia dito que a opinião do Tribunal seria respeitada. Ele se disse surpreso com a possibilidade de mudança de postura do governo federal.

“Se for uma recomendação, não há vinculação. Resta ao concedente [o governo federal] adotar o caminho de modelagem que entenda ser mais adequado, desde que devidamente justificado”, diz o advogado Fernando Bernardi Gallaci, especialista em infraestrutura, regulatório e negócios governamentais da SouzaOkawa Advogados

Uma das possíveis explicações cogitadas pelo governo está em pareceres do Ministério da Fazenda e da área técnica do próprio TCU: a de que medidas para preservar a concorrência, como a venda de ativos que o vencedor tenha em Santos, seria suficiente para evitar concentração de mercado.

O Ministério Público para o TCU chegou a considerar ilegal o leilão em duas fases.

O QUE É O TECON 10

O megaterminal será instalado em uma área no bairro do Saboó, em Santos, de 622 mil metros quadrados. O projeto é que seja multipropósito, movimentando contêineres e carga solta. O vencedor do leilão será definido pelo modelo da maior outorga: ganha quem oferecer mais dinheiro pelo direito de construí-lo e operá-lo.

A capacidade vai chegar a 3,5 milhões de TEUs por ano (cada TEU representa um contêiner de 20 pés, ou cerca de 6 metros). Será o maior terminal do tipo no país.

Serão quatro berços, como são chamados os locais de atracação do navio para embarque e desembarque. A previsão de investimento nos 25 anos de concessão pode chegar a R$ 40 bilhões.

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