Em setembro de 1975, Olavo Setúbal, então prefeito paulistano, anunciou uma grande desapropriação de imóveis – 944 – em uma área de 178 mil metros quadrados, nas áreas da Sé, Brás e Mooca, para a Companhia do Metropolitano. O total era de 300 milhões de cruzeiros, ou R$ 223 milhões na moeda atual. Os impactos das obras do Metrô, inicialmente, assustaram moradores e comerciantes. Na praça Clóvis Beviláqua, por exemplo, alguns bares fecharam as portas depois que os terminais de ônibus foram retirados. Décadas depois, não se imagina uma cidade como São Paulo sem Metrô, mas
aumentar a oferta de transporte público ainda é um desafio.
“Não há como medir o impacto da criação do Metrô em São Paulo, mas não há dúvida de que ele foi importante para o desenvolvimento urbano e para o bem-estar da população.
Como ele foi implementado gradativamente em cada região, não foi possível estimar o quanto sua chegada impactou esses locais. O mais importante é destacar que atualmente sem o Metrô a cidade entraria em colapso, pois sua estrutura viária não suportaria a quantidade de veículos necessária para atender a população”, afirmou o economista-chefe do Instituto de Economia Gastão Vidigal da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Marcel Solimeo.
Para o mercado imobiliário, a diferença é evidente. Mas segundo o presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo (CreciSP), José Augusto Viana Neto, o impacto varia bastante conforme a região: “Em muitas regiões, foi grande, positivo, em algumas neutro e em outras tremendamente negativo”.
Ele destaca “evolução muito grande” em áreas próximas às estações Ana Rosa e Vergueiro, “principalmente escritórios e lojas comerciais”. Ou no entorno da Linha 4-Amarela: “Ali o comércio em volta se beneficiou bastante”. Por outro lado, o presidente do Creci considera que a região da Praça da Árvore, entre as ruas Luís Góis e Sena
Madureira, “até hoje não se recuperou”.
Entre prós e contras, o balanço é positivo. Do ponto de vista da valorização, Augusto Viana disse que um apartamento mais barato (em torno de R$ 300 mil) em prédios simples (sem equipamentos adicionais como academias), tem uma diferença para cima de pelo menos 30% se estiver a até 500 metros de alguma estação do Metrô. “Você tem uma liquidez tremenda, inclusive na locação.”
EMPREENDIMENTOS – Não há como estabelecer uma relação direta, mas o número de estabelecimentos abertos cresceu nos primeiros anos de Metrô. Segundo dados colhidos na Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp), de 1971 a 1974 o total oscilou entre 87 e 89 empreendimentos registrados por ano. Subiu para 117 em 1975 e continuou aumentando até 1979 (247). E recuou nos dois anos seguintes, período de recessão econômica.
“Para o comerciante, especialmente de determinados tipos de produto, é uma grande vantagem a localização perto do Metrô, uma vez que quanto maior o fluxo de pessoas que transita na região, maior é a probabilidade de vendas”, disse Solimeo. “Mesmo com o aumento do aluguel, no geral deve ser vantajosa a localização. É uma questão de mercado.”
Estudo lançado em 2013 mostrou que a maior oferta de Metrô tem impacto direto na economia e na qualidade de vida. Mas o transporte público não acompanha o crescimento populacional. “O sistema de Metrô de São Paulo poderia produzir efeitos mais amplos, estendendo-se além das divisas regionais, com efeitos positivos para o Estado e o país”, afirmaram os responsáveis pelo estudo The Underground Economy: Tracking the Wider Impacts of the São Paulo Subway System (A Economia Subterrânea: Rastreamento dos Impactos Mais Amplos do Sistema de Metrô de São Paulo), conduzido pelo professor Eduardo Haddad, do Departamento de Economia da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
De acordo com o trabalho, que não teve atualização, sem Metrô o país perderia em torno de 0,6% do PIB. Apenas a cidade de São Paulo deixaria de produzir aproximadamente R$ 6 bilhões. De acordo com os organizadores, o estudo considerou, basicamente, a produtividade dos trabalhadores, influenciada pela mobilidade. Um sistema indispensável para paulistanos e trabalhadores de outros municípios que se deslocam diariamente até a capital.
No ano passado, os paulistanos gastaram, em média, 2 horas e 26 minutos para se deslocar pela cidade. Praticamente o mesmo do período pré-pandemia – apenas um minuto a mais do que em 2019. Os dados são da pesquisa Viver em SP: Mobilidade Urbana, da Rede Nossa São Paulo e do Instituto Cidades Sustentáveis.
CARROS – Tirar o carro da garagem está longe de ser solução: pela primeira vez em cinco anos, o tempo médio de deslocamento de quem usa automóvel (2 horas e 46 minutos) foi maior do que o gasto pelos usuários de transporte público (2 horas e 23 minutos). Ainda assim, o transporte individual cresce mais que o coletivo. Em 1967, no pré-Metrô, 68,1% das viagens motorizadas na região metropolitana eram coletivas e 31,9%, individuais. Cinquenta anos depois, em 2017, essas participações foram de 54,1% e 45,9%, respectivamente, de acordo com a Pesquisa Origem e Destino, da própria Companhia do Metropolitano.
A ideia de implementar transporte sobre trilhos foi exposta no chamado Plano Nacional de Viação (PNV), de 1964, que incluía a L-50, linha Domingos de Morais-Mandaqui-Jaçanã, espécie de precursora de Norte-Sul, atual Linha 1-Azul. Já se falava em acabar com o serviço de bondes na capital, que começava a viver a onda do automóvel. Nesse período, o crescimento do município de São Paulo foi acelerado: de 2,1 milhões de habitantes em 1950, a cidade chegou a 5,9 milhões em 1970, aumento de 180%.
O último bonde circulou em São Paulo em março de 1968. Um mês depois, foi constituída a Companhia do Metropolitano. Logo, os automóveis passaram a tomar conta das ruas. Em 1975, quando o Metrô fazia suas primeiras viagens, o país inteiro tinha uma frota de
pouco menos de 6 milhões de veículos. No ano passado, apenas a capital paulista concentrava 9,5 milhões.
“Com isso, foi possível criar a Companhia do Metropolitano e implantar a primeira linha. Que não foi tanto para atender a população, mas para tirar os bondes de circulação e facilitar o trânsito de automóveis”, disse a professora Andreina Nigriello, formada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e autora do livro O Desenho de São Paulo por Seus Caminhos (Editora Cultura Acadêmica, 2024). Para ela, ainda hoje faltam arcos que liguem as periferias da metrópole, sem
necessidade de passar pelo Centro, além de mais linhas de Metrô.