Grupo de Haia age para empurrar Israel ao banco dos réus por guerra em Gaza

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma reunião recente do Grupo de Haia, formado por Colômbia, África do Sul e outros seis países em desenvolvimento para atuar contra a guerra de Israel na Faixa de Gaza, pode ajudar a normalizar a opinião de que o que acontece no território palestino é um genocídio, afirma o professor de direitos humanos da London School of Economics e especialista em direito internacional Alonso Gurmendi.

“Quanto mais isso acontecer, mais fácil será para a Corte Internacional de Justiça (CIJ) também reconhecer essa realidade”, afirma Gurmendi, em referência à ação movido pela África do Sul que acusa Israel de genocídio no órgão judiciário da ONU. O Brasil anunciou na última segunda-feira (14) que vai aderir ao processo.

Os membros do Grupo de Haia, formado em janeiro com o objetivo de pressionar Israel e proteger a atuação da CIJ de ataques, reuniram-se na terça-feira (15) e quarta-feira (16) em Bogotá. O evento contou com a presença de países como Brasil, China, Irlanda, México, Noruega, Espanha, Portugal, Líbia e Turquia, entre outros, na condição de observadores. O grupo tem como membros oficiais Bolívia, Cuba, Honduras, Malásia, Namíbia e Senegal, além de Colômbia e África do Sul.

Ao final do encontro, os membros oficiais do grupo assinaram um comunicado com medidas contra Israel que incluem um embargo de armas e produtos que possam ser utilizados com fins militares, incluindo combustível. Também prometeram rever parcerias públicas com empresas israelenses que atuem nos territórios palestinos ocupados.

A Folha apurou que o governo brasileiro vê a iniciativa do Grupo de Haia com bons olhos, mas que não há previsão de se juntar a ele formalmente.

A avaliação de pessoas com conhecimento do assunto ouvidas pela reportagem é de que o Brasil não está bem aparelhado, nesse momento, para executar ações como o embargo de exportações que podem ser usadas pelas Forças Armadas israelenses —o país vende petróleo para Israel, por exemplo.

Questionado sobre o encontro, o embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, disse que seu país não comete genocídio em Gaza. “Lamentamos que pessoas não envolvidas [no conflito] estejam se ferindo, e tentamos evitar atingir [civis]”, afirmou.

Para Gurmendi, a pressão do Grupo de Haia pode criar condições que favoreçam o trabalho da CIJ. “Há uma discussão legal e política. Você pode ter a razão jurídica do seu lado, mas os atores da comunidade internacional são entidades políticas que fazem cálculos políticos, e seu posicionamento pode mudar de acordo com o momento. Falar de direitos LGBTQIA+, por exemplo, é diferente hoje do que era nos anos 1990. O direito internacional não mudou, quem mudou fomos nós.”

A professora de relações internacionais e especialista em Oriente Médio Monique Sochaczewski, por sua vez, diz que a iniciativa do Grupo de Haia é bem-vinda, mas que dificilmente terá força para pressionar Israel.

“No cenário atual, parecemos estar de volta ao mundo do século 19, no qual só quem tem força militar atua. Por isso, acredito que o governo Donald Trump é um dos poucos que têm hoje impacto para pressionar [o premiê israelense] Binyamin Netanyahu, além de alguns países europeus, sobretudo França, Reino Unido e Alemanha” para que a guerra em Gaza termine, analisa.

Por outro lado, Sochaczewski diz que esse momento pode estar próximo. “A guerra perdeu a razão de ser, e acabar com o Hamas [objetivo declarado de Netanyahu] é inviável. Devemos ter um cessar-fogo em breve, até para que o projeto de Trump de normalizar relações entre Israel e as monarquias árabes do Golfo Pérsico se concretize.”

A professora diz ainda que, quando houver um cessar-fogo duradouro e a liberação da entrada de jornalistas e organizações de direitos humanos em Gaza, o nível de devastação será melhor compreendido, o que levará a mais uma virada da opinião pública internacional contra Israel.

“O sofrimento dos civis em Gaza é imenso, e vamos entender isso melhor quando a guerra acabar. Nesse momento, a situação internacional de Israel ficará ainda mais sensível”, afirma.

O encontro do Grupo de Haia em Bogotá contou com a presença da relatora especial da ONU para territórios palestinos, a italiana Francesca Albanese, que recentemente se tornou alvo de sanções dos EUA. Na reunião, Albanese disse que as penalidades “ultrapassaram uma linha” e são a culminação de intensos ataques contra seu trabalho.

Para Zonshine, o embaixador israelense, Albanese “já mostrou várias vezes que é anti-Israel e antissemita, e sua presença nesse fórum mostra a direção que ele toma: atacar Israel, não procurar uma solução para a situação em Gaza”. O diplomata deve deixar o Brasil em agosto, e o governo Lula não autorizou as credenciais do substituto indicado por Tel Aviv, o que deve deixar Israel sem embaixador no país.

Ao site americano JNS, o Departamento de Estado dos EUA disse que Washington “se opõe fortemente a esforços de supostos ‘blocos multilaterais’ de aparelhar o direito internacional para promover objetivos radicais e anti-Ocidente”.

“O Grupo de Haia busca minar a soberania de países democráticos ao tentar isolar e deslegitimar Israel, preparando-se, dessa forma, para atacar os EUA, nossas Forças Armadas e nossos aliados”, disse a diplomacia americana.

A representação israelense na ONU disse que os organizadores do evento, “e talvez alguns dos que participaram dele”, esqueceram-se de que a guerra em Gaza começou com o ataque terrorista de 7 de outubro, quando o Hamas matou 1.200 israelenses. “Tentar exercer pressão sobre Israel, não sobre o Hamas, é uma farsa moral.”

Países que fazem parte do Grupo de Haia

Criado em janeiro, organização tem objetivo de pressionar Israel

– Colômbia

– África do Sul

– Bolívia

– Cuba

– Honduras

– Malásia

– Namíbia

– Senegal

Países que participaram da reunião como observadores

Evento ocorreu nos dias 15 e 16 de julho em Bogotá, na Colômbia

– Argélia

– Bolívia

– Botsuana

– Brasil

– Chile

– China

– Djibuti

– Indonésia

– Iraque

– Irlanda

– Líbano

– Líbia

– Malásia

– México

– Nicarágua

– Noruega

– Omã

– Paquistão

– Portugal

– Qatar

– Eslovênia

– Espanha

– São Vicente e Granadinas

– Turquia

– Uruguai

– Venezuela

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