Com 28 incorporadoras listadas na Bolsa brasileira (B3), o setor da construção civil se mostra atrativo e só fica atrás das empresas de energia elétrica (40). O bom momento tem se refletido nos seus respectivos papéis, com destaque para a Cury. As ações da construtora, criada nos anos 1960, saltaram mais de 160% e registraram o maior retorno entre os IPOs (ofertas iniciais de ações) de empresas que estrearam na Bolsa desde 2020, segundo levantamento da Quantum Finance.
Das dez maiores altas desde 2020, o maior retorno e a única a atingir os três dígitos em valorização é a Cury (CURY3), de moradias populares, que subiu 167% desde o IPO, em maio daquele ano. Em contrapartida, uma das maiores baixas é da Alphaville (AVLL3), que despencou 95,6%. No início do ano, o banco BTG Pactual recomendou a compra de ações da Cury, devido aos bons resultados da empresa em 2023 e boas expectativas de vendas para 2024. Itaú BBVA também recomendou os papéis da construtora desde o começo do ano.
A recomendação atual do BTG para o segundo semestre, conforme relatório da companhia, é de apenas uma incorporadora, a Tenda (TEND3). Segundo o banco, há uma visão otimista no segmento de habitação de baixa renda devido a possíveis mudanças no programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), do governo federal. A promessa é da criação de uma quarta faixa no programa Minha Casa Minha Vida, para rendas familiares de até 12 mil reais por mês. Estrategicamente focada na Faixa 1 do programa (65% da base de clientes), a Tenda está posicionada para enfrentar uma demanda mais forte. Além disso, a incorporadora surpreendeu com os números do primeiro trimestre, com geração de fluxo de caixa acima do esperado.
Em seu guia para a temporada de resultados do segundo trimestre, o banco também recomenda a compra de Eztec (EZTC3), Direcional (DIRR3), Cyrela (CYRE3), Trisul (TRIS3), Lavvi (LAVV3), Melnick (MELK3), Tenda (TEND3) novamente e Cury (CURY3).
Já no Itaú BBVA, as recomendações são diferentes. No último radar de preferências de ações do banco, que indica as recomendações de ações mensalmente, só foram indicadas duas incorporadoras: Direcional e Cyrela. Segundo o Itaú, além do momento econômico favorável, a construtura passa por momento operacional saudável, com queda na duração do estoque e velocidade de vendas acompanhando a alta de lançamentos. A empresa também é beneficiada pelos baixos níveis do INCC, indicador da FGV para a construção civil. Em janeiro, o banco posicionou as ações da Cyrela como o melhor high beta (volatilidade de um ativo em relação ao mercado, para cima ou para baixo) da Bolsa brasileira.
A Direcional, outra incorporadora voltada para imóveis de baixa renda, também se beneficia dos subsídios do MCMV, além da possível mudança de faixa de renda da modalidade. Além disso, a empresa realizou um follow-on (oferta subsequente de ações) em junho de 2023, no qual captou R$ 430 milhões para acelerar lançamentos e aumentar sua presença nas praças com liderança. Com isso, o BBVA espera que a companhia siga reportando bons resultados operacionais, além de se beneficiar da forte presença em praças fora do eixo Rio-São Paulo e do nível relativamente comportado do INCC (4,42% em 12 meses, até junho).
CRESCENTE – Tudo começa na pandemia. Com o isolamento social, a demanda por imóveis aumentou e encareceu o preço do metro quadrado nas cidades. Especificamente, a valorização chegou a até 42,3% em bairros como o Itaim Bibi (Zona Sul) e 29% no Alto de Pinheiros (Zona Oeste). Foram as principais altas, conforme levantamento da plataforma Loft Analytics.
Em 2021, com a introdução das atividades remotas, a alta do IGP-M – de 35,7% entre 2020 e 2021, de acordo com a FGV – causou a fuga dos aluguéis. Além disso, a disponibilidade de crédito com juros mais baixos na época provocou o crescimento de 57,5% nos valores financiados durante a pandemia, indicado pela Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
Pouco mudou desde então. É claro que, de certa forma, a sociedade voltou ao “normal”, mas muitas empresas mantiveram a prática do home office ou instituíram modelo de trabalho híbrido para seus funcionários. Porém, o que tem movimentado o mercado imobiliário e da construção civil neste e no último ano foram os subsídios dados pelo governo para o setor, principalmente de moradias populares, assim como os cortes da Selic – agora congelada – mas que contribuem para maior acesso ao crédito imobiliário.
É o que confirma Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos. Segundo ele, as incorporadoras vivem um período positivo, impulsionado por incentivos do governo, especialmente por meio do MCMV. “A mudança de condições para atender a faixa de renda desse programa estão se tornando mais flexíveis, permitindo que mais pessoas sejam beneficiadas”, afirmou.
Em novembro do ano passado, o governo atual anunciou a intenção de criar nova faixa de renda para o programa, visando abranger a população de classe média. A nova faixa atenderia famílias com renda mensal bruta de R$ 8 mil a R$ 12 mil em áreas urbanas. A regra atual prevê renda mensal de até R$ 8 mil.
FINANCIAMENTO – “O governo demonstra compromisso em não deixar esgotar as fontes de financiamento para habitação, indicando planos de buscar recursos adicionais. Isso deve manter uma forte demanda por moradias no mercado, influenciada tanto por interesses políticos quanto pela necessidade de atender outras faixas de renda que ainda apresentam desequilíbrios na oferta de imóveis”, disse Cruz.
Segundo ele, nos últimos cinco anos, também houve crescimento significativo no número de entregas de imóveis, na venda de terrenos e em outras métricas, alinhado com a visão governamental de expandir o acesso à moradia. Outro ponto que contribui para a alta no setor e, consequentemente nos papéis da Bolsa, é o crescimento de players na região Nordeste, que estão aumentando sua oferta de imóveis de maior qualidade, refletindo tendência de modernização e expansão no setor imobiliário regional.
Outro forte ponto de influência nos papéis das incorporadoras é a taxa básica de juros, a Selic. Para Mario Mariante, analista-chefe da Planner Investimentos, esse é um dos principais desafios atuais do setor, por depender das decisões do Banco Central. “O mercado está se tornando mais seletivo devido à volatilidade e às incertezas econômicas, o que também causa a saída de investidores estrangeiros da Bolsa brasileira”, afirmou. Além da Selic, é preciso manter atenção aos indicadores de inflação, já que um aumento de custos de construção e manutenção pressionam as margens de lucro das empresas do setor.
Para os analistas, a conjuntura atual é positiva e deve continuar a impulsionar os papéis das incorporadoras. Mas a mesma volatilidade que corta a taxa de juros e gera crédito pode mudar logo, ainda mais com as dificuldades do governo no setor fiscal. Para os investidores, continua sendo uma boa aposta.
As maiores altas das incorporadoras na bolsa
Nome | COD B3 | Maior alta (últimos 5 anos) | Quando |
ALPHAVILLE | AVLL | 27,607 | 04/04/2022 |
CONST A LIND | CALI | 28,38 | 08/04/2024 |
CURY S/A | CURY | 22,08 | 15/07/2024 |
CYRELA REALT | CYRE | 27,16 | 17/02/2020 |
DIRECIONAL | DIRR | 28,04 | 15/07/2024 |
EVEN | EVEN | 13,87 | 20/01/2020 |
EZTEC | EZTC | 24,84 | 20/01/2020 |
FICA | FIEI | 28 | 21/12/2020 |
GAFISA | GFSA | 51,52 | 30/12/2019 |
HELBOR | HBOR | 21,1 | 30/12/2019 |
INC SA | INNC | NA | NA |
JHSF PART | JHSF | 7,65 | 13/07/2020 |
JOAO FORTES | JFEN | 43,25 | 13/01/2020 |
KALLAS | KLAS | NA | NA |
LAVVI | LAVV | 9,423 | 25/03/2024 |
MELNICK | MELK | 6,02 | 28/09/2020 |
MITRE REALTY | MTRE | 15,03 | 03/02/2020 |
MOURA DUBEUX | MDNE | 18,16 | 10/02/2020 |
MRV | MRVE | 20,11 | 30/12/2019 |
PDG REALT | PDGR | 875,23 | 20/01/2020 |
PLANOEPLANO | PLPL | 14,03 | 04/03/2024 |
RNI | RDNI | 15,79 | 20/01/2020 |
ROSSI RESID | RSID | 13,48 | 08/02/2021 |
TECNISA | TCSA | 21,5 | 20/01/2020 |
TEGRA INCORP | TEGA | NA | NA |
TENDA | TEND | 38,69 | 17/02/2020 |
TRISUL | TRIS | 13,63 | 17/02/2020 |
VIVER | VIVR | 1,11 | 14/06/2021 |