[AGÊNCIA DC NEWS] A Selic de 14,75%, recorde em quase duas décadas – desde 2006 não estava nesse patamar – já mostra seus efeitos no mercado imobiliário. O aluguel subiu 1,25% em abril sobre março, de acordo com o Índice FipeZap. A alta foi generalizada e atingiu 34 das 36 cidades pesquisadas, sendo 22 capitais. No acumulado do ano, o avanço no preço do metro quadrado para locação já chegou a 4,51%. Segundo o coordenador do Índice FipeZap, Alison Oliveira, há um efeito cascata com os juros mais agressivos. “Menos famílias conseguem financiar ou comprar um imóvel e recorrem ao mercado de locação”, disse em entrevista à Agência de Notícias DC NEWS.
O maior patamar da Selic, além de estimular a procura por aluguéis, também tem mudado a disposição geográfica e o tamanho do imóvel. Agora há demanda maior por regiões menos centrais, além de imóveis menores. “Isso se reflete na valorização do imóvel de um dormitório, cujos preços subiram mais do que em imóveis maiores”, disse Oliveira. No quarto mês de 2025, a alta no preço do imóvel de um quarto foi de 1,74%, os de quatro dormitórios tiveram incremento de 1,07%, segundo o FipeZap.
Mas há ainda outro fator que está influindo no desempenho (leia-se preço) do metro quadrado no Brasil: a concorrência com os contratos por temporada. Com a migração de muitos proprietários para plataformas que firmam contratos de curta duração, como Airbnb, a disponibilidade dos imóveis para contratos mais longos tem ficado mais escassa. “A demanda por aluguel de temporada sempre existiu”, disse Oliveira. “O que há de novo é a tecnologia, que facilita e diminui a oferta para a longa temporada.” Confira a entrevista.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais os principais motivos para essa escalada de preços?
ALISON OLIVEIRA – Acredito que o principal fator que explica isso é a Selic, que acaba afetando significativamente também a taxa de juros do financiamento imobiliário. Esse patamar elevado acaba aumentando a taxa do financiamento e, consequentemente, o valor da parcela que a família precisa pagar para conseguir financiar o imóvel, que tem um limite de 30% da renda. Então, ao aumentar esse valor da parcela, menos famílias conseguem financiar ou comprar um imóvel.
AGÊNCIA DC NEWS – Então está relacionado à dificuldade em comprar um imóvel?
ALISON OLIVEIRA – Sim. Com isso, recorrem ao mercado de locação como única alternativa. Aumenta a procura no mercado de locação, e a gente acaba vendo esse aumento de preços. Esse é o principal fator.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais são as principais consequências do aumento do preço no aluguel?
ALISON OLIVEIRA – O aumento do preço acaba afetando a capacidade das famílias de conseguir um imóvel que caiba no orçamento. Afeta, principalmente, as famílias de menor poder aquisitivo, que acabam optando por imóveis que talvez não fossem os desejados — menores, localizados em regiões menos centrais, mais distantes do transporte público e do local de trabalho.
AGÊNCIA DC NEWS – E o que acontece em uma cidade com as dimensões de São Paulo?
ALISON OLIVEIRA – Quando a gente olha para São Paulo, vê que é uma cidade com áreas muito valorizadas. E há a questão do transporte, que é ainda mais crucial. Uma cidade grande, congestionada, onde os tempos de deslocamento são prolongados, faz com que as famílias gastem muito tempo para se deslocar da casa ao trabalho e vice-versa, o que acaba afetando a qualidade de vida dessas famílias.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais seriam os efeitos no longo prazo?
ALISON OLIVEIRA – Isso deve incentivar o aumento da oferta de imóveis disponíveis para locação, o que tende a equilibrar esse mercado.
AGÊNCIA DC NEWS – O avanço do emprego também impulsiona a busca por imóveis, não?
ALISON OLIVEIRA – Sim. Estamos em um momento com o mercado de trabalho bastante aquecido. A maioria das pessoas consegue emprego, e há um ganho real de renda, o que acaba aumentando também a renda das famílias.
AGÊNCIA DC NEWS – Esse ganho de renda não compensaria a alta dos preços no aluguel?
ALISON OLIVEIRA – Isso eleva a procura por imóveis, seja para compra ou para aluguel. No entanto, com a atual taxa de juros, o caminho mais comum é a locação.
AGÊNCIA DC NEWS – O aumento na renda tem também pressionado os preços…
ALISON OLIVEIRA – O mercado de trabalho aquecido significa que a renda das famílias está elevada e a demanda por moradia também. Isso impacta o mercado de locação.
AGÊNCIA DC NEWS – E como avaliar o desempenho da locação voltado ao turismo, em especial nas cidades do litoral?
ALISON OLIVEIRA – Em termos gerais, as consequências são parecidas, mas há aspectos peculiares dessas cidades do litoral. Quando a gente olha para o Índice FipeZap na parte de locação, temos uma medida que observa o preço do aluguel sobre o preço de venda, o que dá uma ideia da rentabilidade do aluguel. As cidades mais rentáveis para locação, em sua maioria, são cidades litorâneas. Nessas cidades, o valor do aluguel costuma ser mais elevado justamente por causa do apelo turístico e sazonal — e há maior demanda por moradia nessas regiões. Assim, o aluguel tende a ser mais caro do que em cidades que não estão no litoral.
AGÊNCIA DC NEWS – O avanço do preço do aluguel tradicional abre espaço para modelos de aluguel temporário?
ALISON OLIVEIRA – O que a gente viu é que parte da oferta de imóveis antes disponível para contratos de longo prazo passou a ser ofertada para aluguéis de temporada. Isso reduz a oferta de imóveis para locação tradicional, o que também contribui para o aumento de preços observado nos dados.
AGÊNCIA DC NEWS – Mas a demanda por imóveis de locação para temporadas, em especial no litoral, sempre foi forte, não?
ALISON OLIVEIRA – São demandas sazonais por lazer, por estar nessas cidades em períodos de temporada. Essa demanda sempre existiu — as pessoas sempre se deslocaram para o litoral. O que temos de novo é a tecnologia, que facilita e aumenta a oferta para esses aluguéis temporários, reduzindo a disponibilidade para a longa temporada.
AGÊNCIA DC NEWS – Qual o remédio para conter o aumento do preço dos aluguéis?
ALISON OLIVEIRA – Uma medida seria iniciar um ciclo de redução da taxa de juros, para que os juros do financiamento imobiliário possam cair e as famílias tenham mais acesso à compra de imóveis. Esse é um fator estrutural, mas que vale para o país como um todo. No mercado imobiliário, especificamente, entendo que qualquer medida que incentive o aumento da oferta de moradias é bem-vinda e ajuda a equilibrar o aumento de preços.
AGÊNCIA DC NEWS – O que exige mais atenção do setor imobiliário atualmente?
ALISON OLIVEIRA – É muito importante acompanhar os preços dos imóveis e entender que esse é um movimento cíclico, que tende a convergir para uma média. Outro fator importante é observar a evolução média dos preços. A todo momento, há grande variedade de imóveis sendo ofertados e vendidos. Então, é possível fazer um bom negócio mesmo em um momento de preços elevados. Certamente há milhares de bons negócios sendo feitos — pessoas que precisam vender o imóvel com mais rapidez. É sempre importante pesquisar bastante.