SÃO PAULO, SP, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O gabinete de Alexandre de Moraes no STF ordenou por mensagens e de forma não oficial a produção de relatórios pela Justiça Eleitoral para embasar decisões do próprio ministro contra bolsonaristas no inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal durante e após as eleições de 2022.
A Folha de S.Paulo obteve o material com fontes que tiveram acesso a dados de um telefone que contém as mensagens, não decorrendo de interceptação ilegal ou acesso hacker.
Entenda o caso em 5 pontos:
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1) O que as mensagens revelam?
Diálogos aos quais a reportagem teve acesso mostram como o setor de combate à desinformação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), presidido à época por Moraes, foi usado como um braço investigativo do gabinete do ministro no Supremo.
As mensagens revelam um fluxo fora do rito envolvendo os dois tribunais, tendo o órgão de combate à desinformação do TSE sido utilizado para investigar e abastecer um inquérito de outro tribunal, o STF, em assuntos relacionados ou não com a eleição daquele ano.
Em alguns momentos das conversas, assessores relataram irritação de Moraes com a demora no atendimento às suas ordens. “Vocês querem que eu faça o laudo?”, consta em uma das reproduções de falas do ministro. “Ele cismou. Quando ele cisma, é uma tragédia”, comentou um dos assessores. “Ele tá bravo agora”, disse outro.
Em vários casos os alvos de investigação eram escolhidos pelo ministro ou por seu juiz assessor.
Os diálogos mostram também que os relatórios eram ajustados quando não ficavam a contento do gabinete do STF e, em alguns episódios, feitos sob medida para embasar uma ação pré-determinada, como multa ou bloqueio de contas e redes sociais.
2) Quem participa da troca de mensagens?
A Folha de S.Paulo teve acesso a mais de 6 gigabytes de mensagens e arquivos trocados via WhatsApp por auxiliares de Moraes, entre eles o seu principal assessor no STF, que ocupa até hoje o posto de juiz instrutor (espécie de auxiliar de Moraes no gabinete), e outros integrantes da sua equipe no TSE e no Supremo.
As mensagens foram trocadas entre Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes no STF, Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes durante sua presidência no TSE, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da AEED (Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação), órgão que era subordinado a Moraes na corte eleitoral.
3) O que eles dizem?
Procurado, o gabinete de Moraes disse que “todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República”.
Tagliaferro afirmou que não se manifestará, mas que “cumpria todas as ordens que me eram dadas e não me recordo de ter cometido qualquer ilegalidade”.
Nos áudios, o juiz instrutor Airton Vieira demonstrou a preocupação com a forma de atuação dos gabinetes do ministro.
“Formalmente, se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada, digamos assim. Como um juiz instrutor do Supremo manda [um pedido] pra alguém lotado no TSE e esse alguém, sem mais nem menos, obedece e manda um relatório, entendeu? Ficaria chato.”
4) Como bolsonaristas reagiram às mensagens?
Senadores e deputados federais do campo bolsonarista se manifestaram nesta terça-feira (13) em defesa de uma CPI e do impeachment de Moraes.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho de Bolsonaro, afirmou que o relato pode representar crime e interferência ilegal nas eleições em que o pai foi derrotado por Lula (PT).
“Se isso aqui for confirmado é uma prova de uma interferência direta do presidente do TSE dando ordem para prejudicar um candidato. Desequilibrando a disputa presidencial. Algo que já suspeitávamos. Se confirmando isso aqui, é uma prova de que houve essa interferência, pessoal, direta, criminosa”, discursou Flávio no plenário do Senado. “Em se confirmando não tem como esse plenário não tomar alguma atitude.”
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) republicou os vídeos do discurso do filho, apesar de não ter se manifestado diretamente sobre o caso.
O Senado é, pela lei, a Casa responsável por analisar e votar eventuais pedidos de impeachment contra ministros do STF.
5) O governo Lula se manifestou?
O presidente ainda não comentou o assunto.
O ministro Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) saiu em defesa de Moraes. Teixeira foi o primeiro ministro do governo a comentar a reportagem, que ele chamou de “sensacionalista”.
“A matéria da Folha de S.Paulo que acusa o ministro Alexandre é sensacionalista e não corresponde à verdade. A matéria só tem o efeito de alimentar o movimento de tentar desacreditar o STF para incidir no julgamento do inelegível”, disse Teixeira no X, antigo Twitter.