Motta acumula atritos com Lula e bolsonaristas e vira alvo até de aliados no 1º semestre à frente da Câmara

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Hugo Motta (Republicanos-PB) encerra o primeiro semestre na presidência da Câmara dos Deputados criticado até por aliados, com colegas e integrantes do governo Lula (PT) questionando a confiabilidade dos acordos costurados por ele e alvo de denúncias sobre funcionários fantasmas.

Ele assumiu a presidência numa costura que envolveu do PT ao PL, mas sem deixar claro quais seriam as prioridades de sua gestão. Após meses de críticas à falta de agenda da Casa, ele buscou uma marca própria ao criar um grupo de trabalho para propor uma reforma administrativa.

O deputado foi procurado pela Folha, mas não quis comentar.

Nesta quarta-feira (16), Motta sofreu sua principal derrota com a decisão de Lula de vetar o projeto de lei que aumenta o número de deputados na Câmara, de 513 para 531. A proposta foi costurada pessoalmente por Motta para evitar que a Paraíba, sua base eleitoral, perdesse parlamentares.

Quatro interlocutores frequentes de Motta dizem que ele ficou chateado com essa decisão. Até mesmo defensores do projeto dizem que será tarefa difícil derrubar o veto presidencial.

Lula não informou previamente à cúpula do Congresso sobre o veto, o que foi interpretado como uma resposta à derrubada do decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) em junho. O governo só soube pelo X (ex-Twitter) que Motta iria pautar o projeto no dia seguinte.

Segundo dois interlocutores de Motta, ele telefonou no começo da tarde para a ministra Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais) para perguntar sobre o tema. Só soube do veto, no entanto, pela imprensa e, assim que a informação veio a público, deixou o plenário da Câmara e foi até o Senado falar com Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).

A conversa também tratou da decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, de validar o decreto presidencial sobre IOF. O gesto foi criticado até mesmo por aliados de Motta, que avaliam que o deputado errou ao não consultar os líderes da Câmara antes de falar com o aliado que preside o Senado. Um deles afirma que isso sugeriu falta de autonomia à frente da Casa.

Ao voltar ao plenário da Câmara, Motta decidiu pautar projeto que cria crédito subsidiado para o agronegócio com verbas de petróleo do pré-sal, com custo de R$ 30 bilhões. O governo reclamou publicamente de quebra de acordo, já que negociava uma alternativa com menor impacto fiscal.

Mesmo aliados dele entenderam como intempestiva a “pauta-bomba”. Dois deles dizem, sob reserva, que isso vai contra à imagem que ele tem buscado construir, de preocupação com o equilíbrio fiscal e que cobra do Executivo medidas de redução de gastos.

Há aliados de Motta que minimizam as queixas e dizem que as votações expressivas mostram que ele tem apoio do plenário. Afirmam que ele não foi derrotado em nenhuma votação e soube contornar as pressões ao tratar do projeto de lei da anistia. O texto não avançou na Casa, o que tem irritado os bolsonaristas, que cobram dele uma solução para os condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

O estremecimento na relação com Lula ocorreu após um breve período de lua de mel. O petista o convidou para viagens e reuniões na residência oficial, e Motta participou de atos no Palácio do Planalto. O presidente concordou com o apoio do PT à eleição de Motta, o que viabilizou a construção de ampla aliança em torno de seu nome, negociada pelo antecessor, Arthur Lira (PP-AL).

Hoje, o governo se queixa de acordos não cumpridos, como o recuo em ceder ao PT da relatoria da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026 e uma mudança de postura com as propostas alternativas ao aumento do IOF —o que Motta rebate dizendo que nunca se comprometeu com as medidas.

Há ainda temor entre petistas de outro acerto ser quebrado: o de que o partido indicará um ministro para o TCU (Tribunal de Contas da União).

Por outro lado, o governo pode comemorar a volta da possibilidade de editar medidas provisórias, que estavam travadas na gestão Lira por um conflito com o Senado.

Aliados de Motta também citam o apoio a projetos de Lula, como o empréstimo consignado para a iniciativa privada, a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 e a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Segurança Pública –os dois últimos, por enquanto apenas nas comissões.

Parte dessas propostas avançou após o governo encampar agenda da defesa da justiça tributária, e as redes sociais petistas atacarem Motta com memes e vídeos. O presidente da Câmara reclamou com o Palácio do Planalto, mas mudou a rota, e a Casa deu andamento à agenda do governo.

Já a oposição reclama que Motta indica nos bastidores a construção de um acordo para a anistia, mas não leva o projeto a voto. Eles também já protestaram, até com bate-boca com o presidente da Câmara, pelo que consideraram quebras de acordo com a votação de projetos que não estavam combinados.

Há também queixas de que ele não adotou postura mais firme contra o que classificam como invasão das prerrogativas parlamentares pelo STF. Motta rebate, no entanto, dizendo que pautou o recurso para suspender o processo criminal contra o deputado delegado Alexandre Ramagem (PL-RJ).

A revelação da existência de funcionários fantasmas em seu gabinete, revelada pela Folha, também é apontada nos bastidores como prática que não estaria à altura do ocupante da presidência da Câmara, e deputados dizem que o escândalo prejudica a imagem da Casa.

Em público, no entanto, os deputados resolveram silenciar e não citaram o assunto em plenário. Apenas deputados do PSOL defenderam nas redes sociais que ele se explicasse –ainda assim, de forma discreta, já que ele ameaça pautar após o recesso a cassação do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ).

A Folha revelou que três assessoras de seu gabinete tinham rotinas incompatíveis com o expediente no gabinete: uma fisioterapeuta que presta serviço em clínicas, a assistente social de uma prefeitura e uma estudante de medicina que morou em outro estado durante seis meses.

Motta não quis comentar as críticas, mas, ao final da sessão de quarta (16), agradeceu aos colegas e disse buscou “atender a todos naquilo que eu podia”.

“Peço desculpas àqueles a quem eu não consegui corresponder, mas podem ter certeza de uma coisa: eu durmo e acordo todos os dias buscando ser melhor e buscando estar à altura deste cargo tão honrado que é presidir a Câmara dos Deputados”, afirmou.

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