Pequim vê 'caixa de Pandora' se abrir no mar do Sul da China por disputa com Filipinas

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PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) – Nas reuniões dos líderes chineses com o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, em Pequim, o mar do Sul da China foi tratado como questão paralela. Os comunicados chineses reafirmaram que sua prioridade é Taiwan, não as Filipinas.

O chanceler Wang Yi e Sullivan fizeram breves registros. O primeiro disse que os Estados Unidos “não devem apoiar ou encorajar as Filipinas a realizarem ações infratoras”. O segundo “expressou preocupação com ações desestabilizadoras da China contra operações filipinas legais”.

Escalões abaixo, o tom foi outro. Em entrevista coletiva na quinta-feira (29), mesmo dia em que o líder Xi Jinping recebia o enviado do presidente Joe Biden, o porta-voz do ministério chinês da Defesa, coronel Wu Qian, afirmou que as Filipinas abriram “uma caixa de Pandora” ao estacionar mais um navio em recife disputado pelos dois países. Na mitologia grega, Pandora foi a primeira mulher. Ela tinha uma jarra ou uma caixa que continha todo tipo de miséria e maldade.

Desde abril, um navio da guarda costeira filipina está parado no recife Sabina (ou Xianbin, para os chineses). As tentativas de abastecimento marítimo vinham sendo impedidas pela guarda costeira chinesa. No recife próximo chamado Second Thomas (ou Ren’ai), com navio filipino estacionado desde 1999, negociações meses atrás permitiram o abastecimento, e a tensão baixou.

“A China está empenhada em administrar as diferenças por meio do diálogo, mas há limites para a paciência”, declarou o porta-voz militar, cobrando “medidas imediatas para evacuar o recife de Xianbin” e apontando os EUA como “o maior destruidor da paz e da estabilidade” na região.

Na mesma quinta, as Filipinas anunciaram ter abastecido o navio, por helicóptero.

Da parte dos EUA, embora seus porta-aviões tenham abandonado o entorno da China nas últimas semanas para se concentrar no Irã e no Líbano, o comandante militar na região, almirante Samuel Paparo, afirmou nesta semana que levaria em consideração escoltar navios filipinos para o abastecimento nos recifes. Ao seu lado na entrevista coletiva em Manila, o chefe das Forças Armadas filipinas, general Romeo Brawner Jr., foi mais cauteloso devido ao impedimento constitucional de estrangeiros em combate no país. “[Vamos] confiar primeiro em nós mesmos.”

Questionado sobre Paparo, o coronel Wu respondeu que “algumas pessoas das forças americanas estão tentando assustar a China, uma tarefa impossível”. Citou o Rei Macaco do game de console “Black Myth: Wukong”, um sucesso comercial, para descrever o que seria a atitude do Exército chinês no caso: “Pisando na estrada esburacada, lutando contra os perigos e partindo novamente”.

A região vive uma escalada. Em fevereiro, o governo filipino ampliou o número de bases militares liberadas para as forças americanas, de cinco para nove. Uma delas, ilha Balabac, fica próxima às ilhas Spratly, dos recifes disputados. Semanas atrás, Washington anunciou investimentos de US$ 32 milhões (R$ 180 milhões) para ampliar a Base Aérea de Basa, mais ao norte.

Em abril, os EUA instalaram um sistema de mísseis balísticos de médio alcance no extremo norte das Filipinas, de início para exercícios militares conjuntos, mas mantidos posteriormente. Pequim vem cobrando sua retirada desde então.

Um mês antes, em março, como revelou o jornal The New York Times, o governo americano havia aprovado secretamente um plano estratégico nuclear que, pela primeira vez, reorientou o foco para a China. E nesta semana, mais uma vez, o ministério chinês da Defesa questionou “o pretexto da inexistente teoria da ameaça nuclear da China”.

Uma das principais referências chinesas sobre o mar do Sul da China, publicando regularmente na plataforma WeChat, com reprodução em veículos estatais e privados do país, o cientista político Zheng Yongnian escreveu na última semana que a região, “sob domínio dos EUA, está rapidamente deslizando para a guerra”.

Zheng, que preside o Instituto de Assuntos Internacionais e é professor da Universidade Chinesa de Hong Kong, em Shenzhen, já havia alertado na mesma linha no último mês. “Hoje, ninguém pode subestimar a possibilidade de eclodir uma guerra mundial”, escreveu. Um conflito que não começaria no Oriente Médio ou na Europa Oriental, mas na Ásia-Pacífico.

De forma simbólica, chega a Pequim daqui a duas semanas uma delegação militar americana para um fórum organizado pelo Ministério de Defesa, sob o tema Construindo a Paz para Todos. “Em setembro, o céu em Pequim é alto, as nuvens são leves, e a brisa do outono é fresca”, disse o porta-voz Wu, adiantando as boas-vindas.

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