Perfil: Roberto Minczuk, regente da Orquestra Sinfônica Municipal. O mais internacional dos paulistanos
Relação com a Orquestra Sinfônica Municipal começou aos 13 anos, como primeiro-trompista
Larissa Paz/Divulgação
Début internacional na regência aconteceu em 1998, à frente da Filarmônica de Nova York, como maestro-associado
Sobre o Centro paulistano: “Houve aumento da segurança. A revitalização de espaços tem dado nova vida à região”
Por Victor Marques
[AGÊNCIA DC NEWS]. Nasceu em 1967 na capital paulista. Aos nove anos, começou a aprender a tocar trompa em um conservatório em São Paulo. Aos 13, foi contratado pela Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo – a mesma da qual hoje é regente. Aos 14, foi para Nova York estudar em Julliard. E aos 17 fez sua estreia no Carnegie Hall, uma das principais salas de espetáculos da cidade. Roberto Minczuk já era genial, mas ainda não sabia que seria um dos principais nomes da música clássica brasileira ou que regeria mais de 100 orquestras pelo mundo. E mesmo com esse passaporte global, é em sua São Paulo que este cidadão do mundo se sente em casa. E tem visto de perto a transformação do Centro. “Houve um aumento da segurança e a revitalização de espaços culturais, como o Farol Santander e mais recentemente o cineteatro da Casa de Francisca, que têm dado nova vida à região”, afirmou Minczuk. Ele acredita que a recuperação do Centro passa pela volta das pessoas a morar ali, criando uma dinâmica de vida que valorize a história e a arquitetura da cidade.
Sua história começou de forma precoce e pode ser resumida como uma reverência à música. Nasceu em uma família musical, de origens bielorrussa, italiana, polonesa e ucraniana. A mãe, Olga, era cantora e fazia arranjos. “Ela tinha um amor pela música e essa paixão foi fundamental para meu desenvolvimento musical desde a infância”, disse Roberto Minczuk à Agência DC NEWS. O regente da Orquestra Sinfônica Municipal é também maestro titular da Filarmônica do Novo México, nos Estados Unidos. Foi com a mãe que criou sua conexão no mundo da música, mas foi o pai, José, quem lhe deu o caminho. Era policial, trombonista, além de regente do coro da Polícia Militar de São Paulo e professor de teoria musical. “Ele conseguia equilibrar sua carreira na polícia com a música. Sempre que podia, ele se dedicava a ensinar”, afirmou.
Apesar do gosto pela música, o pai queria inicialmente que o filho fosse médico. Mas ao ver o talento de Minczuk – que tem o chamado ouvido absoluto, fenômeno auditivo que se caracteriza pela habilidade de identificar ou recriar uma nota musical sem ter um tom de referência –, mudou de opinião. Minczuk tinha seis anos e seu pai escolheu a trompa porque era um instrumento que conversava com toda a orquestra, com um papel de ligação entre suas diferentes seções. Por isso, um instrumento nobre. “Ele já queria me guiar para o caminho de maestro e a trompa era um bom instrumento para começar.” Aos nove anos, entrou na Escola Municipal de Música e quando seu então professor Enzo Pedini o viu com um instrumento daquele tamanho (é um tubo metálico enrolado de 3,7 metros e quase três quilos), se assustou e relutou a aceitá-lo na instituição. “Falou para o meu pai para me trazer depois de quatro anos”, disse Minczuk. Com um pouco de conversa do pai, Pedini aceitou o garoto, para quem dava aulas duas vezes por semana, às 7h30, para não perder as aulas da escola.
CARA DE PAU – Sua precocidade era acompanhada de velocidade. Aos 13 anos, conseguiu o cargo de primeiro-trompista da Sinfônica Municipal. Ensaiava pela manhã e à tarde assistia aos ensaios da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), local de onde sairia uma das maiores oportunidades de sua vida. Lá ele teve contato com Peter Mennin – que foi presidente da tradicional Julliard School, em Nova York, de 1962 até morrer, em 1983. Numa mistura de sorte, oportunidade e cara de pau, Minczuk disse a Mennin que queria estudar em Julliard. Ele o chamou para tocar a trompa. Logo após a performance veio o convite e uma bolsa de estudos para se mudar para Nova York.
Minczuk estudava com profissionais mais velhos e mais experientes. “Foi a oportunidade de interagir com grandes músicos e maestros, o que contribuiu para minha formação”, afirmou. Os estudos em uma das melhores escolas de música do mundo o expuseram a uma ampla gama de estilos e repertórios. Além disso, a cidade proporcionou a ele uma rica experiência cultural fora das salas de aula. Não só o ajudou a crescer como músico, mas também o preparou para enfrentar os desafios de uma carreira internacional.
Assim, logo após entrar em Julliard, aos 14 anos, seguiu os passos do pai e começou a estudar regência. Três anos depois, aos 17, como solista, fez sua estreia no Carnegie Hall. Aos 20 anos, tornou-se membro da Orquestra Gewandhaus, de Leipzig (Alemanha), então regida por Kurt Masur (1927-2015). “A experiência em Leipzig foi importante devido a história musical rica da cidade”, disse. Lá, ele aprendeu muito sobre a dinâmica das grandes orquestras europeias, sobre o repertório clássico e sobre a rica tradição de concertos que a cidade proporciona. Essa vivência foi crucial para moldar seu estilo de regência e sua abordagem artística.
Minczuk: a música como sentido de vida vem de seus pais e está em seus filhos Eduardo Knapp/Folhapress
ESTREIA – E não demorou. Em março de 1994, ele fez sua estreia como regente pela Osesp, na qual três anos depois tornou-se diretor artístico-adjunto e onde ficou até 2005. O début internacional na regência aconteceu em 1998, à frente da Filarmônica de Nova York, como maestro-associado. Minczuk conta que foi um processo seletivo com vários músicos. “Tínhamos de decorar as principais músicas do repertório deles e tocar na frente dos principais músicos do corpo”, disse. “Foi estressante. Fiquei muito nervoso.” Saiu vitorioso e quatro anos depois, em 2002, foi convidado a assumir o posto de regente associado, cargo pela última vez ocupado por Leonard Bernstein (1918-1990), uma das suas principais referências na música. A Filarmônica de Nova York à época era regida pelo mesmo Kurt Masur que o dirigiu na Gewandhaus, de Leipzig. A jornada internacional inclui a regência de mais de 100 orquestras pelo mundo.
Pelo Brasil, depois da direção da Osesp foi comandar e reestruturar a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB), no Rio de Janeiro. Nela ficou por dez anos, até 2015. Foi também onde se viu no centro de uma polêmica, no ano de 2011. O movimento de reestruturar a instituição seguia feito com sucesso, mas mudanças propostas foram recebidas com resistência por parte dos músicos. “Houve falhas de comunicação, especialmente por parte da administração, que não conseguiu harmonizar os interesses dos músicos com as demandas legais da instituição”, afirmou. Ainda assim, Minczuk destaca que, apesar da turbulência, a orquestra viveu momentos brilhantes sob sua direção, com concertos memoráveis, incluindo uma apresentação histórica no Rock in Rio.
Entre 2006 e 2016, também foi diretor musical da Filarmônica de Calgary, no Canadá. Depois, assumiu a mesma posição na Filarmônica do Novo México, que hoje compartilha com o trabalho de regente titular na Orquestra Municipal de São Paulo – e cuja programação vale acompanhar. Fora dos palcos, Minczuk é um homem de família, profundamente ligado à esposa e aos quatro filhos, todos eles também músicos. Quando precisava viajar para concertos fora do Brasil, muitas vezes levava a família inteira com ele, preferindo gastar mais do que ganhava para ter todos por perto. Em sua casa, a música sempre esteve presente. Seu filho toca violão, as filhas tocam piano, e todos cantam. Descreve com carinho as festas de fim de ano, em que a família se junta para tocar e cantar. Aos 57 anos, reflete sobre a passagem do tempo. “A única limitação física que tenho é a necessidade de óculos para ler partituras”, afirmou, “Às vezes, incomodam durante os ensaios.” Um detalhe para quem a música é como o ar. “As semanas sem ensaios ou concertos parecem semanas desperdiçadas”, disse. “A música é o que me faz sentir vivo.”