SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A cúpula entre Donald Trump e Vladimir Putin, que deverá ocorrer nos Emirados Árabes Unidos na semana que vem, será o sétimo encontro pessoal conhecido entre dois líderes notórios por sua tendência a torcer a história em seu favor.
Nunca houve tanto em jogo, contudo. Os presidentes querem, a seu modo, modular o fim da Guerra da Ucrânia, o mais importante conflito entre Estados do século 21 em termos de impacto geopolítico.
Será também apenas a segunda cúpula entre os líderes, e a primeira entre um titular da Casa Branca e Putin desde que o russo e Joe Biden concordaram em discordar de vários temas numa conversa “muito franca”, segundo interlocutores, em Genebra, no distante junho de 2021.
Em 7 de julho de 2017, os dois se encontraram oficialmente pela primeira vez, em um encontro às margens do G20 em Hamburgo, na Alemanha. O que era para ser uma conversa de meia hora acabou estendido para 2 horas e 15 minutos, acompanhada pelos chefes da diplomacia dos países, Serguei Lavrov e Rex Tillerson.
Como seria óbvio, a entrevista coletiva posterior foi dominada pelo tema da acusação democrata de que Putin havia ajudado Trump com trabalho de desinformação na eleição de 2016, o que ambos negaram. Eles ainda conversaram reservadamente no mesmo dia à noite.
Já a primeira cúpula bilateral ocorreu um dia após a final da Copa de 2018, que Putin recebeu na Rússia com grande fanfarra. Em 16 de julho daquele ano, ele e Trump passaram mais de duas horas conversando só com intérpretes, além de reuniões ampliadas em Helsinque.
Era outro mundo: a capital da Finlândia era vista como campo neutro, dada a opção de não alinhamento do país nórdico que vinha desde a Segunda Guerra Mundial. Em 2023, Helsinque passou a ser integrante da Otan, a aliança militar liderada pelos EUA, justamente devido à invasão da Ucrânia.
Na época, do ponto de vista prático, não houve nenhum anúncio. Foram discutidos os temas importantes do momento, que reverberam até hoje: a Ucrânia, a saída dos EUA do acordo nuclear com o Irã, a dependência europeia de gás russo e as Coreias.
A política interrompeu as duas outras cúpulas previstas com Putin durante o primeiro mandato de Trump (2017-2021). Em novembro de 2018, os líderes se reuniriam em Paris, mas o governo francês pediu seu adiamento para não ofuscar as celebrações do centenário do fim da Primeira Guerra Mundial.
Ao invés disso, tiveram uma conversa breve e ficou acertado então que se falariam no mês seguinte em paralelo à reunião do G20 em Buenos Aires. Dois dias antes, contudo, Trump cancelou o encontro porque Putin havia aprisionado um grupo de marinheiros ucranianos perto da Crimeia e se recusava a soltá-los.
Ainda assim, eles se encontraram em um dos vários encontros informais, no caso por 15 minutos durante uma ópera na capital argentina.
Por fim, Putin e Trump se despediram da primeira encarnação do republicano como presidente às margens da cúpula do G20 em Osaka, no Japão. A Ucrânia dominou a conversa, além da questão do controle de armas nucleares, pendente até hoje com as dúvidas acerca da sobrevivência do último acordo ainda de pé, que vence em fevereiro de 2026.
Se não houve anúncios importantes além de ajustes pontuais nesses encontros, como a coordenação para evitar choques durante a guerra civil na Síria, na qual tanto Rússia quanto EUA estavam envolvidos, eles certamente serviram para estabelecer imagens mútuas.
Putin elogiou diversas vezes Trump pela determinação e empreendedorismo. O americano fez o mesmo, admirando abertamente o autoritarismo e a mão pesada do russo mesmo em plena crise atual, o chamou de “O CHEFE”, em maiúsculas, ao compará-lo com o antecessor Dmitri Medvedev.
Em comum, ambos comungam da visão de mundo segundo a qual a força bruta e esferas de influência de potências são o que conta.
Uma diferença importante é que a proximidade entre Putin e a China de Xi Jinping de antes agora é uma aliança estratégica, e Pequim é alvo real de toda a movimentação geopolítica de Trump. Em Moscou, muitos suspeitam que o namoro inicial do republicano com o russo visava afastar Putin dos chineses.
O líder do Kremlin não mordeu a isca e, quando Trump ameaçou a Rússia com submarinos nucleares na semana passada, sua resposta foi fazer exercícios navais conjuntos com a China perto do Japão.
A acusação nunca provada de fato de interferência no pleito de 2016 voltou à tona quando Trump aproximou-se de Putin para tentar chegar a uma trégua na Ucrânia. Agora, com o americano pressionando o russo, um novo capítulo se desenha.