FOZ DO IGUAÇU, PR E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Termogás, do empresário Carlos Suarez, apareceu nas discussões sobre a compra da distribuidora Amazonas Energia, que ocorrem na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). No entanto, o seu maior interesse é outro: as térmicas vendidas pela Eletrobras para a Âmbar -braço de energia do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. A Termogás monitora a negociação dessas usinas há mais de um ano e chegou a fazer uma oferta, mas foi rejeitada.
Pessoas que acompanham as negociações, ouvidas pela reportagem com a condição de não terem o nome revelado, contam que a empresa de Suarez foi surpreendida pela MP (medida provisória) 1.232. Pelo texto, a despesa com o gás das térmicas, antes um pesado custo para a Amazonas Energia, foi transferida para a conta de luz de todos os brasileiros. Isso dará fôlego financeiro para a Amazonas Energia e vai reduzir o risco de ela dar novos calotes nas térmicas -ou seja, a MP valorizou os dois ativos de uma só vez.
A MP para ajudar a distribuidora foi publicada dois dias depois de a Eletrobras divulgar ao mercado que havia fechado a venda das térmicas para a Âmbar, dos Batista.
A reportagem ouviu fontes do setor ligadas a outras empresas que também ficaram incomodadas com a MP do governo. Elas também negociavam com a Eletrobras, tinham a expectativa de levar partes do parque térmico, e fizeram ofertas considerando a dinâmica de pagamento pelo gás no cenário anterior (sem a ajuda do texto do governo).
A Âmbar arrematou 13 empreendimentos, 12 deles no estado do Amazonas, por R$ 4,7 bilhões. O anúncio foi feito em 10 de junho. Menos de três semanas depois, a J&F apresentou proposta para assumir também a distribuidora de energia do estado. Desta vez, usou dois fundos, o Futura Venture Capital e o Milão.
Em mais de uma ocasião, o MME (Ministério de Minas e Energia) afirmou que a coincidência de datas foi uma fatalidade, e que a MP já era esperada. O relatório em que ela foi baseada estava em produção desde o ano passado, por um grupo de técnicos da pasta e da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). O texto final do relatório havia sido disponibilizado no site do MME a partir de fevereiro, já sinalizando as flexibilizações, bem como que o momento crítico para a Amazonas Energia ocorreria em junho.
Mesmo assim, diferentes empresas afirmam que não sabiam do conteúdo exato da MP até ela ser publicada.
Os movimentos da Termogás sinalizam agora dificuldades para os Batista no mercado de energia do Amazonas. O que se comenta no setor é que os dois lados são expoentes de uma acirrada disputa empresarial envolvendo vários grupos por posições no setor de energia, especialmente no segmento de gás.
Após a apresentação da proposta para mudança de controle, tanto a Amazonas Energia quanto a J&F passaram a pressionar a Aneel -que é responsável por analisar a viabilidade das distribuidoras de todo o país- para agilizar os trâmites. A agência passou, inclusive, a ser acionada judicialmente. Na investida mais recente, a Cigás, distribuidora de gás encanado do Amazonas, controlada pelo governo do estado e pela Termogás, pediu para entrar como assistente da Aneel em uma das ações judiciais.
Segundo executivos ouvidos pela reportagem, a Cigás já tinha pedido ao MME e à Aneel, há um ano, que fosse ouvida no processo de venda das térmicas. O próprio governador Wilson Miranda de Lima enviou correspondência ao ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia) alertando para a questão. A reportagem fez contato com a assessoria do governador para entender a recomendação, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
A Cigás não apenas tem a distribuição de gás encanado no estado. Também controla parte do duto que entrega o gás para as térmicas adquiridas pelos Batista.
Em outro front, nos últimos meses, a mesma Cigás também pediu para ser ouvida no caso da Amazonas Energia durante a consulta pública realizada pela Aneel que tratou da transferência de controle da distribuidora.
Em ambos os casos, a Cigás argumenta que existem passivos que precisam ser sanados antes da transferência de controle. São valores referentes a dívidas da Amazonas Energia em ramais e em uma taxa devida a agências reguladoras, por exemplo.
O pedido foi negado pela área técnica da Aneel. O diretor Fernando Mosna, no entanto, incluiu o pedido da Cigás em seu voto no processo que trata da mudança do tipo de contrato de energia das térmicas. A votação sobre esse ponto está empatada na agência, em 2 a 2.
A diretoria da Aneel foi concebida para ter cinco membros, cabendo ao diretor-geral o voto de minerva. Atualmente, porém, está sem um integrante e o empate trava uma decisão vital para o negócio: a transferência do custo do gás da Amazonas Energia para a conta de luz dos brasileiros.
Nesta quinta-feira (3), em novo episódio judicial, a distribuidora do Amazonas ganhou liminar para que a Aneel delibere em 24 horas a aprovação da proposta de interesse dos Batista e faça a mudança no tipo de contrato de energia. No mesmo texto, também em caráter liminar, a Justiça diz que não é preciso aval da Cigás.
Ao contrário dos Batista, que recentemente aceleraram as investidas no setor do gás, Carlos Suarez tem décadas de atuação nessa área. Depois de atuar no setor de infraestrutura, onde se tornou o S da construtora OAS ao fundar o empreendimento, deixou a empresa e investiu no gás. A Termogás foi fundada em julho de 1998, em Salvador, na Bahia. Tem participações em oito distribuidoras nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e investimentos em mais de 8.000 quilômetros de projetos de gasodutos.
Na Cigás, o estado do Amazonas detém 51% de participação, e a Termogás, 49%. A distribuidora atende mais de 17 mil unidades com gás natural e tem a meta de quase dobrar esse montante até 2028, totalizando R$ 1,2 bilhão em investimentos no negócio, incluindo a expansão da rede, que deve passar de 300 km para 440 km de extensão.
O empresário também é conhecido pela habilidade na cena política, sendo apontado como um dos mais influentes no Congresso. Procuradas, Termogás e J&F preferiram não fazer comentários.