Diretor-geral da BBC renuncia após acusações de manipulação de fala de Trump e viés anti-Israel

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O diretor-geral da BBC, Tim Davie, renunciou ao cargo neste domingo (9) após acusações feitas por um ex-conselheiro editorial de que a emissora pública britânica desrespeitou suas próprias diretrizes e padrões jornalísticos ao manipular discurso do presidente americano, Donald Trump, e ao adotar suposto viés anti-Israel em sua cobertura da guerra na Faixa de Gaza.

Davie estava no posto havia cinco anos e vinha enfrentando pressão crescente. Deborah Turness, diretora-executiva de Jornalismo da empresa, também deixou o cargo neste domingo. A polêmica envolve principalmente um discurso de Trump transmitido em um programa da emissora dias antes das eleições americanas de 2024, vencidas pelo republicano.

“De modo geral, a BBC está cumprindo bem sua missão, mas alguns erros foram cometidos, e, como diretor-geral, tenho que assumir a responsabilidade final por eles. Como todas as organizações públicas, a BBC não é perfeita, e devemos sempre ser abertos, transparentes e responsáveis”, disse David em comunicado. Ele estava na empresa havia duas décadas e tornou-se diretor-geral em setembro de 2020.

Turness emitiu um comunicado em que reconhece erros cometidos, mas nega as acusações de que o jornalismo da empresa teria “um viés institucional”. Ela era diretora-executiva da BBC News desde 2022, responsável por uma equipe de cerca de 6.000 pessoas.

O presidente da emissora, Samir Shah, afirmou que “hoje é um dia triste”, elogiando os dois profissionais. A secretária da Cultura do país, Lisa Nandy, agradeceu Davie pelo seu trabalho à frente da empresa e disse que o governo apoiará o conselho da BBC durante a transição. “Agora, mais do que nunca, a necessidade de notícias confiáveis e de programação de alta qualidade é essencial para nossa vida democrática e cultural, e para o nosso lugar no mundo”, escreveu ela.

A saída dos profissionais repercutiu na Casa Branca. A porta-voz do governo, Karoline Leavitt, publicou foto de uma reportagem do jornal Telegraph que diz: “Trump entra em guerra com a ‘fake news’ BBC”, acompanhada da notícia da saída de Davie.

A denúncia de manipulação foi feita por Michael Prescott, ex-consultor independente do Comitê de Diretrizes e Padrões Editoriais (EGSC, em inglês) da BBC. Ele mencionou o caso em documento interno, direcionado ao conselho da emissora, de acordo com o jornal britânico The Telegraph, que teve acesso ao material.

O documento cita uma fala de Trump durante seu discurso antes da invasão do Capitólio por seus apoiadores em 6 de janeiro de 2021 que foi editada pela BBC para acoplar dois trechos quase uma hora distantes entre si. A cena foi transmitida em um programa da emissora dias antes das eleições.

Além de juntar os trechos distantes, a declaração veiculada retirou, entre outras frases de Trump, o momento em que o presidente diz aos manifestantes que eles caminhariam “patriótica e pacificamente para fazermos com que escutem nossas vozes”.

“Isso criou a impressão de que Trump disse algo que ele não disse, e, ao fazer isso, materialmente induziu telespectadores ao erro”, diz Prescott.

O documento contém ainda uma lista de reportagens e acusações de cobertura supostamente tendenciosa contra Israel sobre a guerra na Faixa de Gaza.

Outro ponto levantado são as grandes discrepâncias existentes entre o serviço britânico e o árabe da emissora. São mais de 40 idiomas sob o guarda-chuva do BBC World Service, incluindo em português do Brasil –esses não são regulados pelo Ofcom, o órgão regulador britânico de comunicações, mas pela própria BBC e pela pasta de Relações Exteriores do país.

A carta assinada por Prescott lista alguns nomes de pessoas, apresentadas como jornalistas em diversas aparições no serviço em árabe da BBC, que teriam chamado autores de atentados contra civis israelenses de heróis e afirmado que judeus deveriam ser tratados “como fez Hitler”. A emissora, segundo o consultor, disse internamente que os homens eram testemunhas, não jornalistas, embora tenham aparecido em diversos programas do serviço.

Prescott foi convocado a prestar depoimento ao Parlamento britânico. As acusações pressionam a BBC, que terá a renovação das diretrizes, objetivos e regulações da emissora previstas pela legislação em 2027 –a revisão ocorre periodicamente.

Kemi Badenoch, líder do Partido Conservador, de oposição ao governo trabalhista de Keir Starmer, afirmou que a nova liderança da emissora precisará entregar uma “reforma genuína da cultura da BBC”.

“O relatório de Prescott expôs um viés institucional que não pode ser eliminado com duas renúncias. Ação forte precisa ser tomada com relação a todas as questões levantadas”, afirmou ela, que pediu uma reformulação completa da cobertura da BBC no Oriente Médio.

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