SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O episódio do Banco Master está sendo usado como um exemplo por especialistas em investimentos para mostrar como CDBs (Certificados de Depósito Bancário) podem oferecer risco e devem ser escolhidos com cautela pelo investidor, mesmo contando com uma garantia especial.
Com a liquidação do Master pelo BC (Banco Central) na terça-feira (18), o FGC (Fundo Garantidor de Créditos) vai ressarcir os investidores até o limite de R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, como preveem as regras do sistema financeiro para qualquer banco.
Esse reembolso, válido para bancos que passam por liquidação ou intervenção, pode dar a impressão ao investidor de que todos CDBs são iguais. O caso Master, porém, mostra que há alguns obstáculos. A estimativa do FGC é que o ressarcimento estará disponível para solicitação em cerca de 30 dias, período em que a remuneração dos papéis deixa de ser aplicada, por exemplo.
Além disso, investimentos acima do teto de R$ 250 mil não serão reembolsados. Esses aplicadores precisam entrar na fila com credores do banco e esperar para ver quando – e se – vão recuperar mais algum valor.
Para quem quer evitar qualquer tipo de transtorno com CDBs, a solução é entender melhor a aplicação e fazer a seleção antes de investir, de acordo com especialistas. A atenção deve estar voltada ao risco dos títulos, não apenas à remuneração.
“Não havia CDB que pudesse competir com o Master. Entendo a busca pela maior taxa, mas não vale a dor de cabeça. Na renda fixa, é melhor ser conservador”, diz Frederico Nobre, gestor de investimentos da Warren, alertando que o investidor não deve se deixar levar apenas pela remuneração oferecida. “Se é para tomar risco, compre títulos de inflação de longo prazo, ações, criptomoeda etc.”
CDBs são títulos de renda fixa emitidos pelos bancos com o objetivo de financiar suas operações. Ele é uma espécie de um empréstimo que o investidor faz a um banco, chamado de emissor. Eles podem ser prefixados, pós-fixados ou híbridos. Também podem variar, de acordo com o emissor, em prazo prazo, liquidez, rentabilidade e risco.
MAIS RISCO, MAIS RETORNO
Quanto mais sólido um banco, mais líquido e menos rentável tende a ser o investimento, já que uma instituição robusta costuma atrair mais recursos de investidores pessoas físicas e institucionais, como fundos de investimento, de pensão e seguradoras.
Em outubro, antes de o Banco Central liquidar o Master, os CDBs do banco eram os mais rentáveis do mercado. Segundo levantamento da Quantum Finance, eles ofereciam uma remuneração de 117% do CDI em títulos com vencimento em dois anos. Na média, títulos semelhantes pagavam 98,97%.
“O mercado tem sempre um retorno ajustado ao risco. O investidor deve sempre pensar que quando há uma taxa acima da média, há um risco acima da média”, diz Nobre, Warren.
COMO ESCOLHER UM CDB?
Na hora de escolher um CDB, é preciso ter em mente o objetivo daquele investimento. Se é de curto ou longo prazo, uma reserva de emergência ou um colchão de liquidez.
Nos dois últimos casos, o mais importante é que ele tenha liquidez diária. Já se o objetivo for de mais longo prazo, CDBs com vencimento em três anos ou mais podem oferecer um retorno maior.
Stefani Tremea, planejador financeiro CFP pela Planejar, recomenda que o investidor compare o CDB com um título do Tesouro Direto equivalente, para avaliar o prêmio de risco o retorno adicional por aplicar seu dinheiro em um investimento considerado mais arriscado que o Tesouro. Se esta compensação extra não for grande o suficiente pela percepção de risco, ele deve optar por outros CDBs ou investimentos.
“É preciso ter cuidado com CDBs que pagam muito acima do Tesouro [Direto] porque há um maior risco atrelado”, diz Tremea.
Para evitar o risco de depender do FGC, o investidor deve avaliar o banco emissor e, idealmente, olhar as suas demonstrações financeiras com especial atenção ao lucro, patrimônio líquido e rentabilidade.
A principal medida de rentabilidade de bancos é o ROE (retorno sobre o patrimônio líquido, na tradução do inglês). Entre os grandes bancos, as maiores rentabilidades ficam perto de 20%. Entre os menores, ainda em crescimento, eles chegam perto dos 30%.
Outro indicador da saúde dos bancos é o índice de Basileia. Ele mede a solidez da instituição, pela relação entre o capital e o valor emprestado. O ideal é um índice entre 13% e 15% (ou seja, de cada R$ 100 emprestados, até R$ 15 representam recursos próprios do banco).
O investidor também pode consultar relatórios sobre os bancos feitos por casas de análise, bancos de investimento e agências de classificação de risco, bem como seu rating, que dá uma nota para o risco da operação.
REMUNERAÇÃO DO VENDEDOR
Outro ponto de atenção ao se comprar o CDB são os potenciais incentivos que o assessor financeiro ganha do emissor para distribuir o produto. Como mostrou a Folha de S.Paulo, corretoras e assessores de investimento ofereciam ostensivamente CDBs do Master aos clientes, destacando a rentabilidade acima da média e a proteção do FGC e recomendando o aporte abaixo de R$ 250 mil teto da cobertura do fundo. Por trás disso também estava uma comissão gorda que recebiam.
“A corretora tem incentivo em oferecer produtos com melhores taxas para que o cliente final tome mais risco. Como há comissão envolvida, há conflito de interesse”, diz Nobre, da Warren.
A corretora diz nunca ter ofertado um titulo do Master. Tito Gusmão, seu fundador e CEO, afirmou que “ofertar CDB do Master é como supermercado vender iogurte vencido” e defende a remuneração de corretoras por meio de taxas fixas.
O investidor pode questionar o assessor ou gerente e a plataforma sobre a remuneração, mas essa abertura não é obrigatória. Isso porque CDBs, LCAs e LCIs (Letra de Crédito Agrícola e Imobiliário) e títulos do Tesouro não estão dentro da regra de transparência já em vigor pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
Após o caso Master, o Banco Central avalia tomar medidas para deixar transparente a comissão desses produtos.
DIFERENTES TIPOS DE CDB
O mais comum é que CDBs sejam pós-fixados e acompanhem o CDI (Certificado de Depósito Interbancário), que, por sua vez, segue a Selic, a taxa básica de juros. Assim, se a taxa de juros do país sobe, ele rende mais, se cai, rende menos.
Ele pode ter liquidez diária, em alguns dias úteis (D+1, D+2) ou em uma data futura preestabelecida.
Os CDBs de grandes bancos com liquidez diária podem ser utilizados pelo investidor como um colchão de liquidez ou reserva de emergência, assim como o Tesouro Selic, ou um fundo de renda fixa DI de taxa zero.
– CDB PREFIXADO
Nele, a rentabilidade é definida no momento da aplicação, por meio de uma determinada taxa de juros atualmente, é possível encontrar esses CDBs com juro anual de 13,5%. Porém, um resgate antecipado não é possível. Se quiser reaver seu dinheiro é necessário vender este CDB prefixado a outro investidor, no mercado secundário, o que pode acarretar perdas, já que ele estará sujeito à precificação do mercado e não entregará mais a rentabilidade contratada na compra.
Dessa forma, ele é indicado apenas em momentos em que a Selic está para cair. Assim, juros altos por anos à frente ficam garantidos. Do contrário, é possível que ele renda menos que a taxa básica de juros.
– CDB HÍBRIDO
Assim como nos títulos do Tesouro, CDBs podem combinar um juro predeterminado com uma taxa flutuante, geralmente atrelada ao IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). No momento, é possível encontrar títulos a IPCA + 8% ao ano.
Ele é mais indicado para a proteção do valor do dinheiro no longo prazo, já que oferece um ganho real acima da inflação.
– CDB PÓS-FIXADO
Neste caso, o rendimento está atrelado a algum índice, geralmente à Selic, via CDI. Ele é indicado quando essa taxa está em trajetória de alta. No entanto, se a taxa cair, a rentabilidade também cai. Atualmente, encontram-se CDBs a 99,5% do CDI.
COMO FUNCIONA O FGC
O FGC protege o investidor contra a liquidação de instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central a funcionar no Brasil.
O pagamento desse seguro costuma ser rápido, logo após as informações dos credores serem fornecidas pelo interventor ou liquidante indicados pelo Banco Central para administrar a instituição em regime especial. Para receber, o cliente ou o investidor desta instituição precisa se cadastrar no app do FGC.
Em 2021, na liquidação extrajudicial da Companhia Hipotecária Brasileira (CHB), todos os credores foram ressarcidos pelo FGC em apenas dois dias, somando R$ 120 milhões pagos.
Porém, há um limite de R$ 250 mil a serem ressarcidos por CPF ou CNPJ pelo FGC em caso de intervenção ou liquidação da instituição financeira pelo BC. Caso o investidor ou correntista tenha mais que isso em um CDB ou em uma conta corrente, o valor excedente entrará na fila de demais credores. Segundo o fundo, mais de 99% dos depositantes/investidores têm investimentos até R$ 250 mil.
Se houver liquidação de mais de uma instituição onde ele é cliente, há uma limitação de R$ 1 milhão de ressarcimento a ser recebido pelo FGC em um intervalo de quatro anos do primeiro pagamento.
Outro ponto importante é que o FGC considera como mesmo emissor todas as instituições de um mesmo conglomerado. No caso do Master, por exemplo, CDBs de subsidiárias entram nesta conta.
Em caso de conta conjunta, o teto segue de R$ 250 mil, independentemente da quantidade de titulares na conta.
O mesmo vale para o saldo final de um investimento. Se o investidor aloca R$ 250 mil no CDB de uma instituição que vier a falir, ele perde toda a rentabilidade do papel porque seu investimento ultrapassou o teto do FGC. Dessa forma, para assegurar a cobertura do FGC, é preciso fazer o cálculo de quanto investir considerando qual será o montante final do investimento.
Há também incidência de Imposto de Renda sobre os investimentos tributáveis, que será descontado do valor total da garantia a ser paga. Pode haver ainda cobrança de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), se o prazo entre a data da aplicação e a data da Intervenção ou liquidação extrajudicial for inferior a 30 dias.
Caso o montante some R$ 250 mil e tenha sido feito em datas distintas, o montante a ser ressarcido será acumulado na ordem da aplicação mais antiga para a mais recente e retidos os impostos correspondentes a cada um.
EXEMPLO 1:
Valor Investido = R$ 250.000,00
Saldo Total na Data Base = R$ 277.777,78
Rendimento de R$ 27.777,78
Limite de Garantia R$ 250.000,00
Proporção: R$ 250 mil/R$ 277.777,78 = 0,9 que correspondente a 90% do total
Alíquota IR = 15% IR sobre o rendimento total = R$ 4.166,67
90% correspondente do IR = R$ 3.750,00 (Aplica-se a regra de resgate parcial antecipado)
Valor líquido para o Credor = R$ 250.000,00 R$ 3.750,00 = R$ 246.250,00
Saldo remanescente a ser habilitado na IF em liquidação = R$ 27.777,78
EXEMPLO 2:
Valor Investido = R$ 240.000,00
Saldo Total na Data Base = R$ 285.381,23
Rendimento de R$ 45.381,23
Limite de Garantia R$ 250.000,00
Proporção: R$ 250 mil/R$ 285.381,23 = 0,876 que correspondente a 87,6% do total
Alíquota IR = 17,5% IR sobre o rendimento total = 7.971,71
87,6% correspondente do IR = R$ 6.956,94 (Aplica-se a regra de resgate parcial antecipado)
Valor líquido para o Credor = R$ 250.000,00 R$ 6.957,11 = R$ 243.043,06
Saldo remanescente a ser habilitado na IF em liquidação = R$ 35.381,23