BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O dono do Banco Master, Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB (Banco de Brasília) Paulo Henrique Costa e o diretor de Fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino, são ouvidos na tarde desta terça (30) pela Polícia Federal e, se necessário, terão as suas versões confrontadas em uma acareação.
Os depoimentos ocorrem presencialmente na sede do STF (Supremo Tribunal Federal) e são acompanhados por um membro do Ministério Público e por um juiz auxiliar do gabinete do ministro Dias Toffoli.
Inicialmente, a previsão era de que seria realizada uma acareação entre os três, mas Toffoli recuou e decidiu que a delegada responsável pelo caso, Janaína Palazzo, deverá tomar os depoimentos previamente e, se necessário, confrontar as versões por meio de uma acareação. Ela foi responsável pelo pedido de prisão de Vorcaro no dia 17 de novembro.
Vorcaro, que está monitorado com tornozeleira eletrônica, deve depor presencialmente, assim como Costa. Ambos são investigados, ao contrário do representante do Banco Central.
Os depoimentos, que devem ser iniciados às 14h, tratarão da tentativa de venda do Banco Master.
A decisão inicial de Toffoli por uma acareação no penúltimo dia do ano, que foi tomada sem pedido da Polícia Federal e sob questionamento da PGR (Procuradoria-Geral da República), levantou críticas de juristas e desconfiança de instituições financeiras.
Normalmente, uma acareação serve para sanar inconsistências em depoimentos com declarações divergentes em um processo penal entre acusados, vítimas e testemunhas, por exemplo. O confronto dos relatos ajuda o juiz a buscar a versão mais fidedigna antes de sua decisão.
Mas Toffoli havia marcado a acareação antes de serem tomados depoimentos individuais e apontadas contradições objetivas entre os personagens do caso.
O ministro vinha argumentando que já existiam informações divergentes nos autos do inquérito.
Interlocutores de Toffoli diziam que a intenção do ministro era de verificar inconsistências entre entendimentos de Vorcaro, que queria vender o Master, da cúpula do BRB, que estava prestes a comprá-lo, apesar de suspeitas sobre a sustentabilidade do negócio, e o BC, que fiscalizava a integridade das instituições.
A acareação também avaliaria a atuação da cúpula do BRB diante dos indícios de fraudes que foram levantados ao longo da negociação, como alertas emitidos pelo Banco Central.
Além disso, seriam averiguadas as medidas tomadas pelo BC na fiscalização do mercado de títulos bancários.
Um dos advogados de Vorcaro, Sérgio Leonardo, afirma que o depoimento e eventual acareação serão “uma grande oportunidade para esclarecer os fatos e mostrar que não houve nenhuma fraude”.
O advogado de Costa, Cleber Lopes, afirma que a defesa está segura “de que o BRB agiu dentro das práticas de mercado e não houve nada de ilegal”.
Já o Banco Central apresentou questionamentos no processo sobre a acareação. O órgão perguntou qual o motivo de Toffoli considerar como tão urgente a medida.
Também solicitou que o ministro informasse se o diretor Ailton de Aquino foi chamado na audiência na condição de testemunha, acusado ou de pessoa ofendida.
Em despacho, Toffoli disse que nem o BC nem Aquino são investigados, mas defendeu urgência na realização da audiência, sob a justificativa de que o caso tem repercussão sobre o mercado financeiro nacional.
“Tendo em vista que o objeto da investigação tange a atuação da autoridade reguladora nacional, sua participação nos depoimentos e acareações entre os investigados é de especial relevância para o esclarecimento dos fatos”, disse Toffoli no despacho.
“Ressalto, ademais, que o objeto da investigação cinge-se à apuração das tratativas que orbitaram a cessão de títulos entre instituições financeiras sob o escrutínio da autoridade monetária conforme disposição legal, é salutar a atuação da autoridade reguladora nacional e sua participação nos depoimentos e acareações entre os investigados.”
Além do BC, a PGR também pediu para suspender por tempo indeterminado a acareação, sob o argumento de que seria prematuro realizar o procedimento em um momento no qual ainda não há contradições a serem esclarecidas. Toffoli negou o pedido e manteve a audiência.
Instituições financeiras também reagiram ao procedimento em uma nota conjunta na qual defenderam o Banco Central e afirmaram que “a presença de um regulador técnico e, sobretudo, independente do ponto de vista institucional e operacional, é um dos pilares mais importantes na construção de um sistema financeiro sólido e resiliente”.
O texto é assinado pela Febraban (federação dos bancos), ABBC (associação de bancos), Acrefi (associação das instituições de crédito) e Zetta (associação de empresas do setor financeiro). Nesta segunda (29), a ABDE (Associação Brasileira de Desenvolvimento) se juntou à defesa do BC e disse que sua autoridade técnica e exercício autônomo são condições indispensáveis para “a manutenção da estabilidade, credibilidade, confiança, higidez e bom funcionamento do sistema financeiro nacional”.
O processo no qual ocorrerão os depoimentos é sigiloso. Desde o começo de dezembro, diligências e medidas ligadas à investigação sobre o Master e Vorcaro têm que passar pelo crivo de Toffoli, por decisão do próprio magistrado.
A investigação sobre a tentativa de venda do Master apontou que, antes mesmo da formalização do negócio, o banco teria forjado e vendido cerca de R$ 12,2 bilhões em carteiras de crédito consignado para o BRB R$ 6,7 bilhões em contratos falsos e R$ 5,5 bilhões em prêmios, o valor que supostamente a carteira valeria, mais um bônus.
O escândalo do Master levou à liquidação do banco em 18 novembro e à prisão de Daniel Vorcaro, seu controlador, por 12 dias. Ele segue monitorado por tornozeleira eletrônica.
A urgência na determinação de uma audiência com um representante do Banco Central tem levantado outros temores com as investigações sob a responsabilidade de Toffoli.
Pouco antes do Natal, dois oficiais de Justiça estiveram no Master, em São Paulo, à procura do liquidante da instituição, Eduardo Félix Bianchini, o que alimentou a expectativa de que ele seja intimado para prestar esclarecimentos nos próximos dias.
Servidor aposentado do Banco Central e escolhido pelo regulador para cuidar da liquidação do banco de Vorcaro, Bianchini passou o Natal com a família fora de São Paulo e não estava no escritório durante a visita dos oficiais.
O gabinete de Toffoli negou, por meio da sua assessoria, que tenha partido dele o envio de oficiais de Justiça para intimar o liquidante do Master.