FGV: mercado de trabalho formal cresce, mas produtividade está estagnada há mais de quatro décadas

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Produtividade precisa se espalhar pelos setores, diz FGV. Isso exige investimento e inovação
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  • Crescimento "espetacular" do ano passado (2,3%) revela desequilíbrio: agropecuária cresce 21% e serviços, somente 0,1%
  • Para analista, Brasil já passou do pico demográfico e precisa com urgência aumentar a produtividade. Ou continuará sendo "o país das oportunidades perdidas"
Por Vitor Nuzzi

[AGÊNCIA DC NEWS]. Em meio a um recente debate sobre mudanças legais na jornada de trabalho, especialistas da Fundação Getulio Vargas (FGV) observam que a produtividade – fator básico para o crescimento sustentável – praticamente não saiu do lugar neste ano: 0,3% até o terceiro trimestre. Isso depois de crescer 2,3% no ano passado, número considerado “espetacular” pela coordenadora do Boletim Macro, do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre), Silvia Matos. A produtividade é calculada pela divisão do Valor Adicionado (correspondente a 87% do PIB) pelo número de horas trabalhadas (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua). Mesmo levando em conta o número fora da curva do ano passado, ao se considerar todo o período 1981/2023, o Valor Adicionado subiu acima das horas. Em resumo, a produtividade brasileira não avança há quatro décadas e meia.

Mesmo sendo exceção, o ótimo resultado de 2023 mostra também um sinal de desequilíbrio na economia, com oscilações entre os setores de atividade. A produtividade na agropecuária, por exemplo, cresceu 21% no ano passado. Em 2024, o desempenho como um todo voltou a cair. O Valor Adicionado cresceu 3,7% no terceiro trimestre em relação a igual período do ano passado. Já o volume de horas trabalhadas aumentou 3,6%. “Essa diferença dá um crescimento muito baixo em termos interanuais”, disse Silvia. No período 1981/2023, o Valor Adicionado subiu acima das horas, mas “essa diferença só foi possível porque tivemos o bônus demográfico.” Isso significa que a População em Idade Ativa (PIA) cresceu acima da população total. Ou seja, o país cresceu economicamente não pelo aumento da produtividade.

Algo que o Brasil não verá mais, segundo o pesquisador do FGV Ibre Fernando de Holanda Barbosa Filho. “A gente já passou do pico. Estamos entrando no ônus demográfico”, afirmou. “O trem da demografia passou. Se não for via produtividade, a gente vai ter de se consolar em viver, mais uma vez, no país das oportunidades perdidas.” Ainda que o país esteja vivendo crescimento do emprego formal e melhoras em termos de escolaridade e no Índice de Capital Humano, ele diz que “nada disso vai andar se a gente não resolver nosso problema de base”. Ou seja, dívida pública. Enquanto isso não acontecer, haverá ganhos de produtividade temporários, mas não consistentes e sustentáveis. “Falta a gente melhorar a alocação de capital, reduzir o favorecimento para determinados setores.”

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A eterna questão do equilíbrio. Silvia Matos afirma, por exemplo, que a produtividade precisa ser “espalhada”. Enquanto a produtividade na agropecuária cresceu 21% em 2023, a indústria aumentou 2% e os serviços – setor que concentra 70% das horas trabalhadas –, apenas 0,1%. Isso também exige investimento em pesquisa e desenvolvimento. Ela cita exemplos bem-sucedidos, como o papel da Embrapa no agro e a relação direta entre a Embraer e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Além da necessidade de parcerias com empresas internacionais – e muita inovação. Por esse motivo, programas de reserva de mercado, que marcaram vários setores da economia nacional – como o de tecnologia – se mostraram erros grosseiros. Sobre esse tema, Fernando de Holanda é taxativo. “Imagine se a Embraer não pudesse usar componentes importados. Não decolaria nenhum avião”, disse, ao criticar políticas de conteúdo local.

A complexa questão da produtividade tem outros ingredientes, que no Brasil só são amplificados, como a informalidade. Coordenador do Observatório da Produtividade da FGV, Fernando Veloso diz que em 2019, antes da pandemia, a informalidade no mercado de trabalho aumentava e a produtividade caía. Agora, a taxa de desemprego está no seu menor nível (6,2%) – a série histórica da Pnad Contínua começa em 2012. E só neste ano o mercado formal deverá criar 2 milhões de postos de trabalho com carteira assinada, pelos números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Isso deveria contribuir para o aumento da produtividade, mas não ocorreu porque uma ponta da equação está solta, o desequilíbrio fiscal. “A relação dívida/PIB é impeditivo para um crescimento sustentável”, afirmou Veloso.

Para ele, uma das principais lacunas da economia brasileira está na baixa integração internacional, com uma política industrial protecionista. Os três analistas participaram na quarta-feira (11) de webinar promovido pelo FGV Ibre e pelo Valor Econômico. Em texto recentes, eles alertaram que o comportamento da produtividade de 2020 em diante deve ser visto com cautela, pois pode refletir mudanças no mercado de trabalho em consequência da pandemia de covid. No início, foram afetados, principalmente, trabalhadores e setores menos produtivos, “contribuindo para a elevação atípica em 2020”. Naquele ano, a produtividade cresceu 12,7%. No entanto, passada a fase mais aguda da pandemia, a retomada dos setores menos produtivos e a volta dos trabalhadores menos escolarizados ao mercado de trabalho resultaram em uma redação da produtividade em 2021 (-8,1%) e 2022 (-4,4%). Para 2025, um desempenho mais positivo do agro vai se refletir em ganho de produtividade – temporário, porém. Nada consistente. Um fator-chave para uma economia robusta.

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