[AGÊNCIA DC NEWS]. O varejista têxtil brasileiro entrou em 2025 com dois desafios macroeconômicos a tiracolo: taxa de juros em 13,25% (e previsão de fechar o ano em 15%, segundo o Relatório Focus do Banco Central) e dólar a R$ 5,69 (e previsão de chegar a R$ 6). Para piorar, ele ainda duela com um inimigo internacional antigo – a China. Os produtos vindos da Ásia chegam ao Brasil a preços mais baixos que os do mercado nacional. O cenário é marcado ainda pela consolidação de gigantes do e-commerce como Aliexpress, Shein, Shopee e a novata Temu, no país desde o ano passado. Apesar do cenário interno desafiador, Edmundo Lima, diretor-executivo da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (Abvtex), diz que o macroeconômico não afetará o desempenho do setor neste ano. A perspectiva é positiva para 2025, porém, a batalha com os markeplaces internacionais ainda incomoda. “A diferença tributária praticada no mercado nacional é 35% a 40% em relação aos produtos importados, gerando uma concorrência desleal.” Confira a entrevista completa.
AGÊNCIA DC NEWS – Como a Selic e o dólar mais alto podem impactar o varejo neste ano e qual a perspectiva para o setor?
Edmundo Lima – Entendemos que essas variáveis encontrarão um ponto de equilíbrio. A gente continua mantendo uma perspectiva positiva para 2025.
AGÊNCIA DC NEWS – Mesmo em relação à inflação, que deve novamente estourar o teto da meta?
Edmundo Lima – A pandemia desestabilizou todas as cadeias produtivas globais. O mundo inteiro teve problema de fornecimento. Algumas questões perduram até hoje. No Brasil, importamos muitos insumos, desde corantes, tecidos e fios. Porém, o setor têxtil foi um dos que conseguiu segurar melhor a inflação.
AGÊNCIA DC NEWS – Pode explicar melhor essa conta?
Edmundo Lima – Quando você pega todo o período já medido de inflação desde o Plano Real a gente tem aí uma média de 700% a 800% [723,97%, segundo o IBGE] de inflação nas indústrias. No setor têxtil, fica entre 300% e 500%, dependendo da categoria de produto [407,98% na média, segundo o IBGE]. A gente percebe que o vestuário, ao longo dos anos, registrou menos aumento de preço. Isso se deve a um esforço da indústria de segurar esses aumentos em relação aos insumos, mas também por uma negociação forte do varejo buscando não levar para o consumidor essa pressão por aumento de custo nos elos de produção.
AGÊNCIA DC NEWS – O mercado têxtil chinês tem impactado a competitividade do mercado brasileiro há pelo menos 40 anos, principalmente no e-commerce. Em 2025, temos outro grande player, a Temu. Como isso afeta o setor?
Edmundo Lima – A gente não tem medo dessa concorrência contanto que as regras do jogo sejam as mesmas.
AGÊNCIA DC NEWS – Especialmente quais regras?
Edmundo Lima – A principal é a carga tributária. Ela é bem menor para as empresas de fora.Hoje, ao avaliar quanto varejo e indústria nacional pagam ao longo dos elos da cadeia produtiva, estudos conduzidos por nós apontam para 80% a 90% de impostos, dependendo do tipo de produto. Já as plataformas internacionais, até agosto deste ano, pagavam só o ICMS, de 17%.
AGÊNCIA DC NEWS – Como ficou com as novas taxas, a das Blusinhas?
Edmundo Lima – A partir de agosto, as plataformas internacionais passaram a pagar mais 20% de Imposto de Importação, o que dá um total de Carga Tributária de 45% O que ainda representa diferença de 35% a 40% do que é recolhido atualmente na indústria nacional.
AGÊNCIA DC NEWS – Além da carga tributária, existem outras diferenças?
Edmundo Lima – Também existem diversas conformidades de produto e normas nacionais que não são seguidas por muitos itens dessas plataformas.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais os diferenciais do varejo têxtil nacional?
Edmundo Lima – O varejo brasileiro vem investindo muito em tecnologia, principalmente depois da pandemia, e também desenvolvemos bastante o e-commerce. Com esses diferenciais, a gente não teme a concorrência das grandes empresas internacionais, mas vamos continuar lutando para que as regras do jogo sejam as mesmas.
AGÊNCIA DC NEWS – Qual a importância dos pequenos produtores no varejo têxtil brasileiro?
Edmundo Lima – Praticamente 98% do vestuário brasileiro é produzido por micro e pequenas empresas.
AGÊNCIA DC NEWS – Como as mudanças no Simples Nacional, via Reforma Tributária, podem afetar negativamente a categoria dos pequenos produtores?
Edmundo Lima – Existe um risco e isso vem sendo fortemente discutido junto aos parlamentares. Não tenho dúvida de que o governo e os congressistas brasileiros terão sensibilidade de entender essa questão vinculada às micro e pequenas empresas. Estamos trabalhando para que as empresas tenham todas as condições de se desenvolver. A gente não pode trazer uma Reforma Tributária que coloca em xeque todo o parque industrial brasileiro, porque isso não se reverte da noite para o dia.
AGÊNCIA DC NEWS – Como a Abvtex trabalha o tema da informalidade no setor de moda?
Edmundo Lima – De 35% a 40% de tudo que se comercializa de vestuário no país é feito de maneira informal e com altos graus de irregularidade. É uma concorrência desleal com as empresas estabelecidas regularmente. Isso vale para os camelôs e para a feira da madrugada em São Paulo. Mas não só. Atualmente, todas as capitais têm uma feira, um grande centro de comércio informal. E também tem o comércio informal através das redes sociais em que muitas vezes não se emite nota fiscal. A informalidade também não segue as regras tributárias e ambientais. Isso tudo precisa ser fiscalizado pelo governo para garantir que quem faz tudo da forma correta não saia perdendo.
AGÊNCIA DC NEWS – A Black Friday de 2024 registrou crescimento maior nas vendas em lojas físicas. Isso é resultado de um investimento maior ou um reflexo do comportamento do consumidor?
Edmundo Lima – Existe um investimento das empresas, ora privilegiando mais um canal ou ambos. Mas, principalmente no varejo de moda, as pessoas querem provar as roupas, tocar as peças. É muito forte essa necessidade.
AGÊNCIA DC NEWS – Que investimentos você destaca?
Edmundo Lima – As lojas têm sido cada vez mais um ambiente agradável para comprar e provar os produtos de maneira mais ágil. Novas tecnologias como o self checkout ajudam a criar esse cenário. E a logística também melhorou muito, com entregas bem mais rápidas.
AGÊNCIA DC NEWS – Tudo somado, melhora muito a experiência…
Edmundo Lima – Sim. O varejo vem investindo em uma experiência de compra mais unificada [entre o físico e o digital], reduzindo a fricção nessa relação.
Correção: Diferentemente do que foi publicado, a expressão “a China é ainda uma pedra no sapato que mais nos incomoda” não foi dita por Edmundo Lima. O texto foi corrigido na segunda-feira (24) às 17h20.