SÃO PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Depois de passarem boa parte da manhã em alta expressiva, as curvas de juros futuros se firmaram no negativo no pregão desta quinta-feira (17).
A volatilidade é reflexo da mudança da percepção do mercado sobre o contexto internacional -sobretudo os efeitos das sobretaxas de importação do governo Donald Trump nos Estados Unidos no cenário político e econômico brasileiro.
A taxa do contrato de DI (depósito interfinanceiro) com vencimento para janeiro de 2026 fechou praticamente estável, a 14,94%. A de janeiro de 2027 caiu de 14,37%, do ajuste anterior, para 14,34%, enquanto a de janeiro de 2029 ficou em 13,62%, ante 13,70%. Para 2031, a taxa fechou em 13,79%, ante 13,89%.
Os juros começaram o dia pressionados por uma sucessão de eventos internos, segundo Santiago Schmitti, especialista em renda fixa da Manchester Investimentos -a começar pela melhora da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na pesquisa Quaest.
“A retórica do governo em defesa do Pix [após a investigação comercial conduzida pelos Estados Unidos] resultou em um fortalecimento político de Lula para as eleições de 2026, o que reacendeu no mercado temores de uma política de ampliação de gastos e medidas populistas”, afirma Schmitti.
Trata-se de uma reversão na tendência vista nos últimos dois meses, quando investidores passaram a precificar um novo nome nas eleições e, por consequência, uma nova condução da política econômica a partir de 2027. “Tinha muito efeito Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo e cotado à presidência].”
Em simulações da Quaest de cenários do segundo turno das eleições do ano que vem, o presidente Lula lidera diante de todos os concorrentes, incluindo a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro (PL), e mantém um empate técnico somente com Tarcísio de Freitas, 41% a 37% a favor do petista.
O empate entre eles se dá no limite máximo da margem de erro da pesquisa, que é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Na rodada anterior, Tarcísio marcava 40% das intenções de voto, enquanto Lula tinha os mesmos 41%.
O ganho de popularidade do petista segue ainda a validação do decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, na véspera. Depois de um impasse com o Congresso Nacional levar à judicialização da medida, Moraes chancelou a medida que aumenta as alíquotas do imposto, derrubando apenas a tributação sobre o chamado risco sacado.
A decisão ainda precisa ser referendada pelo plenário da corte, o que deve ocorrer apenas após o recesso do Judiciário no fim do mês.
Se, pela manhã, o mercado seguia elevando os prêmios de risco ao retirar o “efeito Tarcísio” do preço dos ativos, houve uma reversão nessa tendência à tarde. “Bem ou mal, mesmo com o caos do IOF, o mercado entendeu isso como um sinal de que há convergência entre as instituições”, diz Matheus Massote, especialista em câmbio da One Investimentos.
Internamente, segundo apurou a reportagem, a avaliação no Ministério da Fazenda é a de que a preocupação com as contas públicas vai estar sempre no radar dos investidores, mas a decisão do STF de manter parcialmente o decreto vai ajudar a melhorar o resultado fiscal, por mais que o mercado financeiro considere a medida ruim.
O exterior também aliviou a pressão nas curvas. Dados de vendas no varejo nos Estados Unidos subiram mais do que o esperado e outro relatório ainda informou que os pedidos de auxílio-desemprego caíram em relação à semana anterior, também contrariando as projeções. Os resultados empurraram as taxas dos treasuries -os títulos ligados ao Tesouro norte-americano- para baixo, o que também distensionou as curvas brasileiras.
Do lado das curvas de juros reais, porém, as taxas prefixadas do Tesouro IPCA+ seguiram na disparada dos últimos dias.
Nesta quinta, o título com prazo para 2029 ofertava a variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), indicador oficial da inflação do país, mais uma taxa prefixada de 7,83%. Os de vencimentos mais distantes, de 2040 e 2050, rodavam a 7,13% e 6,99%, respectivamente.
Esse tipo de papel, na prática, prevê a proteção do dinheiro do investidor contra a alta de preços, mais um ganho real -as taxas prefixadas- determinado no momento da compra. A taxa é considerada uma espécie de prêmio de risco: quanto maior ela está, mais o mercado está exigindo de retorno para dar o voto de confiança de que a dívida representada pelo título público será paga.
Entre os técnicos do Tesouro Nacional, ouvidos pela reportagem na condição de anonimato, a incerteza causada pelo presidente Trump com o acirramento da guerra comercial contra o Brasil pesa mais no momento nesses indicadores do mercado do que o impacto em si da sobretaxa. E, como a situação fiscal sempre será uma preocupação, é o exterior que mais faz efeito no momento.
Um deles, que atua na gestão da dívida pública do governo, destaca que ninguém sabe o que poderá acontecer e a extensão da crise. Essa dúvida reforça a volatilidade do momento, mantendo as taxas do Tesouro IPCA+ em patamares elevados -em alguns vencimentos, próximas de 8% acima da inflação-, e a escalada da dívida preocupa.
As taxas aumentam o custo da dívida em títulos do governo, mas o perfil de papéis mais diversificado ajuda a suavizar o impacto.
Não se descarta, no entanto, um impacto na composição da dívida (tipos de indexadores aos quais os papéis estão atrelados e prazos), a depender do cenário e das expectativas para o futuro. Ajustes marginais na estratégia de venda de títulos podem ser feitos, calibrando os lotes de ofertas de venda entre os indexadores que corrigem os papéis e os prazos de vencimento.
Não se espera uma mudança estrutural na estratégia de ofertas feitas para o ano. O Tesouro, quando faz o planejamento, já considera vários cenários e sabe que o mercado pode mudar muito ao longo do ano. Por isso, ele aproveita as oportunidades quando o mercado está bom, vendendo mais papéis, e reduz a oferta quando está ruim.