'O Brasil está com desemprego zero para quem quer trabalhar', diz dono da construtora Bueno Netto

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Com 50 anos de atuação no mercado imobiliário paulista, Adalberto Bueno Netto, 75, brinca que não quer mais se aposentar. Atualmente, o empresário se divide entre os lançamentos da construtora que leva seu sobrenome e o Parque Global, um imenso empreendimento de luxo com 218 mil m² nas margens da Marginal Pinheiros, zona sul de São Paulo, que ele chama de seu “sexto filho”.

O conjunto residencial, com 640 apartamentos, está com a maior parte das cinco torres finalizadas e já com moradores ativos. Estão em construção uma nova unidade do hospital Albert Einstein e um centro de inovação, que reunirá um hotel voltado ao turismo médico e do entretenimento em geral, fortalecido na região pelos megaeventos do autódromo de Interlagos.

O terreno ainda abrigará um shopping de grande porte, com torres comerciais anexas, um centro de convenções e novas áreas residenciais. A ideia é ter um bairro em que se possa fazer tudo em 15 minutos.

Lançado em 2013, o empreendimento ficou interrompido por cinco anos por problemas ambientais e urbanísticos, e as obras foram retomadas em 2020. Com problemas para encontrar mão de obra especializada, a Bueno Netto fechou uma parceria com o Senai para resolver um problema que atinge todo o setor, além do cunho social por atender moradores do Paraisópolis, uma das maiores favelas do país.

“O Brasil está com desemprego zero para quem quer trabalhar. Tem muitas oportunidades, os salários subiram muito na construção civil, graças a Deus”, diz o empresário.

PERGUNTA – Como estão as operações da Bueno Netto?

ADALBERTO BUENO NETTO – Estamos em uma fase muito boa. A gente tinha uma expectativa que o ano fosse ser um pouco mais devagar, devido aos juros altos. Comprar um imóvel desse padrão é um desejo, mas também é um investimento sensível. Por incrível que pareça, estamos com um volume de lançamentos de alto padrão muito acima do previsto anteriormente, com cinco grandes empreendimentos de alto padrão, fora alguns outros já em construção.

P. – Apesar das complicações, o mercado tem sobrevivido aos embalos. A pandemia ajudou a precificar esse risco?

BN – A pandemia espalhou um pouco mais o investimento. Muitos procuraram uma segunda residência, condomínios do interior se desenvolveram muito. Mas agora está na hora do mercado de São Paulo ser o mais procurado, efetivamente.

P. – Donos de construtoras fora de São Paulo comentam que esse movimento de compras de imóveis para morar longe do eixo BN – Sudeste está cada vez maior. Balneário Camboriú é um desses exemplos. O senhor acha que o mercado daqui precisa se restabelecer?

Não, na realidade houve um crescimento de outros mercados no Brasil. O próprio agro puxou muito, criou uma nova economia no interior e essa economia está se colocando em alguns lugares, mas o principal lugar que ela se coloca ainda é São Paulo. O mercado de São Paulo é muito maior que esses outros mercados, como o próprio de Balneário Camboriú, que é mais específico, enquanto o de São Paulo tem uma diversidade muito maior.

P. – Como estão as construções no Parque Global?

BN – O Parque Global é um modelo fora de qualquer padrão, porque nós estamos construindo, na realidade, quase uma cidade. É um terreno que nós adquirimos em 2003 e só agora atingiu a plena maturidade. Temos aqui cinco torres de alto padrão, a última sendo entregue agora no final do ano, com 630 apartamentos. E temos mais de 150 famílias já morando aqui. Teremos o hospital do Einstein, com entrega para 2027, um prédio de ensino, que também vai ser um distrito de inovação em parceria com o Einstein, uma faculdade e uma escola bilíngue para atender os moradores, e um grande shopping.

Na realidade, nós estamos fazendo um bairro, que é esse modelo de cidade dos 15 minutos a pé.

P. – Como será o centro de inovação?

BN – Nós propusemos ao Einstein criar um novo núcleo para a rede, pois vimos o potencial do turismo médico. Tem três grandes hospitais em São Paulo, o Einstein, o Sírio Libanês e Oswaldo Cruz, que trazem pesquisa, turismo hospitalar e o turismo de ensino, que corresponde a cerca de 12% do turismo de São Paulo, atingindo mais de 1,5 milhão de pessoas por ano. Você vê lá fora vários centros médicos, grandes hospitais, como o Cleveland Clinic, que chega a ter mil apartamentos, com quatro hotéis integrados. E aqui no Brasil ainda não temos esse modelo de desenvolvimento.

Fizemos uma parceria com o Grupo Emiliano, e vamos lançar agora, em agosto ou setembro, um novo hotel do Grupo Emiliano para atender o turismo médico e também aqui da região, que está se tornou um circuito muito grande para shows, é um novo polo de desenvolvimento.

P. – As construções do Parque foram paralisadas por questões ambientais. Quando o projeto será finalizado?

BN – Teve uma interpretação [da Justiça] que já foi resolvida. Eu não tenho uma perspectiva de quando termina o Parque Global completamente. Agora, com o lançamento do shopping, nós vamos chegar à metade do desenvolvimento. Tudo aqui é integrado por vias internas, ciclofaixa, muito paisagismo, vamos plantar 30 mil árvores no conjunto como um todo, vai ser uma arborização espetacular, com uma série de delicadezas urbanas que vão tornar isso aqui fatalmente um bairro mais valorizado.

P. – O mercado imobiliário de escritórios de alto padrão está se esticando muito para o outro lado do rio. Isso facilita nessa valorização?

BN – Eu te digo que 25% dos escritórios de alto padrão de São Paulo estão exatamente aqui em frente. Tem espaço, o preço é bom, é relativamente tranquilo de chegar. Então, esse outro bairro aqui vai ser um suporte muito grande para quem trabalha na região. A acessibilidade também está prevista, com uma nova ponte de cruzamento para o outro lado, já em projeto na prefeitura. Bom, quando eu comprei 22 anos atrás, ainda não tinha muita coisa. Agora nós efetivamente estamos na hora certa, no lugar certo. Para nós que adoramos urbanismo e arquitetura, que gostamos de fazer coisas boas, ter encontrado esse terreno, para mim, foi um verdadeiro parque de diversões.

P. – Os projetos arquitetônicos mudaram nos últimos anos, os prédios parecem nascer com o pé no futuro que se imaginava lá atrás, são mais arrojados. O senhor acredita que se esse projeto tivesse sido feito 20 anos atrás, o conceito seria outro?

BN – Sem dúvida alguma. Eu posso dizer que o master plan [plano diretor] é básico, por incrível que pareça, não mudou tanto. Mas era só uma implantação, um formato de terreno. Mas, assim, mudou drasticamente. Nós começamos o primeiro estudo, em 2003, com torres baixas no meio de um campo de golfe. Tinha um projeto famoso lá no Rio de Janeiro que tinha feito isso, o Golden Green, um dos melhores condomínios da Barra. E nós, naquela época, nos baseamos naquela ideia. Aqui nós vencemos as barreiras das torres baixas. Eu gosto de torres altas, tem muita densidade aqui. São cinco torres em 44 mil m², uma uma torre a cada quarteirão. E tudo é área verde.

P. – Qual será o VGV (valor geral de vendas) do projeto inteiro?

BN – Por volta de R$ 30 bilhões. É o maior projeto urbano com documento de desenvolvimento aqui. Esse é um dos motivos pelos quais a gente se concentrou mais em São Paulo. Aqui já tem um bom canteiro de obras. Estamos bem posicionados.

P. – O shopping sai quando?

BN – Estamos esperando ainda uma melhora do panorama econômico para iniciar as obras, olhando o mercado para estabelecer, o shopping sempre demora uns anos para se consolidar. Mas, com certeza, não passa de um ano.

P. – Com a Selic a 15%, quais são as dificuldades?

BN – A dificuldade é realmente o pessoal querendo desembolsar, porque a gente tem que vender oportunidade. Quando fazemos o lançamento, colocamos um preço bem especial, para fazer caixa. É a velha e antiga matemática. Então, você faz uma oferta melhor e consegue colocar unidades no começo da construção. Nós temos tido muito sucesso com isso. E a nossa empresa não trabalha com financiamento. Só para obra, até para facilitar a venda, para repasse. Nós não compramos terreno, coisa assim, com empréstimo, já vimos muitos amigos aí se perderem no caminho.

Não temos dívida bancária, não temos nada. Então, a gente tem essa preocupação de trabalhar só com o que podemos. Temos muitos parceiros, muitos investidores conosco sempre, mas sempre com dinheiro próprio, não com empréstimo.

P. – O senhor comentou sobre esperar um momento econômico mais oportuno. É um período difícil agora, do ponto de vista dos negócios?

BN – Do mercado, não. O ano passado foi um ano bom para o varejo. Houve crescimento. Então, essas grandes empresas têm capital aberto, elas têm que, digamos, distribuir. Os sócios querem receber dividendos, então, eles têm que compatibilizar as questões internas para resolver a hora que investir.

P. – Mas a parte econômica do país poderia estar melhor?

BN – Ah, sem dúvida alguma. A gente sempre espera que o governo tome as medidas bem adequadas. Mas, enfim, a política é diferente do que a economia em si.

P. – Vocês se articulam de alguma forma em Brasília para pensar alternativas para o mercado?

BN – Na realidade, o nosso problema não é nem a política, é a mão de obra. Nós montamos uma escola de formação, que está em pleno funcionamento aqui e estou fazendo o Instituto Bueno Netto. Eu acho que, na vida, quando a gente chega em certa idade, temos que fazer coisas complementares, até investimentos complementares. E uma das primeiras atividades foi criar aqui uma escola boa, em parceria com o Senai, para a formação de profissionais. Fazemos a captação de alunos, temos cursos todo mês, formando carpinteiros, pintores. Tem uma parceria muito grande com o Paraisópolis, onde a gente vai voltar agora com o curso para azulejistas e pintura para mulheres. E estamos fazendo outras parcerias, até com outras construtoras, para fazer uma escola permanente, para melhorar o padrão.

O Brasil está com desemprego zero para quem quer trabalhar. Tem muitas oportunidades, os salários subiram muito na construção civil, graças a Deus. Isso também é interessante, porque eu sou engenheiro politécnico e, logo que me formei na Poli, em 1972, fui fazer um curso de especialização em Stanford [EUA]. Eu fiz na área de construção civil, pensando em construções industrializadas. E só agora, 50 anos depois, que eu estou conseguindo fazer algumas dessas aplicações aqui. Tinha uma coisa que parecia boa, mas não era, o salário era baixo. Isso fazia com que ninguém fosse fazer inovação, não dava.

Tenho muito orgulho de falar que não vou parar de trabalhar. Eu tinha resolvido parar uns anos atrás. Esse aqui é o Parque Global, é o sexto filho. Então, vou me divertir criando coisas boas aqui.

RAIO-X | ADALBERTO BUENO NETTO, 75

Engenheiro civil formado pela Escola Politécnica da USP e mestre em gerenciamento de construção pela Universidade de Stanford (EUA), iniciou sua carreira ainda no exterior, participando do planejamento da hidrelétrica de Itaipu. Aos 24 anos, em 1974, fundou a RGB Comercial e Construtora ao lado de dois sócios, empresa que daria origem ao Grupo Bueno Netto, que acaba de completar 50 anos.

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