[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
A manutenção da Selic em 15% ao ano prolonga os efeitos sobre o custo do crédito e coloca pressão adicional no consumo às vésperas das datas mais importantes do varejo. Em eventos como a Black Friday e o Natal, compras de maior valor – sobretudo de eletrônicos e bens duráveis, que dependem de parcelamentos – ficam mais difíceis de realizar em cenário de juros elevados. “O Brasil precisa de um ambiente de negócios mais favorável, que incentive o consumo e o investimento”, disse o presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros. Segundo ele, os juros persistentemente altos dificultam o crescimento e travam a geração de emprego.
Dados recentes do IBGE apontam a desaceleração do varejo. As vendas no comércio varejista fecharam o primeiro semestre com crescimento de 1,8%, mostrando menos dinamismo em relação a igual período de 2024, quando a alta foi de 4,7%. A Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), do IBGE, aponta estabilidade nos três últimos meses, com resultados no campo negativo. Uma estabilidade “com viés de baixa”, segundo o gerente da pesquisa, Cristiano Santos. Ele fala ainda em retração do crédito e “resiliência” da inflação, no primeiro semestre, em itens como a alimentação no domicílio. Os dados da inflação divulgados nesta semana, também pelo IBGE, mostram queda nos preços de alimentos no domicílio – e aumento fora (lanche e refeição).
A perspectiva para do ano, segundo o Bradesco, acompanha o ritmo de desaceleração. Em seu relatório de projeções para a economia, o banco estima alta de 1,6% nas vendas do comércio varejista, 2,5 pontos percentuais menor que o verificado em 2024, quando o comércio avançou 4,1%. O banco afirma que o consumo das famílias ainda deve se expandir no terceiro trimestre, devido ao mercado de trabalho aquecido e algum potencial impacto de precatórios, que pode inserir R$ 12 bilhões na economia a partir do ano que vem. No entanto, os investimentos dos varejistas devem seguir em desaceleração. “No segundo semestre, esperamos PIB próximo de 0%, encerrando o ano em 2,1%”, afirmou o relatório assinado pela equipe técnica do Bradesco.
Para o economista-chefe da CNC, Fabio Bentes, a Selic elevada ajuda a controlar a inflação, mas já cobra um preço alto sobre a economia real. “Os indicadores de atividade mostram retração em setores como comércio e indústria. A manutenção da Selic em 15% prolonga essa pressão sobre o crescimento”, avalia. Segundo ele, no curto prazo, a combinação de juros altos e inflação ainda acima da meta indica um crescimento contido do consumo. Para o setor varejista, a dica é adotar estratégias centradas em preços, parcelamento inteligente e estoques ajustados como formas de mitigar riscos e aproveitar a demanda existente durante o fim de ano.
MANUTENÇÃO – Como esperado, o novo comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom), reforça que a decisão se apoia em um quadro de desinflação ainda gradual e em elevada cautela por parte do Comitê. Na reunião anterior, o Copom havia confirmado o fim do ciclo de alta e manteve a Selic em 15%. O discurso estava voltado para a ancoragem das expectativas no horizonte de longo prazo. No campo da inflação, apesar de sinais de arrefecimento pontual, o índice permanece significativamente acima da meta. Projeções de mercado apontam que a inflação só deve voltar ao intervalo de tolerância entre o final de 2026 e 2027.
Segundo Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, a decisão visa garantir o arrefecimento da atividade e maior controle dos preços. “A inflação ainda mostra resiliência e o BC sinalizou que pretende manter os juros em patamar elevado por mais tempo.” O Comitê entendeu que a manutenção da taxa é compatível com a estratégia de convergência da inflação para retomar a meta ao longo do horizonte relevante. Para Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval, o cenário segue incerto: a manutenção do patamar elevado por período prolongado abre espaço para que aumentos adicionais voltem a ser considerados caso a inflação se desancore.
Segundo o CEO da iHUB, houve, de fato, um arrefecimento de preços, mas abaixo do esperado. “Grande parte desse arrefecimento decorreu de fatores pontuais, como bônus na conta de energia e recuo nos preços de alguns alimentos”, afirmou Cunha. No relatório, o BC registrou que, no âmbito doméstico, os indicadores de atividade mostram uma moderação do crescimento, enquanto o mercado de trabalho mantém dinamismo. Para Cardoso, esse dinamismo na ocupação pesa na avaliação do Comitê. “Nas divulgações mais recentes, a inflação cheia e as medidas subjacentes mantiveram-se acima da meta”, aponta o relatório do BC. Para ambos os especialistas, isso significa que a redução da Selic não é esperada imediatamente. “Pelo que o mercado projeta, a redução deve começar apenas no início do ano que vem”, disse Cunha.
EUA – No comunicado do BC, um dos pontos ressaltados é que “o ambiente externo se mantém incerto em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos”, o que afeta diferentes classes de ativos e tem reflexos nas condições financeiras globais. O BC diz que esse contexto exige cautela por parte de países emergentes. Para Cunha, o recente corte do Fed (0,25 ponto percentual) sinaliza um novo ciclo de flexibilização, o que pode, em tese, beneficiar mercados emergentes como o Brasil.
Conhecida como “Superquarta” pela coincidência com a decisão americana, o Fed anunciou um corte de 0,25 ponto percentual, passando a meta para a faixa entre 4,00% e 4,25%. Foi a primeira redução em cerca de nove meses; o último corte havia ocorrido em 19 de dezembro do ano anterior. O presidente do Fed, Jerome Powell, apontou que deterioração nos dados do mercado de trabalho e queda nos investimentos foram elementos relevantes para a decisão.
No relatório, o Copom também afirmou que segue acompanhando anúncios sobre tarifas comerciais dos EUA ao Brasil e os desdobramentos da política fiscal doméstica, avaliando como esses fatores afetam a política monetária e os ativos financeiros. “O cenário segue com expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência da atividade econômica e pressões no mercado de trabalho”, afirmou o comunicado.