BC deve manter Selic em 15% ao ano e encerrar ciclo de alta de juros, dizem economistas

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central deve manter nesta quarta-feira (30) a taxa básica de juros (Selic) inalterada em 15% ao ano –maior nível em quase duas décadas– e encerrar o ciclo de aperto depois de dez meses de alta.

Qualquer decisão diferente dessa seria motivo de surpresa para o mercado financeiro, que espera que o colegiado siga o plano traçado no encontro anterior, em junho, quando sinalizou a pausa a fim de examinar os impactos acumulados do ajuste já realizado.

Foram 4,5 pontos percentuais acumulados após sete aumentos consecutivos desde o início do ciclo, em setembro do ano passado, ainda na gestão de Roberto Campos Neto.

Entre os agentes econômicos, a expectativa é de um Copom de poucas novidades, com foco na mensagem de que a Selic deverá ficar estacionada em um patamar alto o suficiente para contrair a economia por período bastante prolongado.

Em relatório, o J.P. Morgan destaca que provavelmente o colegiado do BC dará ênfase à sua “vigilância e perseverança” em manter os juros altos até que o processo de desinflação esteja firmemente estabelecido.

Desde a última reunião, concretizou-se o primeiro estouro da inflação desde que o sistema de avaliação contínua entrou em vigor, em janeiro deste ano.

Com alta acumulada de 5,35% nos 12 meses até junho, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) ficou acima do limite superior do alvo por seis meses seguidos. O objetivo central perseguido pelo BC é 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.

Em justificativa pelo estouro, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, projetou que a inflação volte a ficar abaixo do teto da meta a partir do fim do primeiro trimestre de 2026. Devido aos efeitos defasados da política de juros sobre a economia, a partir desta reunião, o Copom passa a ter a inflação do primeiro trimestre de 2027 na mira.

Embora nas últimas semanas tenha crescido a tensão com o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de uma sobretaxa de 50% para produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, o J.P. Morgan acredita que o Copom vai preferir dar ênfase à incerteza provocada pelo potencial choque e evitar tirar conclusões neste momento.

Marco Caruso, economista do Santander, também não espera que o comitê já incorpore efeitos do tarifaço de Trump, visto que a discussão ainda não está consolidada e retrocessos ou avanços nas negociações podem ocorrer nos próximos dias e semanas.

Na visão dele, o colegiado do BC não deve jogar luz a mudanças marginais diante de uma estratégia de estabilidade dos juros por tempo prolongado.

“Estão tendo os primeiros sinais de uma desaceleração da atividade [econômica] como ele [BC] projetava, uma inflação mais baixa. O Copom está tendo as suas primeiras batalhas vencidas, então, provavelmente ele vai querer mudar muito pouco”, afirmou. “Me parece que vai ser um comunicado, se não idêntico, muito parecido com o anterior.”

Para Caruso, o comportamento do câmbio tem surpreendido positivamente, mas as incertezas não estão saindo de graça. As tarifas de Trump no cenário externo e as questões fiscais no ambiente doméstico freiam uma melhora mais significativa do real frente ao dólar. A moeda norte-americana fechou em alta na sexta-feira (25), cotada a R$ 5,5619. Nos cálculos dele, em comparação com os pares, poderia estar por volta de R$ 5,15.

Além dos impactos negativos, como uma possível desaceleração mais acentuada da economia brasileira, as tarifas de Trump podem, por outro lado, gerar um efeito desinflacionário com o aumento de oferta de alimentos no mercado doméstico.

O especialista em inflação Heron do Carmo, professor da FEA-USP (Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo), ressalta que a alimentação no domicílio, que chegou a acumular inflação de mais de 10% em 2024, já sofreu redução significativa neste ano –6,23% em 12 meses até junho– e segue em tendência de queda.

“Com a redução da demanda americana, por exemplo para carnes, laranja e outros produtos devido ao tarifaço, e a dificuldade de alocar esses produtos muito rapidamente em outros mercados, isso tudo deve fazer com que se torne mais acentuada a tendência de redução do preço relativo desses produtos internamente”, afirma.

Isso pode ajudar a inflação a terminar o ano, na projeção dele, em torno de 5%, mais próxima do teto da meta. Carmo avalia que a trajetória mais comportada da inflação e a leve melhora nas expectativas podem abrir espaço para o Copom começar a cortar os juros na última reunião do ano, em dezembro, ou no início de 2026.

As expectativas de médio prazo, contudo, seguem distantes do centro da meta, o que é motivo de desconforto para os membros do colegiado. De acordo com o último boletim Focus, os analistas projetam que o IPCA termine 2026 em 4,45%. Para 2027, a estimativa mediana do mercado segue em 4%.

Apesar do otimismo no curto prazo, o professor da USP vê com preocupação o comportamento dos preços em 2026, ano de eleições presidenciais. “A inflação pode recuar e depois resistir em determinado patamar. Pode até voltar a subir, a depender dos gastos públicos”, diz.

O ciclo eleitoral pode mexer com as expectativas de inflação e trazer volatilidade para o câmbio, considera Tony Volpon, ex-diretor do BC. Na avaliação dele, o mercado quer acreditar em uma mudança de regime político, ainda que não admita isso abertamente.

“Posso imaginar um cenário em que, se essa expectativa não for lastreada pelas pesquisas de opinião, o mercado comece a piorar. Isso vai constranger o BC a fazer qualquer movimentação nos juros”, afirma.

“[A redução dos juros] vai depender dessa evolução, hoje não dá para desenhar um cenário econômico de política monetária sem ter alguma hipótese subjacente de ciclo político, como vai se desenvolver no tempo”, acrescenta.

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