BC prevê que inflação volte a ficar abaixo do teto da meta a partir do fim do 1º tri de 2026

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Crédito: Bruno Peres/Agência Brasil

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Banco Central prevê que a inflação oficial do Brasil volte a ficar abaixo do teto da meta a partir do fim do primeiro trimestre de 2026. Esse foi o prazo estipulado pelo presidente da autoridade monetária, Gabriel Galípolo, em carta aberta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Em justificativa pelo estouro da meta de inflação -o primeiro desde que entrou em vigor o modelo de avaliação contínua- Galípolo citou a contribuição da atividade econômica aquecida, das expectativas de inflação distantes da meta, da inércia inflacionária [herdada da inflação passada] e da depreciação cambial. Foi o segundo documento assinado pelo atual chefe do BC em apenas seis meses.

O estouro da meta foi confirmado depois que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) comunicou que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acumulou alta de 5,35% nos 12 meses até junho.

O alvo central perseguido pelo BC é 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que a meta é considerada cumprida quando oscila entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).

Ao detalhar os elementos que contribuíram para o desvio da meta, Galípolo ressaltou que a atividade econômica surpreendeu positivamente, com crescimento do PIB (Produto Interno Bruto] acima do esperado. Mencionou também que o mercado de trabalho seguiu bastante aquecido, refletindo o aumento do consumo das famílias e do investimento. O impacto do hiato do produto positivo (indicação de que a atividade operando acima do seu potencial) foi de 0,47 ponto percentual.

O presidente do BC também destacou que as expectativas de inflação mantiveram-se bastante superiores à meta desde meados de 2024, contribuindo para um desvio de 0,58 ponto percentual. Acrescentou que elas apresentam “relativa rigidez” em valores acima de 3% para prazos mais longos.

“A manutenção da desancoragem [distância em relação à meta] por período prolongado tende a tornar as expectativas mais sensíveis a choques de curto prazo, pressionar a dinâmica de preços e salários e aumentar o repasse cambial para preços”, alertou.

A inércia inflacionária, ou seja, a herança da inflação passada teve um papel relevante no estouro da meta (0,69 ponto percentual). Como exemplo, citou que os reajustes nas negociações salariais não só acompanharam o movimento da inflação passada, como a superaram. “Além disso, o salário mínimo em 2025 aumentou 7,5%, o que representa 2,7 p.p. acima da inflação de 2024”, escreveu.

Galípolo ressaltou ainda que os efeitos defasados da alta do câmbio ao longo de 2024 tiveram forte impacto na inflação medida no segundo trimestre de 2025, como a pressão sobre os preços de bens industriais e alimentos industrializados.

Com relação ao clima, disse que a piora do cenário hídrico resultou em mudanças da bandeira tarifária de energia que pressionaram a inflação (0,27 ponto percentual).

No documento, o chefe da autoridade monetária assegurou que estão sendo tomadas as devidas providências para que a inflação retorne à faixa da margem de tolerância e atinja a meta de 3% e detalhou o ciclo de alta de juros. Em junho, a taxa básica (Selic) alcançou 15% ao ano.

“O Banco Central se manterá atento à evolução das pressões inflacionárias e não hesitará em tomar medidas adicionais, caso julgue apropriado”, afirmou.

De acordo com Galípolo, o Copom (Comitê de Política Monetária) avalia diversos cenários, que consideram trajetórias diferentes da Selic e para as expectativas de juros de mercado.

Nas projeções do cenário de referência, a inflação acumulada em quatro trimestres ficará na faixa de 5,4% a 5,5% nos três primeiros trimestres de 2025, caindo para 4,9% no final do ano até atingir 4,2% no fim do primeiro trimestre de 2026, mantendo-se dentro do intervalo de tolerância a partir de então.

“Durante o período de desenquadramento, o Banco Central investirá no reforço da comunicação sobre as razões do descumprimento da meta, sobre as medidas adotadas e sobre a evolução do cenário de convergência da inflação”, disse.

A nova sistemática, em vigor desde janeiro, prevê que a meta é considerada descumprida quando a inflação, medida pela variação de preços acumulada em 12 meses, fica por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância. Nesse modelo, o BC busca o alvo sem se vincular ao chamado ano-calendário, ou seja, ao período de janeiro a dezembro.

Quando a inflação fica acima ou abaixo da margem de tolerância, o chefe do BC precisa escrever uma carta ao presidente do CMN (Conselho Monetário Nacional) -cargo ocupado pelo ministro da Fazenda- explicando as razões para o descumprimento da meta e dizendo como pretende assegurar o retorno da inflação aos limites estabelecidos.

Se a inflação não voltar ao intervalo no prazo estipulado na carta ou o BC considerar necessário atualizar o período previsto, a autarquia deverá divulgar novo documento.

Além da carta, o BC manterá uma nota trimestral no relatório de política monetária durante o período de descumprimento da meta, visando fortalecer a prestação de contas à sociedade.

“O Banco Central entende que essa vigilância é consistente com a diretriz de verificação continuada trazida pela nova sistemática de meta para a inflação e melhora o entendimento geral sobre as defasagens temporais da política monetária”, afirmou.

Logo após assumir o cargo, em janeiro, Galípolo teve de se explicar pela inflação ter encerrado 2024 acima do limite superior da meta, ainda na gestão de seu antecessor, Roberto Campos Neto, cujo mandato terminou em 31 de dezembro.

Na primeira carta, o atual chefe do BC atribuiu o descumprimento da meta à força da economia brasileira, ao câmbio depreciado e a fatores climáticos, em um cenário de expectativas deterioradas.

Na véspera da confirmação do novo estouro, em audiência pública na comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, Galípolo demonstrou incômodo com a situação.

“Já tenho esse começo que me incomoda demais na minha gestão de, em seis meses, ter que escrever a segunda carta de descumprimento da meta. Eu escrevi uma em janeiro e vou ter que escrever agora provavelmente uma no mês que vem [o BC informou posteriormente que a carta seria divulgada nesta quinta] por estar descumprindo a meta”, disse.

Ao todo, já foram escritas oito cartas desde a criação do sistema de metas para a inflação no Brasil, em 1999. Campos Neto, que chefiou o BC entre 2019 e 2024, descumpriu três vezes o objetivo -em 2021, 2022 e no ano passado.

Nos casos referentes aos anos de 2015, 2003, 2002 e 2001, foi excedido o limite superior da meta de inflação. O ex-presidente Ilan Goldfajn, por sua vez, teve de se justificar por ter deixado a inflação ficar ligeiramente inferior ao limite mínimo estabelecido para 2017.

Outro presidente do BC que teve de escrever duas cartas foi Henrique Meirelles -o mais longevo chefe da instituição, cujo mandato durou de janeiro de 2003 a dezembro de 2010.

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