Copom vê necessidade de juros mais altos por tempo maior do que o previsto, mostra ata

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) vê necessidade de juros mais altos por tempo ainda maior do que previa anteriormente diante de um cenário em que as expectativas de inflação seguem distantes da meta perseguida pelo Banco Central, mostrou ata divulgada nesta terça-feira (24).

No documento, mencionou cinco vezes o plano de manter a taxa de juros em nível elevado durante um período “bastante prolongado”. Na última quarta (18), o Copom decidiu, por unanimidade, elevar os juros em um ritmo menor, de 0,25 ponto percentual, subindo Selic a 15% ao ano —o maior patamar desde julho de 2006.

Ao justificar a decisão, o colegiado avaliou que a atividade econômica ainda apresenta força, o que dificulta a convergência da inflação ao alvo e requer juros mais elevados.

A meta central é 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que o objetivo é considerado cumprido se ficar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto). O BC trabalha agora mirando a inflação do fim de 2026, conforme o sistema de avaliação contínua.

No boletim Focus divulgado às vésperas do encontro, na semana passada, os analistas projetavam que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) encerraria 2025 acima da meta, em 5,25%, e ficaria no limite superior do intervalo de tolerância em 2026, em 4,5%. Para 2027, a estimativa seguiu estacionada em 4%.

“Nos horizontes mais curtos, a partir da divulgação dos dados mais recentes, observa-se uma queda nas expectativas de inflação. Para os horizontes mais longos, por outro lado, não houve alteração relevante entre as reuniões do Copom”, disse.

O comportamento das expectativas é um fator de desconforto para todos os membros e, na avaliação do comitê, isso torna o cenário de inflação mais adverso e tende a retardar o processo de convergência do IPCA para a meta.

No cenário de referência do colegiado, a projeção de inflação para este ano subiu de 4,8% para 4,9%, ainda bastante acima do teto da meta. Para 2026, a estimativa se manteve em 3,6%.

O comitê analisou que os núcleos de inflação (medida que exclui do cálculo itens mais voláteis) têm se mantido acima do valor compatível com o atingimento da meta há meses, corroborando a interpretação de pressão da demanda sobre a inflação.

O Copom ponderou que o ciclo de alta até então executado foi “particularmente rápido e bastante firme”, reforçando que grande parte do impacto dos juros sobre a economia ainda vai se materializar mais à frente dada a defasagem da política monetária.

O ciclo teve início em setembro do ano passado e até agora foram realizados sete aumentos consecutivos. A Selic acumulou elevação de 4,5 pontos percentuais nesse processo.

Assim como no comunicado, o colegiado do BC repetiu que prevê a interrupção do ciclo de alta da Selic no próximo encontro, em julho. Mas também enfatizou que poderá ajustar os seus passos futuros, se necessário.

“A construção da confiança necessária para definir o patamar apropriado de restrição monetária ao longo do tempo passa por assegurar que os canais de política monetária estejam desobstruídos e sem elementos mitigadores para sua ação”, disse, em referência à potência da política de juros.

Apesar de ter observado uma melhora na conjuntura internacional, como a reversão parcial das tarifas em meio à guerra comercial aberta pelos Estados Unidos, disse que segue a visão preponderante de um cenário ainda incerto e volátil.

De acordo com o colegiado, o conflito geopolítico no Oriente Médio e suas possíveis consequências sobre o mercado de petróleo também adicionam incerteza sobre o ambiente externo. Diante disso, o Copom falou em maior cautela na condução da política de juros no Brasil.

Quanto à trajetória das contas públicas, manteve o alerta de que as políticas monetária e fiscal devem caminhar na mesma direção, o que favoreceria a convergência da inflação à meta, mas fez um leve aceno ao Ministério da Fazenda ao mencionar a proposta de corte de incentivos fiscais.

“O debate mais recente, com ênfase na dimensão estrutural do orçamento fiscal e na redução ao longo do tempo de gastos tributários, tem potencial de afetar a percepção sobre a sustentabilidade da dívida e de ter impactos sobre o prêmio da curva de juros [compensação exigida pelos investidores]”, disse.

Quanto à economia doméstica, disse ver sinais mistos com relação à desaceleração da atividade, mas observou “certa moderação” de crescimento. “O processo de moderação de crescimento segue ocorrendo, embora de forma bastante gradual”, afirmou.

Na visão do Copom, o mercado de trabalho tem contribuído para o dinamismo da atividade econômica, dando suporte ao consumo e à renda. Disse ver “alguma desaceleração” nos rendimentos, mas ainda em patamar elevado. Destacou também que o mercado de crédito se manteve pujante nos últimos trimestres.

“Observa-se um recuo nas concessões de crédito livre, enquanto as concessões de crédito direcionado se mantiveram mais resilientes. Em particular, no crédito às pessoas físicas, há um aumento do comprometimento da renda familiar com o serviço das dívidas e um aprofundamento do fluxo de crédito negativo, ou seja, maior pagamento do que contratação de dívida por parte das pessoas físicas”, disse.

O QUE DIZEM OS ECONOMISTAS

Para Caio Megale, economista-chefe da XP, o comitê sugeriu na ata que a sua estratégia de conduzir um ciclo de altas rápido e firme vem funcionando ao trazer diversos elementos que reforçam a visão de que a atividade econômica está desacelerando gradualmente e que a inflação vem mostrando melhora, ainda que siga acima da meta.

Segundo ele, a ideia agora será observar os efeitos do ciclo executado e a “barra” para seguir aumentando juros ficou bastante elevada. “A ata se mostrou mais focada em evitar que o mercado passe a precificar cortes de juros do que propriamente em sugerir a possibilidade de novas altas”, disse.

Fabio Kanczuk, ex-diretor do BC e diretor de macroeconomia do ASA, avalia que o Copom não irá alterar o patamar de juros a menos que haja uma mudança muito brusca de cenário e prevê a Selic estacionada em 15% ao ano “por várias reuniões”.

A economista-chefe do banco Inter, Rafaela Vitoria, recorda que a Selic foi mantida no pico por longos períodos nos últimos ciclos de alta —15 meses entre 2015 e 2016 e 12 meses entre 2022 e 2023.

“Nesse ciclo, a política monetária está restritiva desde meados de 2022. Vamos para o quarto ano de taxa de juros acima do patamar neutro, sendo que o desvio atual da inflação para a meta não é tão significativo como havia sido nos ciclos anteriores”, disse.

Ela tem a expectativa de que a desaceleração do crédito e da atividade se intensifique no segundo semestre. Com isso, acredita que as discussões sobre a redução no nível de juros podem ter início no fim do ano. Mas vê o orçamento fiscal de 2026 como principal risco.

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