Disputa por indenização de R$ 342 milhões opõe Cedae e espólio de agricultor no Rio

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RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro) negocia com o espólio de um agricultor acordo de indenização que pode passar de R$ 340 milhões, em um processo que dura 46 anos.

Houve tentativa de acordo em maio, para firmar a dívida em R$ 267 milhões, mas uma denúncia anônima levou a Promotoria do Rio a questionar os cálculos da perícia judicial, e o Ministério Público pediu a impugnação do laudo em junho.

O caso começou em 1979, quando a companhia fez obras para desviar o curso do rio Sacarrão e duplicar a captação de água, em Vargem Grande. O agricultor Nelson Ramos de Almeida e Silva foi à Justiça alegando prejuízo em seu sítio.

Segundo o agricultor, já falecido, a obra reduziu o volume de água no rio Sacarrão, usado por ele para lavoura e pecuária.

Em nota, a Cedae afirmou que não faz mais uso do terreno e que a única intervenção foi para o desvio do curso do rio. “Não cabe mais qualquer discussão sobre a existência da responsabilidade da companhia, restando apenas a definição do valor da indenização”, diz a companhia em nota.

A companhia foi condenada em 1986, mas o valor da indenização foi alvo de questionamentos e jamais foi repassado. O caso chegou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), que manteve a determinação de uma perícia judicial para calcular o valor. A empresa não pode mais recorrer.

Nelson disse, à época, ter perdido 5.000 bananeiras, 500 laranjeiras e uma horta, além de criação animal, com peixes, 450 gansos, nove vacas, dois cavalos, 360 marrecos e 15 porcos. A plantação e a criação de animais eram para subsistência e comércio.

O agricultor também reclamou que, após a obra, o caminho usado para escoar os produtos de carro foi inutilizado. Vargem Grande era, à época, uma zona rural.

A condenação em 1986 se deu por uso de área particular para fins comerciais e pela falta de indenização aos prejudicados. A forma de liquidação da sentença tem sido debatida em processo desde então, com correções monetárias em três moedas diferentes até o real.

A 6ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro nomeou, neste ano, um perito para avaliar o prejuízo. Ele apontou um débito de R$ 342.627.351,43. O cálculo leva em consideração a desvalorização do imóvel, lucros cessantes, danos morais e honorários de advogados.

O valor equivale a cerca de 34% do lucro líquido da Cedae em 2024, de R$ 1,02 bilhão -mais que o dobro do registrado em 2023. O débito com o espólio representa ainda 55% do resultado operacional da Cedae em 2024, que foi de R$ 627,3 milhões.

Questionada sobre como planeja pagar a indenização a Cedae não respondeu até a publicação desse texto.

A Cedae era a responsável pelo serviço de distribuição de água e tratamento de esgoto no estado até 2021, quando houve a concessão do fornecimento de água. Sua atribuição atual é a produção de água.

A defesa da família afirma que o débito é ainda maior porque o cálculo que chegou a R$ 342 milhões não contaria os lucros do que a Cedae arrecadou com a expansão da zona oeste nos últimos 50 anos.

O bairro tinha 20.663 moradores em 2022, de acordo com prévia do Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A obra da companhia ampliou o fornecimento de água para outros bairros da região, a maior em crescimento populacional da cidade.

“A perícia ainda não contempla o lucro cessante da empresa por vender a água que era propriedade do cliente para a região das Vargens [Vargem Grande e Vargem Pequena] e Recreio dos Bandeirantes. Se a juíza acolher minha pretensão, o cálculo pode ser triplicado”, afirma o advogado Thiago Alvim Cabral, representante da família de Nelson.

Já o setor jurídico da companhia buscou defender que a perícia não deveria ter sido feita porque entende que o espólio não havia apresentado todos os documentos que viabilizam a liquidação. O TJ fluminense a o STJ (Superior Tribunal de Justiça), contudo, mantiveram a validade da perícia.

Em maio, os representantes do espólio marcaram reunião com a Cedae para debater um acordo, em paralelo ao processo. As partes aceitaram descontar 22% do débito original, chegando a R$ 267 milhões. Este valor seria dividido em um pagamento inicial de R$ 53,4 milhões e outras 12 parcelas de R$ 17,8 milhões.

O acordo foi encaminhado para aprovação da diretoria executiva da Cedae, mas o pedido de revisão do Ministério Público ao processo impediu a tentativa de negociação paralela, segundo as partes ouvidas pela reportagem.

“Toda a condução do caso tem se pautado pelo estrito cumprimento da legalidade, pela transparência institucional e pela defesa do interesse público”, diz a Cedae.

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