Inflação fica acima das projeções em junho e estoura meta contínua pela 1ª vez

Uma image de notas de 20 reais

Crédito: Bruno Peres/Agência Brasil

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), ficou em 0,24% em junho, acima da mediana das projeções do mercado financeiro, segundo dados divulgados nesta quinta-feira (10) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A taxa havia sido de 0,26% em maio.

Com o novo resultado, o IPCA acumulou alta de 5,35% nos 12 meses até junho, após marcar 5,32% na divulgação anterior. Assim, o índice confirmou o primeiro estouro da meta contínua de inflação desde que o novo modelo entrou em vigor no país, em janeiro de 2025.

O descumprimento do objetivo era aguardado por analistas. No modelo de meta contínua, o alvo é desobedecido quando o acumulado permanece por seis meses consecutivos de divulgação fora do intervalo de tolerância, que vai de 1,5% (piso) a 4,5% (teto). O centro é de 3%.

O IPCA ficou acima do teto de 4,5% nos seis primeiros meses de 2025. A situação obrigou o presidente do BC (Banco Central), Gabriel Galípolo, a escrever uma carta aberta para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, explicando os motivos do estouro.

Foi a segunda manifestação do tipo assinada por Galípolo. A primeira foi publicada após o estouro da meta no acumulado de 12 meses até dezembro de 2024.

Na nova carta, o BC prevê que a inflação voltará para baixo do teto a partir do fim do primeiro trimestre de 2026.

ALIMENTOS EM QUEDA, LUZ EM ALTA

Ao marcar 0,24% em junho, o IPCA veio acima da mediana de 0,20% esperada pelo mercado financeiro, conforme as projeções que haviam sido coletadas pela agência Bloomberg. A variação de 0,24% é a maior para o sexto mês do ano desde 2022 (0,67%).

Dos 9 grupos de bens e serviços pesquisados no IPCA, apenas 1 teve queda de preços em junho. Trata-se do segmento de alimentação e bebidas (-0,18%). O recuo ocorreu após nove meses consecutivos de alta.

A carestia dos alimentos havia gerado preocupação para o governo Lula (PT), sendo apontada como uma das principais razões para a baixa na aprovação do presidente no início deste ano.

O IBGE relacionou a redução dos preços em junho a uma oferta maior de produtos. A alimentação no domicílio saiu de leve avanço de 0,02% em maio para queda de 0,43% no mês passado.

Houve baixas nos preços do ovo de galinha (-6,58%), do arroz (-3,23%) e das frutas (-2,22%). Do lado das altas, o IBGE destacou o tomate (3,25%).

Em um movimento oposto ao de alimentação e bebidas, o grupo habitação teve aumento de 0,99% em junho. Foi a principal pressão do lado das altas no IPCA (0,15 ponto percentual).

O resultado de habitação está associado à energia elétrica residencial, que subiu 2,96% sob vigência da bandeira vermelha patamar 1. A conta de luz foi o subitem com o maior impacto individual no índice (0,12 ponto percentual).

Entre as quedas, além de alimentos como ovo (-6,58%) e arroz (-3,23%), produtos como perfume (-3,26%) e gasolina (-0,34%) também contribuíram para conter o IPCA.

META CONTÍNUA E JUROS

Até o final do ano passado, o BC se guiava pelo ano-calendário (janeiro a dezembro) para perseguir as metas de inflação.

Houve oito anos de descumprimento no modelo anterior desde 1999, quando esse regime foi implementado -em um deles (2017), a variação ficou abaixo do piso.

A mudança para o alvo contínuo, segundo o BC, está alinhada a experiências internacionais. A intenção é evitar que choques temporários possam causar o descumprimento do objetivo.

A meta baliza a condução da política monetária do BC. Com a alta dos preços, a instituição promoveu um ciclo de aumento na taxa básica de juros, a Selic, que chegou a 15% ao ano.

Esse aperto busca conter a inflação e, assim, ancorar as estimativas dos agentes financeiros.

O possível efeito colateral é a perda de ritmo do PIB (Produto Interno Bruto), já que o crédito fica mais caro para o consumo das famílias e o investimento das empresas.

Entre os nove grupos do IPCA, a maior alta (6,66%) e o principal impacto (1,44 ponto percentual) vieram de alimentação e bebidas no acumulado dos 12 meses até junho.

Ou seja, o segmento puxou o estouro da meta de inflação, apesar do alívio dos preços no último mês.

Na mediana, o mercado financeiro prevê IPCA de 5,18% no acumulado até dezembro de 2025, conforme a edição mais recente do boletim Focus, divulgada pelo BC na segunda (7).

A estimativa está em queda há seis semanas, mas segue distante do teto de 4,5%.

O economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, projeta que o acumulado do IPCA voltará para baixo do limite superior da meta em março de 2026.

Conforme Vale, a variação “não deve escapar muito” desse patamar ao longo do próximo ano. Ele prevê IPCA de 4,6% no acumulado de 2026.

Já a economista Claudia Moreno, do C6 Bank, espera que a inflação não volte a ficar abaixo de 4,5% até o fim do próximo ano.

Segundo ela, a trégua do dólar e a baixa dos preços de commodities trouxeram alívio temporário para o IPCA, mas a força do mercado de trabalho e da atividade econômica nos últimos anos tende a gerar novas pressões de demanda sobre os preços. Moreno prevê IPCA de 5% em 2025 e de 5,7% em 2026.

IBGE EVITA ‘ESPECULAÇÃO’ SOBRE EFEITOS DE TRUMP

Na quarta (9), setores da economia nacional foram surpreendidos pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que anunciou uma sobretaxa de 50% para os produtos importados do Brasil a partir de agosto.

Em entrevista, o gerente do IPCA, Fernando Gonçalves, foi questionado nesta quinta se a medida poderá reduzir os preços no mercado interno, caso ocorra uma ampliação da oferta dentro do país com menos embarques. O técnico do IBGE evitou traçar qualquer cenário.

“Foi uma surpresa para todo mundo. Temos de aguardar e ver as ações que o país [Brasil] vai tomar. No momento, qualquer coisa que se fale seria especulação.”

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