Invisibilidade do pequeno produtor na cadeia do agro desafia sustentabilidade

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A dificuldade de o pequeno agricultor aparecer na cadeia produtiva que abastece a mesa dos brasileiros é um obstáculo à sustentabilidade. Esse produtor, na prática, torna-se invisível em um processo ainda marcado por múltiplas etapas e intermediários.

O que o setor busca agora são iniciativas que possam unir tecnologia, crédito e conexão, para que seja possível mensurar impactos socioambientais e viabilizar acesso a sistemas financeiros no campo.

Essa abordagem marcou o segundo painel do seminário Agroindústria Sustentável, realizado pela Folha de S.Paulo na quarta-feira (23), com patrocínio do Banco do Nordeste e mediação do jornalista Bruno Blecher, especializado em agronegócio e meio ambiente.

Participaram da mesa Paulo Câmara, presidente do Banco do Nordeste, Priscilla Veras, emprendedora e fundadora da startup Muda Meu Mundo, e Evandro Holanda, gerente-geral de inovação, negócios e transferência de tecnologia da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).

No debate, Priscilla Veras apresentou a startup que tem como objetivo facilitar a inclusão formal do trabalhador rural.

Por meio de uma ferramenta via WhatsApp, integrada ao sistema da empresa, o produtor pode abrir conta bancária, acessar pedidos de clientes, emitir boletos e notas fiscais e também receber pagamentos, antecipação de recebíveis e créditos diretamente nessa conta.

“No contexto tecnológico, nossa preocupação foi a de ser simples para o produtor”, diz Veras. Segundo ela, a startup levou quatro anos até chegar ao modelo, buscando entender as necessidades do campo e facilitar negociações com indústrias e varejistas.

Hoje, com rastreabilidade e monitoramento de impactos socioambientais, a Muda Meu Mundo conecta diretamente produtores a diversos parceiros, como supermercados, que chegam a ter 25 mil fornecedores na base, e indústrias, com 6.000.

Com o volume de dados levantados nesse processo, a empresa desenvolve agora um algoritmo que avalia históricos, contratos e riscos para melhorar financiamentos.

“Imagine um agricultor cultivando tomate numa região inadequada. Se o algoritmo identificar isso com perguntas simples, podemos dar crédito mais assertivo”, afirma.

“Quando falamos de sustentabilidade, sempre olhamos para a parte ambiental. Mas se a sustentabilidade não partir da economia, ela acaba não fazendo sentido”, diz Veras.

Nesse caminho, instituições bancárias são peças-chave. Com mais de 70 anos de atuação, o Banco do Nordeste é, de acordo com o presidente Paulo Câmara, o maior investidor em microcrédito produtivo e orientado no país, voltado a empreendedores de renda baixa.

O banco, afirma Câmara, avançou nas políticas de microcrédito, tanto no meio urbano, com o programa Crediamigo, que investiu R$ 12 bilhões em 2024, quanto no Agroamigo, voltado à agricultura familiar, com mais de R$ 9 bilhões no mesmo ano.

Juntos, os dois programas atendem a um universo de cerca de 4 milhões de clientes.

A instituição também financia micro e pequenas empresas, além de grandes projetos na região. “O Nordeste tem crescido mais do que o Brasil nos últimos dois anos e meio, com geração de emprego, renda e condições para quem quer empreender”, diz o presidente.

Na mesma linha, Evandro Holanda, gerente-geral de inovação, negócios e transferência de tecnologia da Embrapa, destacou a importância de se reconhecer a diversidade sociocultural da região e adaptar soluções tecnológicas à realidade local.

Segundo ele, o Nordeste concentra metade dos agricultores familiares do país, com índices que variam de 75% a 85% nos estados, o que demanda modelos ajustados às condições sociais, econômicas e ambientais dos produtores em cada território.

O gerente-geral citou iniciativas como a Rota do Cordeiro, em Sobral (CE), que articula polos de produção de caprinos e ovinos a pequenas indústrias, e destacou o papel das compras públicas na dinamização comercial. “A região entre o Pajeú e o Cariri, hoje produz 80% do leite de cabra do Brasil. E antes produzia quase nada”, afirma.

“É nessa conjunção da casa de ciência, da política pública e dos atores de mercado que nós temos capacidade de gerar sustentabilidade”, diz o representante da Embrapa.

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