[AGÊNCIA DC NEWS]. Em sua terceira edição, o Indicador de Tendência de Consumo e Varejo (ITCV), de abril de 2025, feito pelo Centro de Excelência em Varejo da Fundação Getulio Vargas (FGVcev), continua a apontar para o mesmo problema: o patamar atual do IPCA, acima da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional. “É o grande dilema”, afirmaram os autores do documento. O estudo é preparado pelo economista e professor Ricardo Meirelles de Faria – colunista da Agência DC NEWS –, junto de Maurício Morgado, coordenador do FGVcev. Segundo eles, agrava o cenário o fato de que as expectativas de inflação para os próximos 18 e 24 meses continuam elevadas, forçando o Banco Central a manter taxas extremamente altas dos juros (14,25%). “Afetando assimetricamente empresas e também pessoas físicas.”
Um problema que impede o destravamento da economia e seu crescimento sustentado. Em 2024, o PIB fechou com elevação de 3,4% (R$ 11,7 trilhões), o Consumo das Famílias teve aceleração de 4,8%, o setor de Serviços fechou com crescimento de 3,7% e dentro dele o Comércio encerrou o ano com +4,7%. “Todo esse cenário seria realmente idílico, não fosse a pressão sobre o endividamento público e sobre os índices de preços, tanto os correntes quanto as expectativas inflacionárias à frente”, escreveu Meirelles. Segundo ele, o grande dilema da política econômica no Brasil é colocar as diversas variáveis econômicas em seus respectivos trilhos. “E duas variáveis estão sem dúvida fora dos trilhos: a taxa de inflação e o endividamento público.”
Nas projeções do ITCV de abril, o crescimento médio irá desacelerar, mas não desabar. Para este ano, a previsão para o Varejo Restrito é alta de 2,8% e para 2026, de 0,8%. Um pouco melhor do que no Varejo Ampliado (respectivamente +2,8% e -0,5%). Para o PIB, as altas seriam de 2,4% (2025) e 2,3% (2026) e no campo do Consumo das Famílias +4,0% (2025) e +3,4% (2026). Serviços e Comércio também teriam desempenhos mais tímidos em relação aos do ano passado. Em Serviços, +2,8% (2025) e +2,6% (2026) e para o Comércio +2,2% (2025) e +1,4% (2026). O Desemprego, que fechou em 6,2% no quarto trimestre de 2024 e em 6,6% na média anual, não se elevaria tanto este ano, chegando a 6,9%, mas já daria um pequeno salto no ano que vem, passando a 8,2%. Ainda assim, a Inadimplência (3,5% em 2024) não acompanharia o ritmo e ficaria mantida em 3,7% este ano e no ano que vem.
VAREJO – O documento do FGVcev – que passa a ter apoio do grupo segurador-financeiro MDS FFC – tem 33 páginas e faz análises e projeções setor a setor. No Varejo Restrito, a expectativa é de uma freada de quase 2 pontos porcentuais (4,7% em 2024 para 2,8% este ano). “É importante relembrar que os efeitos das ações de política monetária têm seu impacto máximo entre seis e nove meses após a decisão”, afirmou Meirelles. “Nesse sentido, os próximos meses já estarão espelhando o aumento forte no custo do crédito.” No caso do Varejo Ampliado (que inclui os segmentos do Varejo Restrito + vendas de veículos, motos, partes & peças e vendas de material de construção) a situação será um pouco pior. Depois da escalada de sair de -0,6% (2022) para crescimentos de 2,3% (2023) e 4,1% (2024), este ano será de uma desacelerada. “Material de construção e automóveis, motos, partes & peças irão enfrentar um ambiente macroeconômico menos amigável em 2025”, disse Meirelles. Por isso a projeção é de alta de 1,8% este ano e queda de 0,5% para o ano que vem. Veja a seguir as projeções para cada setor e outros indicadores macroeconômicos e de contas nacionais.
Artigos farmacêuticos & afins
Bens essenciais e impactados positivamente com a forte alteração na pirâmide etária brasileira, na média dos últimos 21 anos o segmento que representa aproximadamente 9,33% das vendas do comércio varejista restrito, ou R$ 382 bilhões, em termos anuais, teve crescimento médio anual de 7,53%.
Fechamento 2024: +14,20%
Projeção 2025: +9,65%
Projeção 2026: +5,60%
Combustíveis e lubrificantes
A grande notícia do setor de combustíveis e lubrificantes deste início de ano é o anúncio pelo governo da ampliação da mistura do etanol anidro na gasolina de 27% para 30%. “A medida tem efeitos benéficos para a economia ao aumentar o consumo, e consequente produção, de um produto genuinamente brasileiro e comprovadamente menos poluente que a gasolina”, afirmou Meirelles. Em termos de performance de vendas do setor, as estimativas são de quedas levemente menores do que as do ano passado.
Fechamento 2024: -1,60%
Projeção 2025: -1,15%
Projeção 2026: -0,80%
Equipamentos e materiais de escritório, informática e comunicação
O setor fechou 2024 com crescimento de 0,7%, pior desempenho desde 2021, e deve apresentar retração este ano e em 2026. Ele representa aproximadamente 1,43% na composição do Varejo Restrito (R$ 58,6 bilhões em termos anuais). “Projetamos um cenário mais desafiador em termos de custo do crédito.”
Fechamento 2024: +0,70%
Projeção 2025: -0,53%
Projeção 2026: -0,57%
Hiper e supermercados, alimentos, bebidas e fumo
“Mantemos nossa expectativa de que o setor sofra um arrefecimento em sua taxa de crescimento”, afirmou Meirelles. O segmento tem peso de aproximadamente 54% na composição do Varejo Restrito e 32% na estrutura do Varejo Ampliado. “Ou seja, é o maior em ambos os indicadores e duas vezes maior que o segmento de veículos, motos, partes & peças. Em razão disso, é ele quem define o ritmo e a direção do setor varejista.” Para ele, além da redução do impulso fiscal e a contenção do crédito, o setor experimenta o impacto da redução do poder de compra das famílias “em razão da elevação dos preços dos alimentos, o maior componente do seu portfólio de vendas”.
Fechamento 2024: +4,60%
Projeção 2025: +1,36%
Projeção 2026: -0,36%
Livros, jornais, revistas e papelaria
Se há um segmento em queda livre, é este. O segmento cresceu em média, de dezembro de 2004 a dezembro de 2014, 5,18% em termos anuais. E de dezembro de 2014 até janeiro de 2025, apresenta queda média anual de 11%. “Tudo somado, representa hoje a metade do volume de 20 anos atrás, aproximadamente 0,33% das vendas do Varejo Restrito (R$ 13,6 bilhões anuais”.
Fechamento 2024: -7,70%
Projeção 2025: -5,50%
Projeção 2026: -8,03%
Móveis e eletrodomésticos
O setor teve crescimento forte na primeira década e meia do século. Entre dezembro de 2001 e dezembro de 2014, cresceu em média 10,3% ao ano. e estagna a partir de então. De janeiro de 2015 até janeiro de 2025, houve queda de 1,42% ao ano, na média, apesar do forte crescimento de 2024.
Fechamento 2024: +4,10%
Projeção 2025: +2,30%
Projeção 2026: -1,44%
Tecidos, vestuário e calçados
Com faturamento estimado em R$ 256 bilhões, a média de crescimento do setor, ao longo de toda a série iniciada em janeiro de 2000, é de 0,77% ao ano –18% nos últimos 25 anos, abaixo do crescimento populacional estimado ao longo desse período (22%). “O atual patamar de vendas se equipara àquele de agosto de 2006”, afirmou Meirelles.
Fechamento 2024: +2,90%
Projeção 2025: -1,37%
Projeção 2026: -2,49%
Outros artigos de uso pessoal e doméstico
Apesar do nome genérico, representa 9,68% da composição do Varejo Restrito, só atrás de Hiper e Supermercados, Produtos Alimentícios, Bebidas e Fumos e do setor de Combustíveis e Lubrificantes. Um faturamento anual estimado de R$ 400 bilhões, com valores de outubro de 2024.
Fechamento 2024: +7,10%
Projeção 2025: +5,35%
Projeção 2026: -1,17%
Veículos, motos, partes & peças
O setor, que integra o Varejo Ampliado, fechou o ano em alta de 11,6%. No segmento de veículos e comerciais leves foram vendidos, em 2024, 2,487 milhões de unidades, crescimento de 14,1% em relação a 2023. Por sua vez, o ritmo de crescimento do primeiro bimestre de 2025, com 334,1 mil emplacamentos, em comparação com o mesmo período de 2024, 307,8 mil, foi de 8,56%, “o que já mostra uma tendência de arrefecimento na produção, vendas e emplacamentos em função do forte encarecimento no custo do crédito”.
Fechamento 2024: +11,60%
Projeção 2025: +2,23%
Projeção 2026: -1,59%
Material de construção
Depois de dois anos de quedas (-8,7% em 2022 e -1,8% em 2023), houve forte alta em 2024 (+4,8%). Segmento que representa aproximadamente 8% da composição do Varejo Ampliado, segundo o IBGE, o setor se beneficia fortemente da renda adicional temporária. Nesse sentido, as condições macroeconômicas de 2024 foram perfeitas: renda e crédito fartos, desemprego com recorde de baixa. “Para 2025, a conjuntura começa a mudar.”
Fechamento 2024: +4,80%
Projeção 2025: +2,85%
Projeção 2026: -0,40%
Indicador de Tendência de Consumo (ITC)
Meirelles explica que o ITC-FGVcev busca sintetizar a trajetória de crescimento do segmento do varejo através de uma média ponderada das principais variáveis macroeconômicas que influenciam o setor – evolução da massa de renda das famílias, crédito à pessoa física (deflacionado pelo IPCA), confiança dos consumidores (indicador produzido pelo FGV-Ibre) e, por fim, pelo nível de endividamento das famílias. “A composição dessas quatro variáveis representa bem o motor propulsor das vendas do varejo”, afirmou. “E nossos modelos econométricos projetam crescimento do ITCcev para 2025 da ordem de 3,03%, ligeiramente acima dos 2,8% de crescimento esperado para o Varejo Restrito.” Para 2026, estima-se crescimento de 2,67% para o ITCcev e de 0,8% do Varejo Restrito.
ITC. Desemprego-Renda
O trimestre encerrado em novembro de 2024 foi o bottom line, quando a taxa de desemprego fechou com seu recorde de baixa de 6,1%. O ano acabou fechando em 6,2%, já mostrando uma reversão do piso. E na última divulgação, do trimestre encerrado em fevereiro de 2025, a taxa ficou em 6,8%. “Estimamos uma taxa de 6,95% para o final de 2025.” Para o final de 2026, a estimativa é de que a taxa suba ainda mais, para um patamar próximo de 8,24%. Em termos de renda, a projeção é de que a massa mensal ao longo de 2025 tenha crescimento de 3,88%, redução pela metade do ritmo de 2024, e que em 2026 haja queda de 4,4%.
ITC. Crédito
Em termos reais – deflacionado pelo IPCA – houve expansão expressiva ao longo dos últimos cinco anos, representando um acréscimo de mais de R$ 1 trilhão em valores de agosto de 2024, representando 5 pontos porcentuais do PIB, chegando a 33%. A política monetária em 2025 está sendo bastante restritiva. “A pergunta que fazemos é de qual será o nível de inércia para o início de um resfriamento mais forte no oferecimento do crédito pelas instituições financeiras”, disse Meirelles. O crédito deflacionado fechou o ano passado com crescimento de 7,3%. Para 2025, a projeção é de alta de 9,18%. Para 2026, estimativa de 6,44%. No segmento do crédito à pessoa física, a projeção para o crescimento nominal (não deflacionado) é de 11,53% para 2025 e 13,07% para 2026.
ITC. Confiança do Consumidor
Em fevereiro de 2025, o índice medido pelo FGV-Ibre apresentou queda de 14% em relação a novembro passado, um trimestre de distância. “É bastante coisa!”, afirmou Meirelles. Queda trimestral dessa magnitude só ocorreu em março de 2021 e durante os primeiros meses de pandemia. “O cenário atual pode não ser considerado uma grande ressaca, mas sem sombra de dúvidas, um ajuste de rota.”
ITC. Endividamento-Inadimplência
Meireles faz duas perguntas. A primeira: quais seriam as implicações macroeconômicas e setoriais quando o nível de Endividamento sai de 25% para quase 50% da renda nacional disponível bruta das famílias (RNDBF) ao longo dos primeiros 20 anos do século 21? A segunda: qual o impacto sobre o setor varejista? O Endividamento das famílias em relação à renda acumulada dos últimos 12 meses (RNDBF) fechou o ano de 2024 em 48,3%. “Nossos modelos econométricos projetam 48,7% (2025) e 47,7% (2026).” Em relação ao Custo do Crédito, a estimativa é de elevação de 33,1% (no final de 2024) para 34,7% (final de 2025) para a carteira a clientes do setor privado, retomando para 33,6% (final de 2026). O impacto na Inadimplência parece estacionado entre 3,5% e 4% ao longo dos últimos dez anos. Fechou o ano de 2024 em 3,5% e deve fechar em 3,71% (2025) e 3,68% (2026).
Contas Nacionais. PIB
No estudo da FGV, Meirelles joga luz para a Formação Bruta de Capital Fixo, que fechou o ano em 17% do PIB. “Ainda pouco para uma economia que quer buscar um crescimento robusto e persistente no médio e longo prazo.” Para os dois próximos anos, a estimava é de crescimento do PIB de 2,37% (2025) e 2,29% (2026).
Contas Nacionais. Consumo das Famílias
O consumo das famílias fechou o ano com crescimento de 4,8% em comparação com crescimento de 3,2% em 2023. Houve forte volume dos auxílios assistenciais, oferta do crédito ainda bastante grande e consequente crescimento do agregado da renda das famílias, além de uma taxa de desocupação que fechou o ano em patamar recorde 6,2%. “Nossas primeiras projeções são de um pouso suave em 2025, com um ritmo de crescimento ainda bastante bom, de 4,0%.” Para o ano que vem, as estimativas são de um crescimento de 3,44%.
Contas Nacionais. Consumo do Governo
Em termos de crescimento no acumulado em quatro trimestres, o ritmo caiu de 3,8%, no primeiro trimestre de 2024, para 1,9%, no fechamento do ano. “Nossas estimativas são de que fecharemos o ano corrente com crescimento de 1,5% e, em 2026, ligeiramente menor: 1,44%.”
Contas Nacionais. Comércio & Serviços
O indicador de Comércio, segmento dentro do setor de Serviços das Contas Nacionais, fechou o ano de 2024 com crescimento de 3,8%, depois de dois anos fracos em 2022 (-0,9%) e 2023 (-0,8%). Para 2025, a projeção é de crescimento de 2,2%. Para 2026, de 1,42%. “Por sua vez, o setor de Serviços, mantendo sua participação de 59,3% em relação ao PIB ao final de 2024, deve crescer 2,8% neste ano e 2,6% em 2026”, afirmou Meirelles. “Ritmo de crescimento próximo daquele dos primeiros 15 anos do século.”