Limbo de códigos e regras comerciais desorienta exportadores no pós-tarifaço

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As diferenças de códigos e regras das operações de comércio exterior entre Brasil e Estados Unidos vêm causando uma confusão generalizada entre os exportadores, trazendo a incerteza como um desafio adicional ao tarifaço que entrou em vigor na última quarta-feira (6).

Muitas empresas recorrem a escritórios de advocacia, consultorias especializadas e despachantes aduaneiros americanos para entender o básico: se os seus produtos estão ou não isentos da tarifa de 50% imposta pelo presidente americano, Donald Trump.

Mas a resposta não é tão simples. Há muitos casos em que as descrições de produtos do sistema americano de classificação de comércio exterior, a Tabela Tarifária Harmonizada dos Estados Unidos (HTSUS, na sigla em inglês), não conversam com a do Brasil, que adota a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM).

Enquanto o código americano possui um nível de detalhamento de dez dígitos para classificar diferentes produtos, os números da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) apontam para no máximo oito dígitos, o que vem gerando inúmeras dúvidas entre as empresas. Apenas os seis primeiros dígitos dos dois sistemas são compatíveis.

Outro questionamento comum é se um produto que foi isento pelo ato executivo de Trump, que instituiu as tarifas no dia 30 de julho, é do capítulo inteiro de classificação comercial (que em geral abarca segmentos inteiros, sem tanto detalhamento) ou apenas um item específico.

“Há uma grande incompreensão de quais códigos NCM ou HTSUS se aplicam”, aponta Gabriel Rodriguez, despachante aduaneiro americano e presidente da empresa A Customs Brokerage, especializada em nacionalização de mercadorias nos EUA.

Desde abril, na primeira rodada de tarifas recíprocas de Trump, Rodriguez se dedica a consultorias sobre as sobretaxas. “Meu trabalho mudou bastante, de tocar minha empresa como um agente aduaneiro para passar a maior parte do meu dia fazendo consultorias a clientes sobre os efeitos das tarifas”, conta ele, que nesta semana realizou uma palestra para tirar dúvidas do setor de rochas ornamentais.

O problema não atinge apenas as exportações diretas para os Estados Unidos. Muitas vezes a descrição dos produtos incluídos no ato executivo que instituiu o tarifaço em 30 de julho não é a mesma dos decretos das sobretaxas aplicadas por Trump a outros países.

Essa é uma questão relevante para os exportadores que vendem produtos a países terceiros, que posteriormente são exportados aos EUA, na chamada triangulação.

“Em muitos casos, não é possível saber se há ou não isenção”, diz Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio do escritório Barral Parente Pinheiro Advogados. “Muitas vezes a descrição de um produto que está no ato executivo do Brasil é diferente da de outros atos executivos para impor tarifas, como da União Europeia ou Canadá, por exemplo, o que traz insegurança.”

Ele afirma que muitas empresas que exportam para o México para depois comercializar seus produtos com os EUA estão no limbo, já que algumas descrições dos itens que estão isentos ou taxados também não batem com as do acordo comercial entre Estados Unidos, México e Canadá (USMCA, na sigla em inglês).

“A principal dificuldade das empresas vem sendo determinar se estão ou não enquadradas nas exceções”, afirma Marcelo Guaranys, sócio da área de investigações corporativas do escritório de advocacia Demarest.

Ele relata que o ambiente é de incerteza nos negócios, com muitos clientes em dúvida sobre o real alcance do tarifaço. Essa dificuldade leva a situações em que o importador prefere não realizar a aquisição até ter certeza da tarifa que irá pagar.

“Tivemos o caso de um produto de grande valor, um meio de transporte, que o comprador decidiu que só vai adquirir quando tiver certeza do quanto vai pagar de tarifa”, afirma. “Esse é um caso de uma pessoa vendendo um veículo. Imagine tomar uma decisão sobre a produção mensal que será exportada sem ter certeza sobre que tarifa irá pagar.”

De acordo com ele, outro questionamento recorrente é sobre se produtos já investigados dentro da seção 301 -processo legal americano que permite tarifas em caso de ameaça ao comércio dos EUA- também são sujeitos aos 50%.

Essa investigação teve início em 15 de julho, quando os EUA anunciaram que avaliarão as práticas brasileiras em áreas como comércio eletrônico e tecnologia, taxas de importação e desmatamento.

“A investigação aberta pela seção 301 é muito ampla, e há muitas dúvidas sobre quais produtos estão incluídos”, afirma Guaranys. “Temos aconselhado os clientes a participarem das audiências públicas da investigação”, diz ele, que afirma que o escritório está recorrendo a parceiros internacionais para tirar dúvidas.

Nesse cenário de confusão sobre quais produtos se enquadram em quais códigos, muitas vezes é necessário buscar a jurisprudência americana ou então entrar com um processo administrativo para esclarecer dúvidas junto ao órgão que regula a alfândega e proteção de fronteiras nos EUA (Customs and Border Protection, na sigla em inglês).

“O exportador para os Estados Unidos ou o importador americano deve consultar especialistas. Pode ainda olhar o site Cross, da alfândega americana para checar decisões anteriores”, aconselha Rodriguez.

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