[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
Após dois anos de retração nas vendas externas – queda de 4,5%, de US$ 6,6 bilhões em 2022 para US$ 6,3 bilhões em 2024 – o Chile aposta em uma nova lei de aquicultura para destravar o crescimento de sua principal proteína exportada e ampliar as vendas de salmão ao Brasil, destino de 99,7% do produto consumido no país, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic). O peixe representa 6% das exportações chilenas, mas enfrenta entraves regulatórios que dificultam a modernização das concessões de cultivo, concedidas há mais de 30 anos. A proposta é atualizar regras e incorporar avanços tecnológicos para aumentar a competitividade e garantir sustentabilidade ambiental. “Há um consenso de que a criação de salmão é estratégica para o Chile”, disse Loreto Seguel, presidente-executiva do Consejo del Salmón do Chile.
À AGÊNCIA DC NEWS a executiva afirmou que a busca por alterações legais deve continuar no próximo ano, após as eleições presidenciais que acontecem no dia 16 de novembro. Com essa perspectiva, segundo Seguel, os próximos anos são promissores. “A expectativa é continuar fornecendo e construindo relacionamentos mais fortes, inclusive com o Brasil.” Parte desse otimismo vem da organização da indústria de salmão, que busca unir o turismo à aquicultura. A ideia é criar uma aliança virtuosa e promocional, que gera uma sinergia maior entre o Brasil e o Chile. “Não só pela venda do salmão, mas também por esse intercâmbio turístico”, disse. “Esse intercâmbio também traz muitos chilenos para o Brasil no verão.”
Ainda que o setor avance no Chile, as coisas estão se desenvolvendo, em solo brasileiro o peixe chileno enfrenta também empecilhos. No ano passado, o salmão foi retirado da cesta básica proposta para a Reforma Tributária de produtos que têm imposto zero. O primeiro posicionamento foi de aplicar na carne 100% do imposto IVA, ou seja, 28% do valor total do produto. Depois de negociações, o peixe passou a integrar o regime especial, com tributação reduzida a 11% , em torno de 60% do valor integral que seria aplicado inicialmente. Sobre o tema, Seguel diz que o Consejo del Salmón segue em diálogo com as autoridades brasileiras. “Nosso trabalho com as autoridades brasileiras é garantir que o salmão desfrute das mesmas condições de antes”, afirmou. Hoje, o salmão chileno, em função do acordo do Mercosul entra no Brasil sem taxa de importação, com a incidência de impostos variando de estado para estado. Confira a entrevista completa.
AGÊNCIA DC NEWS – As exportações de salmão chileno caíram 3% nos últimos dois anos, em valor exportado. O que causou essa redução?
LORETO SEGUEL – Esses 3% são um desafio político. Temos uma política de Estado, uma política de Estado que, no momento, não permite que a salmonicultura continue crescendo. Até isso acontecer, teremos números como esse. Talvez possamos crescer um pouco em preço, mas em termos de toneladas, permanecemos quase estagnados.
AGÊNCIA DC NEWS – O que são esses problemas?
LORETO SEGUEL – As concessões para a produção de salmão no Chile foram, na maioria, concedidas há 30 anos. Não havia a tecnologia, inovação ou a conectividade que a internet ou mesmo a inteligência artificial nos proporcionam hoje. Portanto, hoje temos muito mais informações do que tínhamos lá atrás. Agora temos informações que nos permitem saber que, talvez, tenhamos que nos mudar de onde estamos e ir para outros lugares ou fazer pequenas mudanças que permitam que essa concessão seja muito melhor para a produção.
AGÊNCIA DC NEWS – Que mudanças?
LORETO SEGUEL – Da orientação. Mudanças para ter melhores correntes, um fundo marinho melhor, mais ventilação e gerar menos impacto. E isso é uma situação vantajosa para todos. Para a criação de salmão, para a biodiversidade, para o país e para o mundo. Portanto, precisamos atualizar nossas concessões e é por isso que estamos trabalhando e solicitamos uma nova lei de aquicultura.
Loreto Seguel, presidente-executiva do Consejo del Salmón do Chile
AGÊNCIA DC NEWS – Qual a ideia dessa nova lei?
LORETO SEGUEL – Ela deve ser mais moderna, mais flexível e que reconheça os avanços tecnológicos que temos no mundo hoje. Antes, não tínhamos celulares e hoje temos celulares, satélites, cartografia e oceanografia mais avançadas. Portanto, hoje podemos ter melhores concessões para a produção de salmão do que há 30 anos e esse é o grande desafio no Chile. A ideia é ter uma nova lei, para realocação e processos legislativos mais adequados que permitam maior competitividade e produtividade, além da continuidade da produção.
AGÊNCIA DC NEWS – E com as eleições do Chile no final do ano, isso pode acontecer?
LORETO SEGUEL – Acho que há uma notícia muito boa. Em geral, todos os candidatos, independentemente de sua filiação política ou partido, estão falando sobre a importância da criação de salmão no Chile. Há um consenso de que a criação de salmão no Chile é importante e que deve ser desenvolvida. Tem sido muito importante para o sul do Chile e também é muito importante para a segurança alimentar global. Portanto, estamos muito otimistas de que, quem quer que seja o presidente do Chile, assumirá essa política de Estado e poderemos continuar desenvolvendo a aquicultura chilena. Porque hoje vendemos muito salmão para o mundo, mas estamos estagnados e temos o desafio de destravar isso, para poder crescer novamente.
AGÊNCIA DC NEWS – Enquanto a nova lei não chega, quais são os outros meios para destravar o mercado de salmão chileno?
LORETO SEGUEL – Estamos gerando um acordo nacional que nos permitirá dialogar com os mundos político, público, privado e ambiental. Isso nos permitirá continuar projetando o que tem sido uma das indústrias de maior sucesso no Chile nos últimos tempos.
AGÊNCIA DC NEWS – E como o Brasil entra no jogo?
LORETO SEGUEL – O Brasil é um país significativo para o salmão chileno. Acredito que as relações bilaterais com o Brasil são muito importantes. Do salmão que chega ao Brasil, 99% é chileno [segundo o Mdic, são 99,7%]. E também há um intercâmbio turístico muito significativo do Brasil para o Chile. Eu diria que somos dois países unidos por muitos laços e, para nós, o salmão no Brasil é relevante. E isso explica por que o foco tem sido frequentemente o Brasil em vez de outros mercados.
AGÊNCIA DC NEWS – Pode dar detalhes dos porquês desse foco no Brasil?
LORETO SEGUEL – Somos mais próximos, compartilhamos culturas e temos uma visão bastante semelhante das coisas. Então, eu diria que o crescimento no Brasil é muito importante. O ano passado e o primeiro semestre de 2025 também nos indicam bons resultados no Brasil. Esta é uma notícia muito boa e nos incentiva a continuar trabalhando arduamente com vocês.
AGÊNCIA DC NEWS – E por que esse aumento no Brasil enquanto as exportações no mundo caíram?
LORETO SEGUEL – O que aconteceu é que as empresas chilenas de criação de salmão privilegiaram certos mercados. E o Brasil é um desses mercados. É o segundo mais importante, com o Japão. Trata-se de uma questão de dar importância estratégica ao mercado brasileiro, mas o objetivo do Consejo del Salmón é ampliar a produção para atender tanto o Brasil quanto outros destinos, sem precisar optar entre uns e outros.
AGÊNCIA DC NEWS – E há um plano para recuperar o valor das exportações?
LORETO SEGUEL – As exportações mantiveram o volume, apesar do valor exportado estar mais baixo. Mas eu diria que o principal influenciador foi a espécie de salmão.
AGÊNCIA DC NEWS – Como a espécie de salmão influencia o valor das exportações?
LORETO SEGUEL – Existem duas espécies de salmão. O Atlântico, que no Brasil, e o Cojo, que aumentou acentuadamente. O cojo é um salmão mais barato, por apresentar vantagens muito importantes. Ele adoece menos, leva menos tempo para ser produzido no mar e, por isso, está crescendo. Mas é um salmão novo e os mercados estão começando a conhecer. Então eu diria haver uma questão de mudança de quais espécies estão sendo comercializadas, e também há uma questão de formato.
AGÊNCIA DC NEWS – Como, de formato?
LORETO SEGUEL – Seja inteiro, filé, congelado ou fresco, mas também está afetando o valor das exportações.
AGÊNCIA DC NEWS – E, no futuro, o país gostaria de direcionar mais salmão para o Brasil?
LORETO SEGUEL – Há dois meses, estivemos em Brasília e São Paulo, realizando reuniões bilaterais com os sindicatos Abrasel, Abrapés e Abipesca, entendidades que mantêm relação direta com o salmão chileno no Brasil. Estamos começando a gerar, em coordenação com a embaixada chilena, o embaixador, os adidos agrícolas e a PROChile, uma estratégia de trabalho conjunta. Estamos construindo relacionamentos não só com a embaixada, mas com sindicatos e também gerando o maior conhecimento possível entre todos os cidadãos brasileiros sobre os benefícios do salmão chileno.
AGÊNCIA DC NEWS – Há um plano em curso para combinar a criação de salmão com o turismo na região dos lagos, no Chile. O Consejo del Salmón vê isso como positivo?
LORETO SEGUEL – Sabemos que o sul do Chile é uma atração turística. E a partir disso, queremos criar um relacionamento mais forte entre a criação de salmão e o turismo. Para os brasileiros, quando vêm ao Chile, queremos também que conheçam o país pelo seu salmão. Eu diria que é uma aliança virtuosa, promocional e que gera uma sinergia maior entre o Brasil e o Chile, não só pela venda do salmão, mas também por esse intercâmbio turístico, que também traz muitos chilenos para o Brasil no verão.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais são as expectativas para a indústria do salmão para o próximo ano?
Loreto Seguel – Bem, haverá um novo governo no próximo ano. É essencial trabalhar com a indústria desde o primeiro dia, quando o novo governo tomar posse. É crucial planejar e continuar gerando concessões. Também é crucial continuar posicionando o salmão chileno nos mercados. Hoje, somos um dos produtos mais diversificados do mercado chileno.
AGÊNCIA DC NEWS – E para o Brasil?
Loreto Seguel – Há uma expectativa de crescimento das exportações para o mundo e para o Brasil. As expectativas são altas, e o primeiro desafio é assumir a responsabilidade aqui no Chile de gerar espaço para o crescimento. A expectativa é continuar fornecendo e construindo relacionamentos mais fortes com os mercados, inclusive relacionamentos mais fortes com o Brasil.
AGÊNCIA DC NEWS – E há algum desafio no Brasil para o futuro?
Loreto Seguel – O salmão chileno foi retirado da cesta básica há alguns anos por uma nova lei. E isso significa que ele será afetado por novos impostos. Portanto, um dos desafios que enfrentamos em nosso trabalho com as autoridades brasileiras é garantir que o salmão desfrute das mesmas condições de antes, para não pagar esses novos impostos. Porque o salmão chileno é amplamente consumido por todos os cidadãos no Brasil. Não é algo exclusivo de poucos. É bastante difundido.
*O jornalista viajou ao Chile a convite do Consejo del Salmón do Chile.