Manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais na América Latina, diz Lula

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SANTA MARTA, COLÔMBIA (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que “velhas manobras retóricas” estão sendo usadas para justificar intervenções ilegais na América Latina, sem citar os Estados Unidos. A declaração foi dada neste domingo (9), na Colômbia, em discurso para uma plateia esvaziada de líderes na 4ª cúpula UE-Celac (União Europeia e da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos).

“A ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e do Caribe. Velhas manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais. Somos uma região de paz e queremos permanecer em paz. Democracias não combatem o crime violando o direito internacional”, afirmou Lula.

“A segurança é um dever do Estado e um direito humano fundamental. Não existe solução mágica para acabar com a criminalidade. É preciso reprimir o crime organizado e suas lideranças, estrangulando seu financiamento e rastreando e eliminando o tráfico de armas”, disse ainda o brasileiro, que chegou e deixou o evento sem falar com a imprensa.

O governo americano sob Donald Trump vem bombardeando embarcações nas águas da América do Sul nos últimos meses, sob a acusação de que atuam para grupos narcotraficantes da região (sem que existam provas disso). Ainda que apresentasse evidências das ações, a Casa Branca usa argumentação pouco clara à luz do direito internacional para justificar os ataques.

Já foram mortas ao menos 66 pessoas nestes ataques, que aconteceram no Caribe e no oceano Pacífico. A ação militar, que envolve o envio de navios para o Caribe e caças para Porto Rico, é vista como forma de pressionar ditador Nicolás Maduro a deixar o poder. Trump afirma que o venezuelano lidera uma rede de tráfico de drogas chamada Cartel de los Soles, cuja existência é contestada por especialistas.

O brasileiro foi um dos poucos nomes de peso a participar do encontro, prejudicado pelo temor de diversos países de entrarem na mira do presidente dos Estados Unidos —que, além da ação militar no Caribe, impôs sanções contra o presidente colombiano, Gustavo Petro, cujo visto foi cancelado após participar de protesto pró-Palestina em Nova York.

Sob críticas no Brasil por não ter relacionado mulheres entre nomes indicados para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) e pela baixa proporção feminina na liderança de ministérios, Lula voltou a defender que a próxima pessoa a ocupar a secretaria-geral da ONU seja uma mulher latino-americana. O atual secretário-geral, o português António Guterres, deixa o cargo no fim do ano.

O presidente brasileiro também reforçou propostas da presidência brasileira da COP30, como o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), e disse esperar que a União Europeia e o Mercosul assinem o acordo entre os dois blocos em dezembro, na próxima cúpula do Mercosul.

A viagem de Lula à Colômbia, anunciada de última hora, teve como objetivo marcar posição sobre a mobilização militar americana contra a Venezuela. Depois de passar menos de quatro horas em solo colombiano, o presidente embarca de volta ao Brasil às 15h (horário de Brasília), antes do final da cúpula —antecipado da segunda (10) para este domingo às 19h30.

Apesar do discurso de Lula, a fragmentação política da Celac (que reúne os 33 países latino-americanos e caribenhos) torna extremamente improvável que o grupo costure uma posição de consenso contra a campanha de pressão militar americana contra Maduro.

A Celac já enfrentou recentemente dificuldades para debater a concentração de forças militares dos Estados Unidos na região. No início de setembro, durante uma reunião virtual, os países da organização tentaram negociar um comunicado conjunto que expressava “profunda preocupação com o recente destacamento militar extrarregional” na América Latina e no Caribe.

O texto também afirmava que a América Latina é uma zona de paz, regida por princípios como a solução pacífica de controvérsias e a proibição de ameaças de uso da força. Não havia na redação debatida qualquer referência direta a Trump ou aos EUA, mas mesmo assim países como Argentina, Paraguai, El Salvador e Peru, entre outros, optaram por não assiná-la.

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