Ministro dos Transportes diz que lei do licenciamento é positiva para infraestrutura, mas pode ter ajustes

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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro dos Transportes, Renan Filho, comemorou a aprovação da Nova Lei do Licenciamento Ambiental pelo Congresso, devido à necessidade de acelerar a liberação de obras de infraestrutura, mas também admitiu que vê espaço para eventuais vetos pelo presidente Lula.

Um dos possíveis vetos, segundo ele, poderia ser a autodeclaração de licenciamento, que passou a ser prevista pelo texto da lei. “A proposta pode ser organizada, para que a autodeclaração seja liberada apenas para situações de baixíssimo impacto”, disse Renan Filho em entrevista ao C-Level, videocast semanal da Folha de S.Paulo.

O ministro afirmou ainda que as ameaças tarifárias impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não terão impacto sobre os investimentos e concessões na área de infraestrutura no Brasil. O chefe da pasta de Transportes disse que, até o fim do ano, será feito o primeiro leilão de uma nova ferrovia pelo governo Lula.

Os investimentos atuais em infraestrutura, segundo o ministro, chegaram a volume recorde neste ano. O efeito político desses resultados, porém, já não tem a força que tinham no passado. “Você pensa, ‘se o investimento hoje é maior, deveríamos estar com uma aprovação maior hoje’, mas o mundo mudou muito, não é mais como antes. É um mundo muito mais dividido e polarizado”.

PERGUNTA – As concessões de rodovias enfrentam desafios para atrair investidores por causa de vários fatores, incluindo os altos juros. Como reagir a isso?

RENAN FILHO – Eu concordo que juros de curto prazo, às vezes, afugentam o investimento. Elevar juro tem esse objetivo de reduzir o investimento para controlar preços e trazer a inflação de volta para a meta. Entretanto, diversamente, nós estamos vivendo o melhor momento de concessões da iniciativa privada da nossa história.

O Brasil tem a maior carteira de projetos de concessão rodoviária do mundo. O governo Bolsonaro fez seis concessões rodoviárias em quatro anos. Nós já fizemos 15. Vamos terminar o ano com algo entre 24, talvez 25 concessões, para chegarmos ao final de 2026 com 35 novas concessões rodoviárias. Além disso, estamos resolvendo problemas de concessões do passado. O juro de longo prazo é determinado pela confiança na economia. Nossa carteira seguirá competitiva, porque o horizonte do investidor é 30 anos.

P. – O senhor considera positiva a política de juros em curso hoje no Banco Central, pelas mãos do presidente Gabriel Galípolo?

RF – É correta, porque o grande desafio de curto prazo da economia é a inflação, que cobra um preço de todo mundo, sobretudo do mais pobre. Não adianta crescer com a inflação crescente. Você precisa equilibrar as duas coisas.

Agora, o que é muito interessante é que, mesmo com juro a 15%, o país vai crescer 2,5% com inflação decrescente. No ano passado o país cresceu acima de 3%, no primeiro ano cresceu 3%. O presidente Lula entregará, nos quatro anos de governo, um crescimento entre 12% e 15% do PIB. Isso é muita coisa, com inflação controlada, menor na média anual do que no governo passado.

P. – Os contratos repactuados de concessões têm avançado com aval do TCU, mas os leilões simplificados não têm atraído novos participantes. Isso não é reempacotar contratos que descumpriram compromissos originais?

RF – Não, porque estamos abrindo a possibilidade para outros agentes do mercado concorrerem. A partir do dia 5 de agosto, vamos abrir um grande fórum em parceria com o TCU para melhorar ainda mais o sistema, para ouvir novamente o mercado e verificar como ampliar a competição.

Fizemos 15 leilões com 13 ganhadores diferentes, leilões com cinco participantes, quando antes, no outro governo, participavam dois. A alternativa à otimização dos contratos era obra parada. A gente criou um eufemismo neste país que era assim, “ah, está em relicitação”. Relicitação era obra parada. Nós estamos retomando essas obras.

P. – No caso das ferrovias, teremos algum leilão de ferrovia nova neste ano?

RN – Neste ano, teremos o leilão da Estrada de Ferro 118, que é o anel ferroviário do Sudeste brasileiro, que vai ligar a malha de Vitória-Minas até a malha da MRS, conectando os portos do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, especialmente o Porto do Açu.

Estamos trabalhando para conceder o corredor Fico-Fiol, que vai ligar o sul da Bahia ao coração do Mato Grosso, passando por Mara Rosa, em Goiás, e por Água Boa, chegando a Lucas do Rio Verde. Também queremos fazer a concessão de Açailândia, no Maranhão, até Barcarena, no Pará, para tirar o conflito da ferrovia de Carajás entre grãos e minério que passam pela Ferrovia Norte-Sul.

P. – O governo anterior aprovou a autorização ferroviária, mas praticamente nada aconteceu, com exceção de uma ferrovia no Mato Grosso. O que há de errado?

RN – Autorizar é fácil. Só que a autorização virou ferrovia de papel do governo Bolsonaro, que nunca teve compromisso com obra. Então, anunciava R$ 300 bilhões de ferrovias, fazia as autorizações, mas nada saia do papel.

P. – Por que deu errado?

RN – Porque, em todo o mundo, a autorização funciona para quem tem carga própria em short lines (linhas pequenas). Aqui no Brasil, eles autorizaram ferrovias estruturantes, que precisam de aporte do governo. É por isso que, na China, se constrói ferrovia com aporte do governo, na Índia, na Europa inteira, nos EUA.

No Brasil não é diferente. A gente precisa garantir aporte. Por isso, nós recuperamos o dinheiro dos contratos de renovação antecipada, que o governo passado renovou por mais 30 anos, cobrando nada. Nós corrigimos isso para reaver esse recurso. Estamos em máxima histórica de investimento em ferrovias e rodovias neste ano. E isso ocorre pelo crescimento do investimento privado.

P. – O setor de infraestrutura espera a nova lei do licenciamento ambiental. O Congresso aprovou um texto que a ala ambiental critica e cobra vetos do presidente Lula. Qual a sua avaliação?

RN – Eu sou a favor de uma parte, mas acho que o governo pode melhorar o que foi aprovado, com o presidente fazendo, eventualmente, uma discussão profunda e avaliando vetos pontuais.

P. – Quais vetos pontuais?

RN – A sociedade brasileira deseja duas coisas: licenciamento mais rápido e desenvolvimento sustentável. O projeto faz isso. Vi muitos lugares da imprensa dizendo que o Congresso discutiu o tema na calada da noite. Não foi isso. O assunto ficou em debate durante 20 anos. Alguém tomou a decisão de finalizar, levar ao plenário e votar.

O Congresso, com os defeitos e virtudes próprios de uma democracia, como têm os outros Poderes, está lá para representar as pessoas e deliberar sobre os temas. Acho que tem pontos positivos.

P. – É razoável que uma estrada que já foi pavimentada no passado tenha que passar pelo mesmo licenciamento de uma estrada 100% nova?

RN – Não. Agora, tem coisas que podem ser debatidas. Por exemplo, a questão da autodeclaração.

P. – O senhor é a favor de vetar a autodeclaração?

RN – A proposta pode ser organizada, para que a autodeclaração seja liberada apenas para situações de baixíssimo impacto. Tem várias maneiras de melhorar a proposta. O presidente vai verificar e vetar o que ele achar necessário. Poderia até usar uma medida provisória para complementar, fechar lacunas.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, acerta ao dizer que nós não seremos campeões de exportação se não dermos exemplo também de preservação. Mas isso não é uma coisa excludente com a necessidade de se fazer os investimentos que o Brasil precisa.

Portanto, há espaço para veto.

O projeto pode melhorar. Cabe ao governo agora se posicionar, e depois o Congresso avaliar com relação à manutenção ou à derrubada de vetos. É assim numa democracia. A lei é mutável.

P. – O aperto orçamentário tem afetado as operações de órgãos como Dnit e ANTT. Como fica essa situação agora, à luz do recente descontingenciamento?

RN – O desafio do governo é fazer mais com menos. Não vai dar para a gente ter orçamento crescente, porque temos um nível alto de carga tributária, mesmo sem aumento nesse governo. A ANTT teve corte. De onde veio o orçamento para garantir o mínimo funcionamento? Do meu ministério. Eu cortei do meu orçamento e mandei para ela. No ano passado, R$ 40 milhões, e este ano vou mandar R$ 30 milhões. No ambiente da infraestrutura, a gente tem muito espaço para avançar no investimento privado.

Como seu ministério vai se posicionar para conseguir espaço fiscal nesse descontingenciamento?

Historicamente, o Ministério dos Transportes sempre foi o mais contingenciado. Eu fiz uma apresentação ao governo, demonstrando que a gente é quem tem maior execução. Eu acho que agora, no desbloqueio, acontecerá o mesmo, em homenagem ao ministério que tem capacidade de executar o seu orçamento. Temos muitos investimentos, são mais de 2.000 obras.

Como as ameaças tarifárias do presidente americano Donald Trump mexem com os investimentos em infraestrutura no Brasil?

Eu acho que, de maneira geral, não prejudica, porque a balança comercial brasileira com os EUA representa 1,4% do nosso PIB. Ou seja, ela representa uma parcela pequena da nossa economia. A condução do Brasil tem sido correta. Primeiro, defender a nossa democracia. Na parte comercial, eu acho que a gente tem que ter diálogo máximo. Agora é intensificar o debate.

O presidente Lula teve queda de popularidade no começo do ano. Há sinais de recuperação, mas a leitura da população parece não refletir esses investimentos que o senhor está citando.

O mundo mudou, não é mais aquele. Veja que a gente está em máxima histórica de investimento em infraestrutura. Você pensa, “se o investimento hoje é maior, nós deveríamos estar com uma aprovação maior hoje”, mas o mundo está muito mais dividido e polarizado. O presidente Lula tem tentado ampliar o diálogo e alinhou um argumento forte no que concerne à defesa da justiça tributária. Acho que isso é relevante.

Raio-X | Renan Filho, 45

Murici (AL), 1981. Economista formado pela UnB (Universidade de Brasília), foi prefeito por duas vezes de Murici, além de deputado federal e, por duas vezes, governador de Alagoas. Em 2022, tornou-se senador por seu estado. Desde janeiro de 2023, deixou o posto para assumir o cargo de ministro dos Transportes do governo Lula.

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