SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A moda do “morango do amor” -sobremesa que viralizou nas redes com morangos cobertos por brigadeiro branco e calda de açúcar- não está apenas movimentando confeitarias. O estouro da tendência provocou um salto no preço do morango nas principais centrais de abastecimento do país, justo no momento em que a safra começa a ganhar volume.
Além disso, o sucesso da sobremesa da internet provocou a escassez do chamado “morangão”, variedade da fruta do tipo fondue, com tamanhos maiores e padronizados. Confeiteiras relatam dificuldade para encontrar as frutas maiores, que, por estética, são as preferidas dos clientes. Como alternativa, já há um morango do amor feito em formato de coração, com dois moranguinhos.
Na Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo), maior entreposto da América Latina, o preço da caixa com quatro bandejas do morango do tipo “fondue”, como morangos selecionados, chega a custar R$ 70.
Segundo Thiago de Oliveira, chefe da seção de economia da Ceagesp, a média foi de R$ 59, quase o dobro dos R$ 35 a R$ 37 registrados normalmente nesta época.
“Com essa força toda [na procura], é a primeira vez que eu vejo. Já aconteceu isso com outros produtos, de viralizar durante o fim de semana, mas costuma acabar na terça-feira. Essa tendência já dura mais”, diz Oliveira.
O pico de procura ocorreu entre os dias 24 e 26 de julho. De acordo com dados da Ceasa/MS (Centrais de Abastecimento de Mato Grosso do Sul), as vendas saltaram de 81 mil para mais de 128 mil bandejas em uma semana -alta de 57%. Uma única empresa da região vendeu cerca de 38 mil unidades em dois dias.
Em Santa Catarina, onde o morango vem de Minas Gerais nesta época do ano, o preço chegou a dobrar. “Saiu da faixa de R$ 28 a R$ 30 para R$ 50 ou R$ 60 a caixa com quatro bandejas”, informa a Ceasa/SC.
Apesar do susto, a alta nos valores está começando a ceder aos poucos. Segundo Oliveira, a curva de preços já vinha em queda, como é típico com o início da safra. No entanto, o preço, diz ele, “subiu forte e se estabilizou na alta”.
VENDEDORES RELATAM CORRIDA AO ATACADO E ESCASSEZ
Na Ceagesp, a movimentação tem sido atípica. “Costumava vender 200, 250 caixas por dia. Agora estou vendendo mil”, conta Ernando Bezerra, 32, vendedor no entreposto. O preço também dobrou: “Era R$ 15, R$ 20, agora é R$ 40.”
“A procura aumentou demais, principalmente pelo [tipo] fondue”, diz Manuel Oliveira, 43. Já Edson Rocha, 60, afirma que os preços chegaram a R$ 70 no pico: “O menorzinho é R$ 40, o normal é R$ 50, e o fondue chegou a R$ 70. Vem um monte de gente comprar, tudo ao mesmo tempo.”
Leonardo Lima, 48, afirma que os morangos grandes são os mais disputados. “Não estão comprando mais porque o preço subiu demais. Está R$ 45.”
Tati Ferreira, 40, vendedora, relata que até autônomos que nunca haviam trabalhado com confeitaria passaram a comprar. “Dá uns minutinhos e já acaba o estoque.”
E mesmo compradores avulsos estão indo em busca da compra no atacado. O motorista Ray da Cruz, 32, levou uma caixa para casa. “Lá onde eu moro está R$ 15 a bandejinha. Aqui saiu por R$ 35 a caixa com quatro. A criançada viu na internet e pediu.”
Em Campo Grande (MS), o pico das vendas coincidiu com o auge da tendência. Um vídeo da Ceasa local sobre a movimentação viralizou e já soma mais de 180 mil visualizações. A sobremesa é vendida entre R$ 10 e R$ 20 na capital. Segundo a central, parte do estoque encalhou nesta semana, indicando uma possível queda na procura.
ESTÉTICA E INSTAGRAM IMPULSIONAM MORANGO MAIOR
O morango do tipo fondue -vendido em bandejas com única camada de morangos grandes e padronizados– virou o queridinho das confeiteiras. “É esse que o povo olha. Esteticamente, para o Instagram, ele é ótimo”, afirma Oliveira.
Porém, em resposta ao encarecimento do “morangão”, algumas confeiteiras passaram a unir dois morangos menores para criar um formato de coração, alternativa que também viralizou.
A confeiteira Letícia Torres, 33, da região metropolitana de Belém (PA), adaptou-se à tendência. “A ideia do vídeo de unir dois morangos ajudou bastante, porque além do aumento [no preço] do produto, nos deparamos também com as frutas em um tamanho bem pequeno e muitas vezes já estragado dentro da bandeja, o que está dificultando nosso trabalho”, diz.
Ela e a irmã venderam 300 unidades em três dias na confeitaria Delícias da Leh, mesmo com a dificuldade de acesso ao produto –tiveram que viajar 40 km até Belém para buscar caixas a R$ 120, o dobro do que pagaram cinco dias antes.
A preferência por frutas maiores também tem raízes na própria evolução do morango. Segundo Juliano Rezende, coordenador da Rede de Morangos do Brasil e docente na UEL (Universidade Estadual de Londrina), a fruta costumava ser menor e menos “bonita”, mas passou por um processo de hibridização ao longo dos anos, tornando-se maior e visualmente mais atraente.
Ele ainda afirma que a busca pelos morangos maiores se intensifica no inverno, época em que aumentam as vendas de sobremesas quentes, como o fondue, e agora também de criações como o morango do amor.
A tendência, segundo ele, é que os preços tenham leve queda com o início da safra. O especialista explica ainda que os valores já estavam pressionados por outros fatores, como falta de mão de obra, frio mais intenso e a Guerra da Ucrânia, que afeta os fertilizantes.
Em São Paulo, os principais fornecedores do atacado são os produtores de Piedade, Atibaia, Jarinu e Jundiaí, além do sul de Minas. Segundo Oliveira, a região de Piedade é a mais expressiva no momento. Em Santa Catarina, a safra local já passou, e a fruta vem principalmente de Minas.