SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta sexta-feira (24) que considera “ilegal e irracional” a decisão de adiar o pagamento de dívidas judiciais do poder público, conhecidas como precatórios. “Prefiro ficar com a pecha de ter gastado mais do que ficar com a pecha de caloteiro”, disse durante o Seminário de Precatórios do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo).
Sem mencionar diretamente seu antecessor, Paulo Guedes, a declaração faz referência à aprovação pelo governo Jair Bolsonaro da PEC dos Precatórios, que em 2021 adiou o pagamento de dívidas judiciais da União para 2027, de modo a abrir espaço para outras despesas.
A fala de Haddad ocorre também no momento em que o governo é beneficiado por outra emenda constitucional recém-promulgada, que muda as regras para o pagamento dos precatórios e abre espaço para um gasto extra de R$ 12,4 bilhões em 2026, ano das eleições.
A medida, no entanto, é alvo de críticas de entidades jurídicas e de credores. A OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo) ingressou com uma ação de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal), afirmando que as novas regras representam uma nova moratória e comprometem a capacidade dos governos de honrar seus compromissos.
Segundo a entidade, o texto pode atrasar o pagamento até mesmo de quem aceitar acordos com deságio, ou seja, abrir mão de parte do valor a receber. Antes da mudança, o desconto máximo permitido era de 40%. Agora, não há mais limite, o que abre espaço para propostas de pagamento por valores simbólicos.
Outra mudança relevante está na correção monetária. Os valores, antes atualizados pela taxa Selic, passam a ser corrigidos pelo IPCA (inflação oficial) mais 2% de juros anuais. De acordo com simulações da Comissão Especial de Precatórios da OAB-SP, a alteração pode representar perda de até 30% no poder de compra dos créditos.
A OAB também destaca que 80% dos credores são alimentares, ou seja, idosos, pessoas com deficiência e pensionistas de baixa renda, e pede ao Supremo que suspenda os novos critérios de correção ou revise os prazos de pagamento.
A CNM (Confederação Nacional dos Municípios) defende a emenda, afirmando que a proposta ajuda a equacionar uma bomba fiscal enfrentada por estados e prefeituras. Um estudo do Fórum Nacional de Precatórios do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) mostra que, antes da mudança, 95% dos estados e municípios ficariam quites com seus precatórios até 2029.
Para a OAB, porém, as alterações tendem a ampliar o passivo ao permitir correções inferiores à própria inflação e à entrada contínua de novas dívidas judiciais.
Com o novo modelo, o governo federal retira as despesas de precatórios do teto de gastos, o que melhora a folga orçamentária em ano eleitoral, mas reacende o debate sobre o risco de calote institucionalizado o mesmo que Haddad, em sua fala, tentou afastar.
Após sua fala, o ministro foi homenageado pelo instituto, por sua contribuição ao cumprimento de pagamentos de precatórios. Quando prefeito de São Paulo, Haddad diminuiu a dívida de precatórios da capital.