SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A França classificou o acordo comercial entre os Estados Unidos e a União Europeia como um “dia sombrio” para a Europa, dizendo que o bloco cedeu ao presidente dos EUA, Donald Trump, com um acordo desequilibrado que impõe uma tarifa de 15% sobre os produtos da UE, ao mesmo tempo em que poupa as importações dos EUA de qualquer retaliação europeia imediata.
As críticas do primeiro-ministro da França, François Bayrou, foram feitas após meses de pedidos franceses para que os negociadores da UE adotassem uma postura mais dura contra Trump, ameaçando com medidas recíprocas -uma posição que contrastava com as abordagens mais conciliatórias da Alemanha e da Itália.
“É um dia sombrio quando uma aliança de povos livres, reunidos para afirmar seus valores comuns e defender seus interesses comuns, se resigna à submissão”, escreveu Bayrou no X (ex-Twitter) sobre o que ele chamou de “acordo Von der Leyen-Trump”.
O acordo também foi criticado pelo chefe do governo alemão, Friedrich Merz. Apesar de afirmar que o acordo “evita uma escalada inútil” nas tarifas no último domingo (27) e que não era possível obter melhor resultado, Merz disse que o tratado comercial trará “danos significativos” à economia alemã.
“Não estou satisfeito com este resultado, no sentido de que não acredito que seja algo bom”, afirmou.
A reação, principalmente, da França e o silêncio do presidente Emmanuel Macron desde que o acordo foi assinado entre Trump e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, contrastaram com a reações mais benignas, como, por exemplo, de Roma.
Os ministros do governo francês reconheceram que o acordo tinha alguns benefícios -incluindo isenções para setores como o de bebidas alcoólicas e o aeroespacial- mas disseram que ele continuava fundamentalmente desequilibrado.
“Esse estado de coisas não é satisfatório e não pode ser mantido”, disse o ministro francês de Assuntos Europeus, Benjamin Haddad, em X, pedindo que a UE ative seu chamado instrumento anti-coerção, que permitiria uma retaliação não tarifária.
Macron havia dito que a UE deveria responder da mesma forma se os Estados Unidos impusessem tarifas sobre os produtos da UE e aplicassem medidas equivalentes sobre as importações dos EUA para o bloco, em particular sobre serviços, nos quais os EUA têm um superávit com a UE.
Mas a linha mais branda defendida pela primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, cujo país é mais dependente do que a França das exportações para os EUA, prevaleceu. A princípio, a abordagem também foi adotada por Merz -os Estados Unidos são o principal parceiro comercial da Alemanha.
Meloni saudou o acordo comercial após ele ser revelado. “Uma escalada comercial entre a Europa e os Estados Unidos teria consequências imprevisíveis e potencialmente devastadoras”, comentou.
Nas demais capitais europeias, as reações também não foram unânimes. Nesta segunda-feira (28), o premiê da Espanha, Pedro Sánchez, expressou seu “apoio” ao acordo comercial, mas disse fazê-lo “sem nenhum entusiasmo”.
“Valorizo a atitude construtiva e negociadora que teve a presidente da Comissão Europeia e, em todo caso, apoio este acordo comercial, mas o faço sem nenhum entusiasmo”, explicou Sánchez durante coletiva de imprensa em Madri.
O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, afirmou que o acordo alcançado pela UE foi “pior” do que o alcançado pelo Reino Unido.
“Não foi Trump quem fez um acordo com Ursula von der Leyen, mas sim Trump que ‘jantou’ Ursula von der Leyen”, declarou o líder húngaro ultraconservador.
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, classificou o acordo como um “golpe muito duro” para a indústria europeia.
“Essa abordagem levará a uma maior desindustrialização da Europa, a um fluxo de investimentos da Europa para os Estados Unidos e, claro, será um golpe muito duro”, disse ele.
Entre o empresariado europeu, o influente setor automotivo europeu, que enfrenta uma crise e seria severamente atingido por uma guerra comercial, enfatizou que o acordo representa uma desescalada bem-vinda.
A indústria química alemã, por outro lado, lamentou que as tarifas acordadas ainda sejam “muito altas”.
Enquanto isso, o principal núcleo empresarial da França observou que o acordo “ilustra a dificuldade que a UE ainda tem em afirmar o poder de sua economia e a importância de seu mercado interno”.
Para o analista Alberto Rizzi, do think tank Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), o acordo “parece um pouco com uma rendição”.
Em resposta às críticas, o principal negociador da UE, o comissário europeu para o Comércio, Maros Sefcovic, afirmou nesta segunda que estava “100% certo de que este acordo é melhor do que uma guerra comercial com os Estados Unidos”. O mesmo foi dito por Ursula von der Leyen, no domingo.
O acordo define uma taxa de 15% sobre a maioria dos produtos do bloco, mesma taxa do acordo que o presidente Donald Trump fechou com o Japão na semana passada.
Além dos 15%, segundo o presidente dos EUA, a UE gastará US$ 750 bilhões adicionais em produtos do setor de energia dos EUA, investirá US$ 600 bilhões no país e comprará “uma enorme quantidade” de equipamentos militares americanos.