Restaurante Piassi comemora 70 anos em São Miguel Paulista com abertura de novo andar

Uma image de notas de 20 reais
Maria Conceição Piassi com os sobrinhos Pedro e Elisa no novo andar do restaurante
(Mastrangelo Reino/Agência DC News)
  • Restaurante começou como bar e sua história está ligada ao crescimento do bairro de São Miguel Paulista
  • Novo objetivo do restaurante é reformar o salão do térreo. Balcão é o mesmo desde a criação em 1955
Por Anna Scudeller

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
Prestes a completar 87 anos, Maria Conceição Piassi recorda o surgimento do bairro de São Miguel Paulista, paralelo à história do restaurante da família, o Piassi, que completa sete décadas este ano. “O comércio aí da frente era tudo bambuzal quando começamos”, disse à AGÊNCIA DC NEWS, referindo-se às lojas na avenida Marechal Tito. O restaurante, criação dos sogros Pedro e Luiza Piassi em 1955, agora finaliza sua maior reforma, a ampliação do segundo andar, em comemoração ao aniversário do negócio. A obra é fruto da aposentadoria de Marco, 66, filho de Maria, após fazer carreira como engenheiro no Metrô de São Paulo. A princípio, o plano dele era criar apenas uma saleta. Agora, a saleta se expandiu a um salão moderno que conta a história da família. Os irmãos Aurélio e Pedro Filho adornam a parede ao fundo, em um retrato horizontal com cerca de 2 metros de largura. Maria, viúva de Aurélio, diz que é “muito bom” acompanhar o que o negócio se tornou, em especial a gratidão dos filhos e novas gerações, por mais agridoce que seja. “Fico sentida só de saber que meu marido não chegou a ver tudo isso.”

Acompanhada da história do bairro, Maria Conceição Piassi recebeu o Prêmio Empresário de Valor 2025, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), como destaque empresarial da distrital São Miguel da capital paulista. Dona Maria, como os sobrinhos e filhos a chamam, entrou no negócio para apoiar seu marido Aurélio, que sempre desejou que ela também trabalhasse para o sustento da casa. Segundo Maria, eles e Pedro Filho tiveram escolaridade somente até os primeiros anos do ensino fundamental, então focar os esforços da família no empreendimento não era uma questão simplesmente de escolha. Era a única disponível. “Era muita vontade de vencer na vida.” Mas a história começa quando seus sogros, os pais de Aurélio e Pedro Filho (que tinham mais sete irmãos), compraram um boteco naquele endereço logo após chegarem do interior. A esquina, que hoje é totalmente ocupada pelo Piassi, antes era um açougue. “O boteco era metade desse salãozinho aqui”, afirmou. O balcão do espaço segue o mesmo desde aqueles tempos, quando Maria e Aurélio eram namorados. 

SEGUNDA GERAÇÃO – Aurélio Piassi viu uma oportunidade no bairro de São Miguel Paulista, que começava a receber mais moradores e era frequentado por caminhoneiros. Aquele trecho da então estrada da rodovia Rio-São Paulo viraria a atual avenida Marechal Tito, e os caminhoneiros eram um público primordial. A Rodovia Ayrton Senna, antiga Rodovia dos Trabalhadores e Via Leste, que começa no final da Marginal Tietê, no bairro da Penha na Zona Leste e termina no município de Guararema (SP), só seria construída em 1982. “Meu marido começou a fazer churrasco e vitamina. Ele comprou uma chapa e fazia churrasco.” A vitamina de abacate se tornou um carro-chefe do boteco, juntamente do tradicional prato feito. Os sogros, notando a movimentação de Aurélio, venderam o negócio para o filho. Logo em seguida, Pedro Filho entrou oficialmente no negócio. Nesse ínterim da venda, os dois irmãos casaram e Maria veio do interior de uma vez por todas. “Vim morar na casinha do fundo que minha sogra morava, e ela foi morar na casinha de cima”, disse. Ambos os irmãos tiveram quatro filhos.

Escolhas do Editor

Neste momento, o bar começa a se transformar no Restaurante Piassi, já na segunda geração com os irmãos. Até então, a cozinha era comandada pela sogra, Luiza, e as noras entraram nessa rotina. Contudo, a clientela crescente de policiais e das empresas farmacêuticas da região começou a pedir mais opções no cardápio. Isso os levou a contratar um cozinheiro profissional temporário para ensiná-las mais pratos, como feijoada e virado à paulista. O restaurante tomava forma: de um fogão de três bocas a um fogão comercial de quatro bocas, com uma cozinha elaborada com vidro para o salão. Aurélio e Pedro Filho notaram mais uma oportunidade. O açougue, que ficava na esquina, se mudou. “Aí foi aumentando [o espaço]. A cozinha de vidro já não dava mais conta, era pequena”, disse. “Expandiram o salão, moveram a cozinha para o fundo, onde era o quintal.” Antes, a cozinha estava no que hoje é a metade do salão. 

O imóvel, porém, ainda não era dos Piassi. O antigo proprietário havia prometido que daria prioridade à família quando decidisse vender, e assim o fez. Os irmãos aceitaram, mas o antigo proprietário repensou a decisão. “Naquela época a palavra era muito importante, então a venda aconteceu”, afirmou. Aos poucos, Aurélio e Pedro Filho foram expandindo o tamanho do restaurante, com pequenas reformas. Uma dessas obras, inclusive, foi responsável por mudar a entrada do negócio. “Acostumaram tanto com a entrada que foi essa que ficou, não mais pela Marechal Tito”, disse. A mudança é um tanto simbólica: a rua com a entrada é a José Aldo Piassi, nome de um dos nove filhos da segunda geração dos Piassi. 

Maria Conceição Piassi, de 86 anos, diz que o negócio vingou pela vontade de vencer na vida
(Mastrangelo Reino/Agência DC News)

A história do nome da rua se mistura com a história da família. Em 1970, José faleceu aos 26 anos durante uma cirurgia de úlcera devido a um erro médico. O profissional acidentalmente cortou a artéria aorta do rapaz, que teve parada renal e o enxerto não deu certo. O impacto da perda foi tão grande que o restaurante começou a fechar aos domingos, mas não durou muito tempo. “Meu marido ficava doente se não vinha trabalhar, com crise de enxaqueca”, afirmou Maria. A mente sempre no trabalho, foi nessa época que Aurélio implementou pizzas ao cardápio, com receita de massa própria. E de fato, Aurélio não parava nem sob recomendação médica. Durante os anos finais de sua vida, batalhou contra um câncer na próstata e após toda sessão de radioterapia ia ao Piassi cortar bifes de carne, quando deveria repousar. Aurélio, que também lutou contra o Alzheimer, faleceu em 8 de junho de 2006, aos 72 anos.

O irmão, Pedro, faleceu aos 88 anos, em 2019. Maria afirma que o cunhado conseguiu acompanhar o início da criação do segundo andar, quando a saleta inicial ficou pronta. Elisa, filha de Pedro Filho, aos 63 anos, se emociona ao lembrar da perda do pai. “Achei que eu não aguentaria, mas depois você pensa na gratidão de ter convivido com ele”, afirmou. De acordo com ela, foram muitos anos na função de filha e outros tantos na função de parceira de trabalho. “Meu pai fazia a feijoada. Desde menina já ficava aqui dentro ajudando a colocar linguiça e bacon.” Ela descreve que, enquanto o tio procurava expandir os negócios e parcerias do restaurante com empresas da região, o pai era mais focado no dia a dia dos funcionários. “Ficava na retaguarda. A relação deles era muito boa.”

Fachada do Restaurante Piassi entre as décadas 1960 e 1970
(Reprodução/Acervo pessoal)

TERCEIRA GERAÇÃO – Atualmente nas mãos da terceira formação familiar, o Restaurante Piassi, com seus 40 funcionários e tíquete médio de R$ 50, não experienciou uma transação de comando tradicional. Maria, que recentemente se recuperou de um câncer de pele após lutar contra outro câncer, o de mama, continua indo todos os dias ao restaurante. Hoje, é Elisa e Pedro, filhos de Pedro Filho; Marco e Eduardo, filhos de Aurélio, que se dividem na administração. Os outros irmãos se dedicam em a suas respectivas carreiras. No caso dos quatro bastiões do Piassi, a história se repete: o mesmo processo que envolve dedicação integral, amor pelo laço familiar e uma obsessão em manter de pé a herança gastronômica dos Piassi.  

No momento, a administração não tem planos de expandir. O foco está em manter viva a memória da família e o trabalho árduo dos pais. Pedro, de 58 anos, montou um pequeno museu no segundo andar, com fotos dos bisavós e da casa que os Piassi moravam no interior, além de objetos importantes na história familiar. Elisa ressalta a gratidão que sente pelos pais e tios que tocaram o negócio. “Fico até emocionada, porque eles deram a vida aqui”, disse. Ela afirmou que o restaurante é uma herança em todos os sentidos possíveis – o imóvel, herança financeira e de bagagem. Em especial, de amor. “Então para nós é muito especial, os nossos filhos também consideram. Agora, se vão dar continuidade hoje, não sabemos.”

A maioria dos sete integrantes da quarta geração está cursando medicina (uma das filhas já se formou) e não há planos de mudança na administração. “Nós fomos criados para estarmos à frente do restaurante. Eles não”, disse. Enquanto a decisão não é tomada, focam seus esforços em reformar o espaço como conseguem. Com a finalização da reforma e abertura do salão do segundo andar aos fins de semana, com capacidade para aproximadamente 100 pessoas, Elisa espera maior movimento durante o período de festas de final de ano. E os próximos planos envolvem uma nova reforma, desta vez para o térreo em 2026. “Até a terceira geração conseguimos garantir, agora vamos ver.” Apesar disso, não há planos de parar. O Piassi segue com seus pratos tradicionais, sua clientela fiel e funcionários envolvidos com o negócio.

Salão térreo do Restaurante Piassi
(Mastrangelo Reino/Agência DC News)

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