Rodrigo Manga adota discurso motivacional em curso de redes sociais

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Quando você começar a fazer as coisas certas você vai incomodar e vai começar a perceber que está avançando pelo tamanho dos seus inimigos”, “pare de sonhar com um cargo, comece a agir dentro da sua missão” e “o sistema não tem medo de político, tem medo de gente com missão” são algumas das lições que o aluno do curso de redes sociais ministrado por Rodrigo Manga vai encontrar.

Conhecido como “prefeito tiktoker”, Manga (Republicanos) foi afastado da gestão de Sorocaba na quinta-feira (6) após decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em meio a uma investigação sobre supostos desvios na área da saúde. Ele nega acusações e diz ser alvo de perseguição. O vice, Fernando Martins da Costa Neto (PSD), assumiu o cargo na cidade do interior de São Paulo.

O político acumula 3,7 milhões de seguidores. Inicialmente, seu curso se chamava “Política Viral”, mas no Instagram Manga passou a nomeá-lo de “Politiktok”.

Vendo oportunidade de negócios, o prefeito afastado —que é graduado em marketing— lançou o curso voltado aos políticos. Por R$ 293, integrantes da esquerda, centro e direita em tese poderiam aprender a “criar vídeos impactantes, construir autoridade e conquistar respeito na política, sem depender de partidos”, como diz a descrição do produto na plataforma de venda.

A Folha teve acesso às 28 aulas, dispostas em cinco módulos principais e três bônus —esses últimos com lições dadas pela esposa de Manga, Sirlange Maganhato (União Brasil). Nos vídeos, o político aparece sentado na mesma sala de parede bege, ora com ângulos mais fechados, ora mais abertos. Sempre vestido de paletó e camisa social.

Quem paga pelo curso encontra um misto de ufanismo e pregação motivacional, com aulas que focam aspectos de discurso. Não há dicas de como roteirizar, gravar ou editar vídeos para cada rede social —as aulas têm um processo mínimo de edição, com cortes e inserção de vídeos de exemplos publicados nos perfis do político.

“A ideia do curso é potencializar o trabalho já realizado pelas pessoas. Trata-se de um conteúdo de autodesenvolvimento e comunicação estratégica”, disse Manga à Folha antes de ser afastado do cargo. Ele afirma que a proposta é compartilhar, de forma prática, como qualquer pessoa pode usar as redes sociais para transformar sua voz em liderança real.

ALUNOS TÊM OPINIÕES DIVERGENTES SOBRE CURSO

O político promete dar “ferramentas” para ajudar o aluno a produzir seus conteúdos. Jayme Magalhães Júnior, publicitário e advogado, resolveu comprar o curso, segundo ele, por ver a política do mesmo jeito que Manga. Ele afirma que o curso o ajudou a aperfeiçoar a comunicação. “Gosto bastante do que ele trouxe de novo para a comunicação política, com bom humor e leveza.”

Filiado ao PL, Magalhães já foi candidato a vereador e a vice-prefeito em Campo Grande (MS). Pretende usar os ensinamentos do curso para concorrer novamente a vereador em 2028.

Já Vinicius Andrade, assessor do vereador Robert Ziemann (PSDB), de Maracaju (MS), diz que procurou o curso pelo alcance e criatividade de Manga nas redes, mas se decepcionou com o que foi entregue. Para ele, as aulas “não serviram para nada”.

O assessor conta que o que mais o incomodou foi o conteúdo motivacional. “Essa parte não faz a menor diferença, buscava conteúdos práticos e técnicos para usar nas redes do vereador, e isso foi tudo o que não encontrei. Se pudesse, não teria comprado esse curso”, diz.

Nas aulas, Manga afirma com frequência que o aluno deve “encontrar seu propósito”. “Você precisa de causa, ação e de celular na mão”, diz. Em nenhum momento o político pega o celular para dar orientações mais técnicas ou falar sobre estatísticas e estratégias para as redes sociais.

A área da plataforma segue com os mantras repetidos por Manga: “Minha dor que virou força”, “A injustiça que mais te revolta” e “Quem precisa da sua coragem?”. Em links nas descrições, no entanto, o usuário se depara com planilhas em branco do Google, seguidas por mais uma mensagem motivacional: “O povo acredita em quem age. E quem planeja, lidera”.

O político omite que funcionários comissionados da Prefeitura de Sorocaba gravam os conteúdos e atuam como figurantes nos vídeos publicados nas redes, como revelou o G1.

Kaleo Dornaika, advogado especialista em direito eleitoral, diz não ver irregularidades na comercialização de um curso privado por parte de um prefeito. “Desde que se mantenha rigorosa separação entre a atividade privada e o exercício do cargo, sem usar bens, serviços, pessoal, dados ou canais oficiais do município”, explica. A utilização de servidores comissionados para as gravações, mesmo em horário de almoço, é irregular, segundo o advogado.

Pela Constituição, os chefes do Executivo municipal estão submetidos ao artigo 37, que rege a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e veta promoção pessoal em publicidade institucional.

Nos módulos bônus, dados pela esposa de Manga, o aluno encontra três aulas: networking, pesquisas eleitorais e planejamento de campanha. São nessas aulas —entre quedas de energia e cortes secos de edição de vídeo— que é possível encontrar um pouco mais de conteúdo político.

Brevemente, na aula sobre networking, Sirlange menciona encontros com o vice-governador Felício Ramuth (PSD) e com o secretário de Segurança Urbana da cidade de São Paulo, Orlando Morando.

EMPRESA ESTÁ NO NOME DA FILHA DO PREFEITO E NA SEDE DO PARTIDO

A empresa que produz e comercializa o curso, a GMS Hub, está no nome da filha de Manga, Giulia Pansarini Maganhato, e foi criada em fevereiro de 2025. O endereço cadastrado da empresa é o mesmo da sede do Republicanos.

À Folha Giulia Maganhato disse ser a única administradora da GMS Hub e responsável por responder todos os comentários na plataforma do curso. Ela afirma não ver conflito no fato de a empresa estar localizada no mesmo imóvel onde funciona o Republicanos.

Roberto Natalino Silveira, presidente do partido em Sorocaba, também nega conflito de interesses na situação. De acordo com ele, o imóvel tem contratos de locação e estrutura distintos para o partido e a empresa. Ele também afirma que o Republicanos não usou recursos para ajudar na elaboração do curso.

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