[AGÊNCIA DC NEWS] Com mais de 12 mil empresas responsáveis por movimentar R$ 443,4 bilhões em 2024, o setor atacadista e distribuidor de alimentos no Brasil se prepara para profundas transformações com a implementação da Reforma Tributária. Para Leonardo Severini, presidente da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (Abad), o fim de incentivos fiscais regionais – como as subvenções estaduais – deve provocar um “rearranjo geográfico” na logística de distribuição. “Você vai deixar de ter passeio de caminhão para um preenchimento de pré-requisito fiscal”, disse ele à AGÊNCIA DC NEWS. A redistribuição do imposto pelo destino do consumo, como previsto na Emenda Constitucional 132, deverá beneficiar diretamente os centros de maior densidade populacional e demanda, que arrecadarão mais e terão menor custo logístico.
Isso porque o modelo de cobrança de impostos sobre o consumo deixará de ser feito na origem – ou seja, no estado em que está localizado o fornecedor – e passará a ser no destino, onde o produto é efetivamente consumido. Essa mudança, diz Severini, põe fim à lógica que, por anos, estimulou a instalação de Centros de Distribuição (CDs) em cidades que ofereciam benefícios fiscais, mesmo que distantes dos grandes mercados consumidores. O resultado dessa distorção gerou um redesenho artificial das rotas logísticas, com caminhões cruzando o país apenas para cumprir exigências tributárias. Agora, afirma, a tendência é de reordenamento operacional: os CDs poderão se instalar próximos aos polos de consumo, reduzindo custos com transporte, prazos de entrega e emissões de carbono.
Essa reorganização favorece diretamente o setor atacadista, que atua como elo estratégico entre a indústria e mais de 1 milhão de pontos de venda no varejo nacional, principalmente de pequeno e médio porte. Segundo estudo do Ipea, ao menos 82% dos municípios e 60% dos estados devem ser beneficiados com o novo modelo de arrecadação. Como resultado, áreas densamente povoadas devem ganhar importância estratégica, impulsionando a presença e o faturamento de distribuidores nessas regiões. Além disso, segundo o Ipea, o fim da guerra fiscal nivela a concorrência entre empresas de diferentes estados, corrigindo distorções históricas e fortalecendo os operadores que investem em eficiência logística e tecnologia, e não em artifícios tributários. Para Severini, “a Reforma Tributária trata isso de forma mais clara”.
FÓRUM – A Abad realizou este mês seu 44º Fórum, em Atibaia (SP), que reuniu 850 representantes do setor. Para acompanhar esse novo desenho logístico, Severini afirma que a digitalização será ferramenta-chave, especialmente no atendimento ao pequeno e médio varejo. “Vamos nos atualizar no dia a dia e nos refazer”, disse. Ele afirma que a Abad tem incentivado a simplificação dos três pontos principais de contato entre atacado e varejo: cadastro, venda e entrega. “O atacado do futuro vai continuar entregando fisicamente, diminuindo fricção e aumentando a eficiência.” Para 2025, a entidade projeta crescimento de até 8% no faturamento do setor. Confira a entrevista.
AGÊNCIA DC NEWS – Uma questão sensível ao setor é o fator fiscal. Como isso tem se desenhado com a Reforma Tributária?
LEONARDO SEVERINI – Existem dificuldades fiscais que não vão existir mais. A Reforma Tributária está tratando de uma questão que é importante, as subvenções: até então, existiam alguns estados com subvenções, tudo da forma mais republicana possível, mas que geravam distorções geográficas. Havia áreas que cresciam mais por causa dessas oportunidades fiscais [do que pela demanda]. A Reforma Tributária vai tratar isso de uma forma mais clara, o que vai gerar um rearranjo geográfico.
AGÊNCIA DC NEWS – E como esse rearranjo acontece?
LEONARDO SEVERINI – Teremos um atendimento mais direto nas regiões de maior concentração populacional e de maior concentração de demanda. O que vai dar um efeito direto também no meio ambiente. Você vai deixar de ter passeio de caminhão para preenchimento de pré-requisito fiscal. Hoje, existem trajetos que são preenchidos por questões de oportunidade fiscal. Isso vai deixar de existir.
AGÊNCIA DC NEWS – O que melhora a eficiência do setor?
LEONARDO SEVERINI – Sim. Um dos principais gargalos é garantir que a mercadoria chegue diretamente para o cliente no tempo devido, de forma com que ele consiga fazer promoções e promover suas ações comerciais em tempo condizente com a indústria. Porque a indústria também tem sua agenda de sazonalidade, com os produtos e lançamentos dela, e quer fazer com que esse produto chegue no pequeno e médio varejo. Para que isso aconteça, uma série de fatores deve andar em conjunto, como uma orquestra.
AGÊNCIA DC NEWS – E como lidar com o pequeno e médio varejista?
LEONARDO SEVERINI – Precisamos estar sempre nos falando. Ouvir a voz de quem compra da gente e atende diretamente o consumidor. Eles dizem ‘eu preciso destes pontos aqui para vocês auxiliarem e me atenderem’ – até porque, ao agir dessa forma, eu vou estar sendo muito melhor competitivamente falando.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais são as iniciativas atuais?
LEONARDO SEVERINI – Estamos passando por um processo de transformação digital. Costumo brincar que é um beta contínuo. Não existe processo pronto. Vamos nos atualizando no dia a dia e se refazendo. Estamos promovendo essa transformação digital também para o nosso cliente, que é o pequeno e médio varejo. Basicamente, é isso.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais são as tecnologias e os serviços que podem tornar as entregas mais eficientes?
LEONARDO SEVERINI – Hoje, o que pode facilitar a velocidade na entrega são ferramentas de inteligência e informação. Quanto mais prontas estiverem essas ferramentas, sem inflexão, mais o varejista pode usá-las a seu favor, mais o atacado e distribuidor podem oferecer esse tipo de ferramenta para acompanhar online as entregas dos produtos feitas através dos pedidos, que são diariamente efetuados por eles junto a nós.
AGÊNCIA DC NEWS – Como será o atacado do futuro?
LEONARDO SEVERINI – O atacado do futuro vai continuar fazendo serviços físicos, mas através de contatos mais simples. Existem três pontos de contato entre o atacado e o varejo: primeiro é o cadastro, você cadastra um cliente, dá crédito paro o cliente que vai comprar a prazo. Depois, você vem para um segundo momento em que exerce a venda para ele. Por fim, ele vai acompanhar quando você vai entregar a mercadoria. Esses são os três pontos de contato. O trabalho nosso é tirar a fricção desses três pontos, tornando a experiência mais simples e ágil.
AGÊNCIA DC NEWS – Como isso deve impactar a mão de obra?
LEONARDO SEVERINI – De forma tranquila, porque o que a gente exerce é uma entrega física. E você depende de pessoas para isso. Esse é o nosso trabalho, no dia a dia, prover mercadoria para o varejo.
AGÊNCIA DC NEWS – Quanto do setor de distribuição os associados da Abad cobrem?
LEONARDO SEVERINI – Temos penetração constatada pelo nosso ranking anual de quase 54% do território nacional.
AGÊNCIA DC NEWS – Como é a competitividade dos players do mercado distribuidor nos estados?
LEONARDO SEVERINI – A indústria tem algumas formas de categorizar esse tipo de distribuidor. Existe o distribuidor na essência, que é aquele representante de fato da indústria. Existem alguns parceiros que são do atacado complementar, porque muitas vezes aquele distribuidor na essência não consegue estabelecer uma entrega numérica condizente com a necessidade da indústria. Então, nos estados existe certa concorrência e uma competição também, porque são várias indústrias e cada indústria elege o seu atacado distribuidor e o seu atacado complementar também.
AGÊNCIA DC NEWS – Quanto à evolução do faturamento, em cerca de 5% a 6% ao ano (6,2% de janeiro a maio), se mantém?
LEONARDO SEVERINI – Existe um certo nivelamento de patamar, e a gente vai crescendo de acordo com o crescimento econômico e com a inflação. Alguns canais crescem e outros não, e isso oscila. O nosso canal de atenção é o da conveniência, que é o pequeno e médio varejo, que atende o consumidor que vai lá para comprar na sua conveniência — e não para se abastecer. A gente está estimando 8% de crescimento para 2025. Com inflação na casa dos 4%, 5%, a previsão é ganhar R$ 1 a cada R$ 3.
AGÊNCIA DC NEWS – Quais são os próximos passos do setor?
LEONARDO SEVERINI – Trazer a transformação, a oportunidade da transformação digital para o nosso parceiro, que é o pequeno e médio varejo. É isso que estamos implementando. Para nós, já é uma realidade falar em transformação digital, em digitalização, processos de checagem, atendimento e análise que são providos por inteligência digital. A gente quer passar esse benefício para o cliente. É a nossa forma de tratar esse novo ecossistema.