Viúva de Khashoggi busca a Justiça após visita de príncipe saudita a Trump

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WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Hanan Elatr assistiu, em novembro, à visita do saudita Mohammed bin Salman à Casa Branca. O príncipe, bem recebido em Washington, é acusado de ter mandado matar o jornalista Jamal Khashoggi em 2018. Era o marido de Elatr. “Estou vivendo um inferno”, diz à reportagem. “Não há justiça.”

Decepcionada, a viúva de Khashoggi viu também como o presidente Donald Trump disse que o príncipe não estava envolvido no crime, o que contradiz as próprias investigações americanas. Trump afirmou, ainda, que Khashoggi -que escrevia para o jornal americano Washington Post- era uma pessoa “controversa” de que “muitos não gostavam”.

Elatr prepara, agora, uma série de ofensivas na Justiça. A mais imediata delas é o pedido de que o governo Trump torne pública a transcrição do telefonema dele com Salman em 2019, logo após a morte de Khashoggi. Elatr quer também forçar o governo saudita a assumir sua responsabilidade, desculpar-se e indenizá-la pela morte do marido.

O telefonema é a peça mais recente do caso. Em novembro, o deputado democrata Eugene Vindman afirmou à imprensa que havia lido a transcrição daquela conversa quando estava no Conselho de Segurança Nacional. Vindman disse que o conteúdo é “bastante perturbador” e que “chocaria as pessoas se elas soubessem o que foi dito” naquele dia.

O deputado não revelou os detalhes, uma vez que o material está sob sigilo. “Mas tudo indica que há algo de que precisamos saber”, afirma Elatr. “Pode ser uma evidência importante para auxiliar nos processos.”

Elatr planeja iniciar, em breve, uma campanha legal em diversos países –incluindo França, Reino Unido, Canadá, Noruega e Turquia. Não descarta também explorar as vias legais no Brasil.

Os casos se baseiam no fato de que, segundo a perícia de especialistas em cibersegurança, seu telefone foi monitorado desde 2018, com o provável objetivo de espionar Khashoggi. Elatr trabalhava como comissária de bordo e sugere que, por isso, o crime foi cometido em diversos territórios, durante suas viagens.

Jamal Khashoggi era editor de um jornal crítico ao regime saudita. Em 2017, exilou-se no estado da Virgínia, de onde continuou a escrever contra a monarquia.

Governada por uma aliança de forças conservadoras e religiosas, a Arábia Saudita é acusada de graves violações de direitos humanos. O príncipe Salman, conhecido como MbS, tem liderado uma série de medidas de abertura, tidas por seus detratores como meras mudanças cosméticas.

Em outubro de 2018, Khashoggi foi ao consulado saudita em Istambul para regularizar seus documentos. Nunca saiu. Investigações, incluindo as da Inteligência americana, sugerem que Salman esteve envolvido na ordem para o assassinato. Suspeita-se que o jornalista tenha sido drogado, morto e desmembrado ali. Nem o corpo nem os pertences foram jamais encontrados.

“Ele era um jornalista inocente”, diz Elatr, emocionada. “Tudo o que tinha eram ideias e palavras. Não tinha nenhum interesse. Escolheu exilar-se para continuar defendendo sua visão de futuro para a Arábia Saudita.”

Desde então, Elatr passa os dias tentando entender o que aconteceu naquele dia. “Tenho muitas perguntas e nenhuma resposta”, diz. Sua tese é de que a liderança saudita queria enviar uma mensagem aos dissidentes no país. “Tomaram essa horrível decisão para que todos os demais hesitassem em criticar o regime.”

Enquanto prepara os casos, Elatr diz que planeja continuar a falar em público sobre o marido para que ele não seja esquecido pela Justiça. Espera, em especial, que os jornalistas -colegas de profissão de Khashoggi- não o esqueçam.

Elatr corre algum risco ao se opor tão abertamente ao regime que ela acusa, afinal, de ter esquartejado seu marido. Depois de ser brevemente detida nos Emirados Árabes, ela fugiu em 2020 para os Estados Unidos, onde seu pedido de asilo foi aceito.

“Espero ser assassinada a qualquer momento”, diz. “Mas já perdi meu amor, que era como um irmão gêmeo para mim, meu Adão. Perdi meu emprego, minha família. Agora não tenho mais nada a perder.”

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