SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Olympikus, marca da Vulcabras, emerge como uma das vencedoras no acelerado mercado de corrida de rua. Em agosto, durante a apresentação de resultados do segundo trimestre, o CEO Pedro Bartelle anunciou contratações aceleradas para expandir a linha Corre, principal produto da companhia. Calçados esportivos representam 85% do faturamento da empresa.
A margem bruta caiu 1,7% na comparação com o mesmo período do ano anterior. A empresa justificou a queda como “oportunidade de expandir o market share” e “investimento estratégico em crescimento”.
A Vulcabras tem razões para celebrar o sucesso do Corre. Esse seu tênis de custo/benefício, “smart choice”, como diz Bartelle, custa R$ 599, está indo para a quinta edição e lidera rankings de preferência no Brasil, segundo o muito popular aplicativo Strava.
A família aumentou com a chegada de modelos de maior valor agregado, casos do Corre Turbo, do Supra e do Corre com placa de grafeno, a resposta da Olympikus aos caros tênis de placa de carbono, “trend” global no segmento, que faz com que corredores recreativos imaginem-se por alguns momentos nascidos no Quênia.
O Corre é a materialização do desejo da Olympikus de se tornar a marca de corrida brasileira por excelência, uma campeã nacional, com o perdão da expressão tão 2010.
Mas o foco no “running” da empresa, que hoje parece tão natural -a Vulcabras tem ainda licença para fabricar e comercializar por aqui modelos das marcas Under Armour e Mizuno-, não é tão recente. Durante anos, por meio da Olympikus, a companhia flertou com diversos esportes, chegando a patrocinar o Comitê Olímpico Brasileiro e a vestir os atletas olímpicos do país. O primeiro Corre só foi aparecer em 2019.
Bartelle, que falou com a Folha por videoconferência, acredita que a Vulcabras, por ser uma empresa muito verticalizada e capaz de “dominar todas as etapas”, da criação do produto à comercialização, tem uma “inteligência de mercado bastante desenvolvida” e sabe “o que colocar em cada lugar”.
Ser do ramo calçadista parece efetivamente uma vantagem competitiva em relação à concorrência, formada pelas marcas esportivas globais, que no Brasil optam por modelos de gestão distintos, às vezes mudando de parceiros nacionais com frequência quase neurótica. A Nike, por exemplo, hoje tem seus desígnios no Brasil controlados pelo grupo SBF, da Centauro, cuja origem e DNA é o comércio varejista. A própria Vulcabras teve no passado em seu portfólio Adidas, Puma, Reebok, Lotto, entre outras.
A afirmação pode ser temerária, mas nem tudo que existe é branding, embora em nome da construção de marca até mesmo a Vulcabras venha movendo mundos e fundos. Em 2025 a Olympikus faz 50 anos, e a marca decidiu ligar-se a 50 provas de corrida, seja patrocinando as massivas, como as maratonas de São Paulo e Porto Alegre, seja dando vida a novas etapas do Bota pra Correr (BPC), evento proprietário realizado desde antes da pandemia em destinos turísticos como Alter do Chão, Cumbuco e no Pantanal, com o objetivo de criar ‘awareness’ de marca.
Em resposta a este repórter no BPC da Serra do Cipó (MG), em março passado, Márcio Callage, CMO da Vulcabras, disse enfaticamente que o BPC “não foi feito para dar ROI (retorno sobre investimento)”.
Uma lacuna da Vulcabras que deve começar a ser preenchida ano que vem é, ironicamente, a da exposição de suas marcas para o consumidor. A Olympikus não tem lojas próprias, e as redes multimarcas, por uma característica brasileira, não possuem em geral corners e espaços exclusivos para cada fornecedor, dificultando, segundo Bartelle, a oferta de uma experiência de consumo satisfatória.
Mesmo com o ecommerce relevante, a crescer 1,8 ponto percentual em um ano, para 14,8% da receita líquida no último trimestre, ele enxerga uma estratégia de diversificação de canais mais eficaz com as lojas, que poderiam atuar até como um “estoque avançado para entrega rápida” do eletrônico.
Mais importante, elas também possibilitariam exibir os artigos de vestuário e acessórios que hoje respondem por apenas 8% da receita, parcela que Bartelle crê poder ao menos dobrar.
Essa “via de crescimento importante” é bastante conhecida pela concorrência. Mesmo a Under Armour, ele exemplifica, gera 80% de sua receita global com os itens de vestuário, ainda que tenha “assets” (ativos), como diz, para isso -patrocínio de times de futebol e outros esportes populares, por exemplo.
A Vulcabras cresce há vinte trimestres consecutivos, e, se a margem de lucro foi impactada pelas contratações, a receita líquida do último trimestre aumentou 17,6%. Performance que dá força à ideia de que o tempo de pescar -e pivotar- em águas turvas ficou para trás.
Por causa da invasão de produtos chineses triangulados por outros mercados para driblar os dispositivos de proteção do setor calçadista nacional, a Vulcabras começou a década passada cortando feio na carne. Foram demitidos dois terços dos 45 mil funcionários -hoje são cerca de 22 mil- e foram fechadas 29 fábricas, incluídas aí as satélites -são duas fábricas atualmente, ambas no Nordeste.
O plano de emagrecimento foi capitaneado por um ninja da reestruturação de empresas, Claudio Galeazzi, que, ao sair, passou o manche justamente para o atual CEO. “A dor ensinou a gente a gemer. A frase é clichezona, mas há males que vêm para o bem, ainda que não precisássemos sofrer tanto. Mas a gente criou uma casca de tartaruga forte, não baixamos a guarda nunca, queremos sempre ganhar mercado, baixar os custos, melhorar resultados.”
RAIO-X VULCABRAS
Fundação: 1952 (Vulcabras); 1958 (Calçados Azaleia, que criaria a marca Olympikus)
Fundadores: Josef Pfulg (Vulcabras); Pedro Grendene Bartelle e Alexandre Grendene (Azaleia)
Principais acionistas: Família Grendene Bartelle
Receita bruta em 2024: R$ 3,56 bilhões, crescimento de 9,2% em relação ao ano anterior.
Lucro líquido em 2024: R$ 544,1 milhões
Funcionários: Aproximadamente 22 mil
Principais concorrentes: Nike, Adidas, Fila, marcas que no Brasil são licenciadas por grupos distintos