SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O aumento de tarifas ao Brasil imposto por Donald Trump expôs o nó político do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que publicamente tenta se equilibrar entre fidelidade ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o respeito à Justiça e à democracia.
Na avaliação de dois presidentes de partidos, de deputados federais e estaduais aliados ao governador e de integrantes de sua equipe, a imagem de Tarcísio entre os bolsonaristas sairá arranhada caso ele não apoie as medidas de Trump nem as trate como reflexo direto de uma suposta perseguição antidemocrática sofrida pelo ex-presidente.
Por outro lado, se endossar as barreiras comerciais impostas pelo governo americano, o desgaste será com o mercado financeiro, o setor agropecuário e com eleitores fora do campo bolsonarista.
Bolsonaristas de São Paulo, segundo apurou a reportagem, esperavam que os Estados Unidos anunciassem sanções contra o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes não contra o país inteiro.
As primeiras reações de Tarcísio seguiram essa linha e tiveram de ser recalibradas ao longo da semana diante da impopularidade das medidas.
Na segunda-feira (7), quando Trump publicou um texto em defesa de Bolsonaro, Tarcísio rapidamente reverberou a mensagem, tratando a iniciativa como uma vitória do bolsonarismo e atacando indiretamente a legitimidade do STF para julgar o processo criminal contra o aliado.
“Jair Bolsonaro deve ser julgado somente pelo povo brasileiro, durante as eleições. Força, presidente”, disse, na ocasião, em uma crítica também a decisões do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que condenou Bolsonaro e o declarou inelegível até 2030 por uso da máquina nas eleições e ataques à Justiça Eleitoral.
Na quarta (9), logo após o anúncio das tarifas, o STF saiu do foco do governador. Em uma nova publicação, ele associou o tarifaço a posturas políticas do presidente Lula (PT), como “prestigiar ditaduras, defender a censura e agredir o maior investidor direto no Brasil”.
“Não adianta se esconder atrás do Bolsonaro”, escreveu desconsiderando que Trump abre a carta enviada a Lula com críticas ao tratamento dado pelo Brasil ao ex-presidente.
Já nesta quinta (10), com a crise em proporções mais claras e reações negativas do setor empresarial consolidadas, Tarcísio adotou outro tom, falando em “diálogo” e “negociação” durante entrevista em um canteiro de obras do metrô em São Paulo.
Questionado sobre o papel do Supremo na decisão sobre a tarifa, Tarcísio disse: “[Tem] uma série de posturas que não condizem com a nossa tradição democrática e eu espero que o Brasil sente na mesa e resolva o problema das tarifas”.
Mas, ao ser questionado sobre uma possível interferência no Supremo para suspender o julgamento de Bolsonaro como sugerido por Trump, desconversou: “Não estou falando isso, estou falando que agora o esforço do governo brasileiro tem de ser resolver a tarifa”.
Aliados de Tarcísio dizem ver em episódios anteriores como o vídeo que gravou usando um boné com a frase “Make America Great Again” (faça os Estados Unidos grandes de novo) acenos ao eleitorado bolsonarista, que muitas vezes considera o governador pouco leal a Bolsonaro.
Um deles afirmou que a classe política reconhece o bom trânsito de Tarcísio com ministros do Supremo, mas avalia que, para ser o candidato apoiado por Bolsonaro em 2026, ele precisará subir o tom contra a corte sendo, ao mesmo tempo, um nome do bolsonarismo e da centro-direita.
O discurso de Tarcísio na última manifestação de Bolsonaro, na avenida Paulista, em junho, já havia sido alvo de críticas do entorno do ex-presidente.
Apesar de ter defendido justiça e anistia a Bolsonaro, concentrou-se em atacar o governo Lula e repetir o slogan “Fora PT”, o que foi interpretado como discurso de candidato. Ele poupou, na ocasião, os ministros do STF, que foram duramente criticados nos demais discursos.
Embora diga que no ano que vem disputará a reeleição ao governo paulista, Tarcísio é considerado o candidato de uma coligação que uniria Republicanos, PL, PP, União Brasil, MDB e PSD contra Lula.
Um dirigente partidário disse que, embora o setor produtivo estivesse próximo a Tarcísio, há expectativa de que migre para Lula por uma questão de sobrevivência política para reforçar o presidente nas tratativas de reversão das medidas de Trump.
Pouco antes da entrevista de Tarcísio no canteiro do metrô, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), havia criticado o governador, insinuando que ele seria um “candidato vassalo” dos americanos. O governador mandou o ministro “falar menos e trabalhar mais”.
Ao falar com os jornalistas, Tarcísio disse que também buscou canais de diálogo com representantes dos Estados Unidos para tentar reverter o cenário mesmo sendo identificado como um nome do bolsonarismo.
À reportagem um de seus aliados relatou esperança de que um eventual desfecho positivo agrade tanto ao eleitorado fiel a Bolsonaro quanto ao restante da população.