SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Homens detidos em centros de imigração no sul da Flórida foram obrigados a comer ajoelhados, com as mãos algemadas atrás das costas e inclinados sobre cadeiras “como cães”, segundo relatório divulgado nesta segunda-feira (21). O documento, produzido pela ONG Human Rights Watch, denuncia condições degradantes em três centros de detenção superlotados na região.
O relatório descreve uma série de abusos em três unidades: o Krome North Service Processing Center, o Broward Transitional Center (BTC) e o Federal Detention Center (FDC), todos na Flórida.
Além dos maus-tratos, os detentos enfrentam superlotação, falta de atendimento médico e psicológico, confinamento em celas geladas e sem camas, além de transferências inesperadas que dificultam o acesso à defesa. Casos de negligência médica podem ter contribuído para pelo menos duas mortes.
Relatos de abusos cometidos por agentes do Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, na sigla em inglês) e guardas de empresas privadas incluem manter pessoas algemadas por longos períodos em ônibus sem comida, água ou acesso a banheiros em funcionamento, além de celas geladas, sem camas ou itens de higiene, sob luz fluorescente permanente.
Detidos foram devolvidos à prisão mesmo após emergências médicas, sem qualquer acompanhamento ou medicamento. Alguns foram isolados em confinamento solitário ou transferidos sem aviso, comprometendo a estratégia da defesa. Ainda foram forçados a dormir no chão frio e a comer alimentos de qualidade duvidosa.
O relatório se baseia em entrevistas com 11 pessoas atualmente ou recentemente detidas, familiares e advogados de imigração, além de análises de dados. Krome e BTC são administrados por empresas privadas sob supervisão do ICE.
De janeiro a junho de 2025, milhares de pessoas foram mantidas nesses centros de detenção sob condições que violam padrões internacionais de direitos humanos e as próprias normas do governo dos EUA.
No Krome, o número de detidos em março aumentou 249% em relação aos níveis anteriores à posse de Donald Trump, alcançando mais de três vezes a capacidade da unidade. Em 20 de junho de 2025, o total de detidos nos três centros era 111% maior do que antes do início do segundo mandato.
Os investigadores documentaram graves violações médicas. Os cuidados precários podem ter contribuído para ao menos duas mortes, uma no Krome e outra no BTC, conclui o relatório.
Pessoas com diabetes, asma, doenças renais e dores crônicas não recebiam medicamentos ou consultas.
Em um caso, um homem com doenças crônicas foi transferido sem seus remédios diários, mesmo após insistir com os agentes. Após desmaiar, foi levado ao hospital registrado sob nome falso e, depois, retornou algemado ao centro.
Em outro, um detido tossia sangue em uma cela superlotada e foi ignorado por horas. O protesto dos demais gerou uma intervenção violenta de uma Equipe de Controle de Distúrbios, que desligou câmeras e agrediu os detidos, segundo testemunhas.
Relatos indicam que pedir ajuda psicológica poderia levar à punição. No BTC, quem manifestava sofrimento emocional era isolado em solitária por semanas. “Se você pede ajuda, te isolam. Se chora, podem te tirar por duas semanas. Então, as pessoas ficam em silêncio”, disse uma mulher.
As condições refletem o endurecimento da política migratória no segundo mandato de Donald Trump, marcada por deportações em massa e lotação recorde dos centros de detenção.
Apenas na Flórida, 223 acordos entre autoridades locais e o ICE permitem que a polícia atue diretamente na detenção e deportação de imigrantes. O estado lidera proporcionalmente no número de agências participantes.
O resultado dessas políticas federais e estaduais é um clima crescente de medo: imigrantes muitos sem condenação evitam polícia, consultas médicas, igrejas e escolas, afetando profundamente sua vida e a de suas famílias.