BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As Nações Unidas realizam nesta segunda-feira (28), em Nova York, uma conferência para debater o estabelecimento da solução de dois Estados no Oriente Médio, uma tentativa de fazer avançar as discussões sobre o tema em meio ao recrudescimento da situação humanitária na Faixa de Gaza que, no entanto, deve resultar em poucas medidas concretas.
A conferência é presidida pela França e pela Arábia Saudita, e tem o Brasil na liderança de um dos oito grupos de trabalho estabelecidos, ao lado de Senegal.
Participam também Qatar, Canadá, México, Turquia, Irlanda, Jordânia, Espanha, Indonésia, Itália, Noruega, Japão, Egito, Reino Unido, União Europeia e a Liga Árabe.
O evento estava marcado inicialmente para junho, mas foi suspenso após os ataques de Israel ao Irã, em conflito que durou 12 dias e fechou o espaço aéreo de países da região. Remarcada, a conferência foi rebaixada a nível ministerial.
A conferência se propõe a ser uma plataforma para se chegar a consensos “motivados pelo imperativo de traduzir compromissos em ações concretas e coordenadas”. A linguagem diplomática, porém, esconde os obstáculos políticos do evento, que são um reflexo da própria paralisia da ONU para lidar com conflitos ativos no mundo.
Israel, parte afetada pelas discussões, é contrário à realização da conferência sob o argumento de que implementar um Estado palestino após os ataques do Hamas do 7 de Outubro significa premiar a ofensiva terrorista e criar uma plataforma para destruir Israel, nas palavras do premiê Binyamin Netanyahu.
Israel e as Nações Unidas estão em rota de colisão desde o ataque do Hamas e o início da reação de Tel Aviv em Gaza.
As mais recentes rusgas se devem ao fato de que Israel tem contornado o sistema operado pela ONU de ajuda humanitária no território palestino e acusado a organização internacional de se aliar ao Hamas; a ONU rejeita essa acusação e afirma que Israel propositalmente deixa de criar condições para o trabalho humanitário em Gaza, onde a fome e a insegurança alimentar atingem hoje níveis catastróficos.
Os Estados Unidos, membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e principal fiador da guerra de Tel Aviv em Gaza, também se opõem à realização da conferência e vão boicotá-la.
“Os EUA se opõem a qualquer passo que reconheceria unilateralmente um suposto Estado palestino, o que adiciona obstáculos legais e políticos significativos à resolução do conflito e poderia coagir Israel durante a guerra, consequentemente dando apoio a seus inimigos”, diz Washington em telegrama diplomático visto pela agência Reuters ainda em junho.
A admissão de um novo Estado-membro nas Nações Unidas passa pela aprovação de sua recomendação pelo Conselho de Segurança, no qual os EUA têm poder de veto, antes de ser aprovado pela Assembleia-Geral.
Apesar das limitações práticas da conferência, o evento indica os objetivos dos países participantes, em particular dos que a presidem, França e Arábia Saudita.
Nesta quinta-feira (24), o presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou que seu país vai reconhecer o Estado palestino, um movimento há meses antecipado e que só será formalmente anunciado em setembro, durante a próxima Assembleia-Geral da ONU.
Neste mês, o chanceler francês, Jean-Noël Barrot, deixou claro que a conferência se conecta a esse objetivo. “A meta [da conferência] é rascunhar como será a Gaza no pós-guerra e preparar o reconhecimento de um Estado palestino pela França e outros países que vão buscam essa abordagem”, disse Barrot.
A articulação de Paris almeja um duplo movimento: países árabes condenarão o Hamas e pedirão seu desarmamento pela primeira vez na conferência, uma medida desenhada para atrair mais países europeus a reconhecerem o Estado palestino, de acordo com o chanceler francês.
“Pela primeira vez, países árabes condenarão o Hamas e pedirão seu desarmamento, o que selará seu isolamento definitivo. Os países europeus, por sua vez, confirmarão sua intenção de reconhecer o Estado da Palestina. Metade dos países europeus já o fizeram, todos os outros estão considerando”, disse Barrot em entrevista ao semanário Le Journal du Dimanche.
Mais de 140 países já reconhecem um Estado palestino atualmente, incluindo o Brasil e vários países europeus, como Espanha, Noruega e Irlanda.
A França, no entanto, importante aliado de Israel principalmente nas primeiras décadas do estabelecimento do Estado judeu e que abriga as maiores comunidades judaicas e árabes da Europa é o primeiro país do G7 a tomar esse passo.
A realização da conferência foi aprovada pela Assembleia-Geral da ONU em dezembro de 2024.
Na ocasião, a resolução foi aprovada com 157 votos favoráveis, incluindo do Brasil, e 8 contrários (Argentina, Hungria, Israel, Micronésia, Nauru, Palau, Papua-Nova Guiné e Estados Unidos), além de 7 abstenções (Camarões, República Tcheca, Equador, Geórgia, Paraguai, Ucrânia e Uruguai).