Neto de Figueiredo nega ter postura diferente da de seu avô e fala em 'continuar legado'

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Neto do último presidente da ditadura militar no Brasil, o empresário bolsonarista Paulo Figueiredo negou ter postura diferente da de seu avô e disse querer “continuar o legado” dele.

A declaração foi dada em resposta a reportagem da Folha na qual especialistas apontaram a diferença entre sua atuação nos EUA e a atitude protecionista e avessa a interferências externas do ex-presidente João Baptista Figueiredo (1979-1985).

“A Folha de S.Paulo erra ao comparar minha atuação atual nos EUA com a política externa do meu avô, o presidente João Baptista Figueiredo, ignorando o contexto histórico e o conteúdo real de suas posições. Como chefe de Estado, ele tinha deveres institucionais e, no discurso da ONU em 1982, criticou invasões e ocupações militares -não a diplomacia ou o apoio entre nações amigas”, disse.

“Na prática, manteve relações próximas com Ronald Reagan, que o recebeu na Casa Branca como hóspede oficial em recepção de gala, visitou o Brasil, e com quem negociou apoio crucial: renegociação da dívida externa, linhas de crédito norte-americanas, respaldo do Tesouro dos EUA junto ao FMI e cooperação em segurança e tecnologia. Essa amizade é lembrada até hoje na Biblioteca Reagan, na Califórnia, com uma foto em tamanho gigante dos dois”, completou.

O discurso a que ele se refere é da abertura da Assembleia Geral da ONU, em 1982, quando Figueiredo foi o primeiro presidente brasileiro a discursar. Em sua fala, ele criticou a intervenção estrangeira no Afeganistão.

O conflito ocorreu em meio à ocupação do país pela União Soviética, durante a Guerra Fria, com rebeldes apoiados financeira e militarmente pelos Estados Unidos, então sob governo do republicano Ronald Reagan.

“Não se pode aceitar que, em razão da política de blocos, ocorra a ocupação de países soberanos e a interferência em seus assuntos próprios e se imponham limites à sua liberdade, como sucede no Afeganistão”, disse o então presidente brasileiro à ocasião

Ele defendia a retirada das tropas soviéticas da região, mas sem manifestar apoio à intervenção americana. A postura, chamada de pragmatismo ecumênico e responsável, marcou a política externa durante os governos de Figueiredo e de seu antecessor, Ernesto Geisel (1974-1979).

Seu neto, mais de 40 anos depois, diz que quer seguir o legado da “defesa intransigente da democracia e da liberdade” de Figueiredo e citou a aprovação em seu governo da Lei da Anistia, de 1979, que perdoou crimes de militares e de militantes de esquerda.

“[João Baptista Figueiredo] Não pediu a Reagan o ‘restabelecimento das liberdades’ porque era exatamente o que estava conduzindo: anistia ampla, geral e irrestrita, fim da censura e devolução pacífica do poder aos civis. Meu compromisso é dar continuidade ao legado do meu avô João Figueiredo e do meu bisavô, general Euclydes Figueiredo, na defesa intransigente da democracia e da liberdade”, afirmou.

Paulo Figueiredo tem atuado nos EUA junto do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), pelas sanções ao Brasil em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). A prática tem sido tratada pelo governo Lula (PT) como chantagem para que Bolsonaro seja anistiado no caso da trama golpista.

O tarifaço de 50% aos produtos brasileiros -atribuído à interlocução do empresário com a Casa Branca- foi enquadrado na seção 301 da Lei de Comércio dos EUA, mesma seção que já serviu de ameaça ao Brasil por causa de uma medida adotada por seu avô.

Em 1984, um ano antes da reabertura democrática no país, João Figueiredo sancionou a PNI (Política Nacional de Informática), que visava incentivar o desenvolvimento da indústria de informática brasileira e restringia importações na área.

No ano seguinte, os EUA anunciaram que o Brasil seria investigado por práticas desleais de comércio por causa da PNI, que teria dificultado a vida de empresas americanas de tecnologia no país. Em 1987, o presidente Ronald Reagan chegou a anunciar uma sobretaxa de 100% sobre diversos produtos brasileiros em resposta à lei nacional, algo que não ocorreu.

Embora, na ocasião, o Brasil já fosse governado por José Sarney, a taxação era fruto de uma política adotada por Figueiredo enquanto presidente, disse à Folha Dawisson Belém Lopes, pesquisador da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e autor do livro “De Bonifácio a Amorim”, sobre a história da diplomacia brasileira.

“O avô do Paulo Figueiredo andou às turras com os Estados Unidos. É curioso isso, uma ironia do destino”, declarou o acadêmico.

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