Pesquisa da ACSP mostra fachadas ativas "inativas". Mercado, comércio e poder público buscam soluções

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Taxa de vacância vai de 60% a 80% em alguns empreendimentos
(Karime Xavier/Folhapress)
  • Amostra mostra vacância de 63% na região da avenida Rebouças, 70% no Ibirapuera e 80% na Vila Mariana
  • De 300 empreendimentos com fachadas ativas na cidade de São Paulo, 94% foram construídas de 2016 a 2023
Por Vitor Nuzzi Compartilhe: Ícone Facebook Ícone X Ícone Linkedin Ícone Whatsapp Ícone Telegram

[AGÊNCIA DC NEWS]. As fachadas ativas nos térreos dos edifícios foram incluídas no Plano Diretor Estratégico (PDE) do município de São Paulo como um “objetivo urbanístico estratégico” para a transformação da metrópole. A ideia era substituir muros por lojas de comércio e serviços, abertas para a rua, aumentando com isso o fluxo de pessoas e o potencial econômico do empreendimento. Passados quase 11 anos da aprovação do PDE (Lei 16.050, de 2014, com alterações em 2023 e 2024 – nova revisão está prevista para 2029), pesquisa da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) mostra que a ideia das fachadas foi bem aceita e passou a ser implementada em todas as regiões da cidade, mas a execução não teve o efeito esperado. O número de empreendimentos com fachadas ativas se multiplicou, mas muitas continuam desocupadas ou aguardando locação (ou venda). Amostra feita pela pesquisa em três regiões mostra vacância de 63% a 80%. Trecho do documento relata que, atualmente, “as incorporadoras ponderam ou até evitam a produção de fachadas ativas”. E conclui: “A legislação urbanística acertou em incentivar, errou em obrigar e não é capaz sozinha de criar atratividade e fluxos suficientes para o comércio”.

Na região da Vila Mariana, por exemplo, pesquisa de campo mostra que de 45 lojas encontradas – em 26 empreendimentos com fachadas ativas (de um total de 154) –, apenas nove estavam ocupadas. Dezoito estavam disponíveis ara alugar ou vender e 18, desocupadas (40% do total). Em outro eixo pesquisado, o Ibirapuera, também na zona sul, havia 31 empreendimentos com fachadas ativas (de um total de 133) e 43 lojas: 23 (53,5%) desocupadas e sete (16,3%) para aluguel ou venda. No eixo Rebouças, eram 34 fachadas ativas em 104 empreendimentos, com 49 lojas: 20 (40,8%) desocupadas e 11 (22,4%) para aluguel ou venda. Conclusão: nos três eixos analisados, eram 391 empreendimentos e 91 (23,3%) com fachada ativa – em geral, minimercados ou serviços. Na Vila Mariana, a vacância chegava a 80%, somando 70% no Ibirapuera e 63% na região da avenida Rebouças. A divisão das áreas compreende 38 eixos na cidade, com base no sistema de transporte público. Dos empreendimentos residenciais verticais com fachada ativa, 74% estão nos eixos (2% construídos de 2016 a 2015 e 98% de 2016 a 2023).

O coordenador do Conselho de Política Urbana (CPU) da ACSP, Antonio Carlos Pela, conta que o colegiado passou a se debruçar sobre o assunto ao receber constantes questionamentos dos comerciantes sobre o funcionamento e a eficácia das fachadas. “Queríamos alguma coisa que integrasse os moradores”, afirmou, defendendo “melhorias e políticas mais eficazes não só para comércio e serviços, mas para a metrópole”. Realizada durante um ano (de junho de 2024 a junho deste ano) pela empresa Campagner Arquitetura e Urbanismo, a pesquisa pretendia responder algumas questões: se os empreendimentos passaram a ser produzidos com fachadas ativas, onde elas estavam localizadas, qual o uso e qual o nível de vacância. E refletir sobre “como a legislação urbanística pode interagir com o comércio”, disse a professora e pesquisadora Larissa Campagner, que conduziu a pesquisa. O universo analisado, com dados da plataforma Geoimovel, abrange 6,9 mil empreendimentos construídos de 2006 a 2023 na capital paulista, sendo 5,3 mil residenciais verticais e 1,3 mil residenciais horizontais. Das 300 fachadas ativas construídas em empreendimentos residenciais verticais, 94,3% foram no período de 2016 a 2013 e apenas 5,7% de 2006 a 2015. O ano de 2016 marca a aprovação da Lei 16.402, a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS), que regula as fachadas.

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Em números absolutos, a Vila Mariana é o eixo com maior número de empreendimentos com fachadas ativas: 29, de um total de 123 empreendimentos residenciais verticais construídos de 2016 a 2023 – 24% do total. Depois vêm Ibirapuera (28 de 95 – 29%) e Rebouças (11 de 71 – 15%), as três áreas escolhidas como amostra e onde foi feita pesquisa de campo. Havia ainda, entre outros, 23 fachadas ativas no eixo Perdizes-Pompeia e também 23 na Vila Madalena. Percentualmente, Santa Cecília, na região central, aparece em primeiro lugar, com 71%. Mas são apenas sete empreendimentos, sendo cinco com fachadas ativas.

A pesquisa Panorama do Uso de Fachadas Ativas em São Paulo foi apresentada nesta quinta-feira (14) pela coordenadora técnica da CPU, Beatriz Messeder, com a presença de arquitetos, urbanistas e representantes do mercado imobiliário. Segundo ela, é possível perceber em projetos mais recentes um cuidado maior sobre o tipo de uso que o futuro empreendimento pode ter. “O trabalho aponta estoque “sem perspectiva de uso que configura um potencial subutilizado, mas que pode ser explorado”. E considera que as fachadas representam um instrumento que também pode ser benéfico para os negócios (vendas de imóveis) e para a cidade (“dinâmica urbana, redução de muros e violência”). A única sugestão para melhorar a legislação foi em relação a vagas de estacionamento. “Precisamos ampliar o diálogo”, disse Larissa. O arquiteto Marcos Ferreira Gavião, por exemplo, afirmou durante o evento que os projetos às vezes são “iguais para bairros e hábitos diferentes”.

Em 2015, a ACSP já alertava para a necessidade de abordar o assunto com cuidado: pesquisa feita naquele ano em parceria com o Secovi-SP apontava justamente risco de vacância, devido à área destinada. “O uso das fachadas ativas depende da mudança de cultura e da criação de um novo ideário”, afirmou Larissa na ocasião, quando representava a Associação Comercial. “Esse mudança cultural depende da melhoria do transporte público, porque o varejo vai onde há demanda e estacionamento.”

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