RIO DE JANEIRO, RJ E BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Mineradoras e municípios afetados pelo desastre de Mariana (MG) tiveram interpretações divergentes da decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino de que determinações judiciais e medidas de governos estrangeiros não têm efeitos no Brasil até serem validadas pelo Supremo.
A decisão de Dino foi dada nesta segunda-feira (18) no âmbito de uma ação do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), que representa as mineradoras. A entidade tentava impedir que municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo prosseguissem com uma ação na Justiça do Reino Unido pela tragédia de Mariana, causada pelo rompimento de uma barragem há dez anos.
O objetivo da determinação também foi proteger o ministro Alexandre de Moraes do impacto da Lei Magnitsky, sanção financeira imposta pelo governo dos Estados Unidos.
Em nota, o Ibram disse considerar a medida “plenamente aderente à legislação brasileira” e afirma que fortalece a soberania nacional, respeita o pacto federativo e reforça a competência da Justiça brasileira para lidar com fatos ocorridos no país.
O instituto ressalta que a tramitação de pleitos indenizatórios no Brasil garante segurança jurídica, evita decisões conflitantes e permite adequada coordenação entre Poder Judiciário, Ministério Público, órgãos ambientais e autoridades responsáveis pela reparação.
“A decisão do ministro Dino, ao fixar que atos estrangeiros não têm eficácia automática no território nacional, reforça esse caminho institucional”, afirmou o Ibram.
Já o escritório Pogust Goodhead, que representa os municípios e vítimas em ações internacionais, afirma que a decisão não afeta processos já em andamento na Inglaterra e na Holanda, aplicando-se apenas a futuras ações de entes públicos.
O escritório diz que a decisão não discute o mérito da ADPF 1178, que questiona a legitimidade de municípios para ajuizar ações no exterior, nem impacta os contratos existentes com advogados internacionais.
Segundo o Pogust Goodhead, apesar de a decisão do STF se concentrar na atuação dos municípios em tribunais estrangeiros, os processos individuais das vítimas seguem normalmente, garantindo que seus direitos e pleitos de reparação não sejam afetados pela medida cautelar.
Uma audiência pública autorizada por Dino permitirá que os municípios apresentem os argumentos que justificaram a busca por reparação internacional. Além disso, uma audiência na Inglaterra, prevista para novembro de 2025, avaliará a manutenção de liminares contra o Ibram naquele país.
A decisão de Dino se baseia em uma medida cautelar concedida pela Justiça britânica em favor dos municípios interessados no processo sobre Mariana, que dizia que uma petição do Ibram ao STF poderia prejudicar o direito dos municípios a um julgamento justo.
O Supremo, contudo, declarou que tais medidas não têm eficácia no Brasil, e que decisões estrangeiras só podem ser executadas mediante homologação ou mecanismos legais de cooperação judiciária internacional.
Como destacou a própria decisão, “qualquer violação constitui ofensa à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes, portanto presume-se a ineficácia de tais leis, atos e sentenças emanadas de país estrangeiro”.
A medida cautelar britânica, segundo o STF, evidenciou que há “altíssimo risco de demandas patrocinadas por entes subnacionais em tribunais estrangeiros servirem de veículo ou pretexto para sanções e medidas contra o patrimônio nacional”.
No país, o STF homologou um acordo de R$ 170 bilhões envolvendo Samarco, Vale, BHP Billiton, União, estados e representantes de comunidades atingidas pelo desastre de Mariana. No exterior, ações ainda em andamento podem chegar a R$ 260 bilhões, principalmente envolvendo a BHP, empresa anglo-australiana que controla a Samarco ao lado da brasileira Vale.