SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em relatório elaborado pela área técnica, o TCU (Tribunal de Contas da União) recomenda que o leilão do terminal Tecon 10, no porto de Santos, não tenha qualquer restrição de concorrência e seja realizado em fase única.
O parecer será encaminhado ao relator do caso, ministro Antonio Anastasia, que apresentará seu relatório. Este será votado, provavelmente no mês de setembro, no plenário do tribunal para a elaboração do edital.
Embora o TCU tenha se baseado em quesitos técnicos, a reportagem apurou que houve um fator determinante para a recomendação: o receio de que o processo possa ser atrasado por qualquer questionamento judicial.
A prioridade do governo federal é que o leilão aconteça ainda este ano de qualquer maneira. A avaliação é que o prazo é apertado.
Entre as recomendações feitas no texto elaborado pela área técnica do TCU, ao qual a reportagem teve acesso, estão a obrigatoriedade de venda de ativos caso o vencedor do leilão provoque uma concentração de mercado no porto de Santos;
É recomendado também que eventuais transferências societárias que possam configurar concentração de mercado recebam anuência prévia da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica);
A recomendação do TCU pela livre concorrência vai em direção diferente da enviada ao órgão pela Antaq. É também a mesma posição defendida por possíveis participantes do leilão e pelo presidente da APS, Anderson Pomini. Eles acreditam que o certame deveria acontecer em duas fases.
Na primeira, estariam excluídos armadores (donos de navios) que já sejam concessionários de terminais em Santos. Eles poderiam participar apenas de uma possível segunda rodada. Esta é considerada improvável de acontecer pelo mercado, devido ao interesse no leilão.
A regra atingiria alguns das maiores armadores do mundo, como Maersk, MSC, DPW e CMA CGA. Os dois primeiros são sócios no terminal BTP. O último comprou, no ano passado, a Santos Brasil, hoje o principal terminal de movimentação de contêineres no porto.
A questão da judicialização é uma realidade porque a Maersk já havia entrado com ação pedindo a paralisação do leilão.
A Antaq justificava que a liberdade de concorrência poderia provocar concentração de mercado no principal porto do país. A área técnica do TCU recomenda que sejam adotadas medidas para mitigar essa possibilidade. Uma delas seria, em caso de vitória da Maersk ou MSC, que elas vendessem sua participação no BTP.
É o mesmo parecer enviado ao Tribunal pela Seae (Subsecretaria de Acompanhamento Econômico e Regulação) da Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda. O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) foi pelo mesmo caminho e avisou que poderia também analisar o assunto posteriormente.
Pessoas ligadas ao processo disseram à reportagem que esses dois pareceres foram também fundamentais para a recomendação do TCU.
“A adoção de licitação em fase única, com participação de todos os interessados no ativo, aliada à exigência de desinvestimento para eventual incumbente vencedor, proporciona maior concorrência pelo Tecon Santos 10”, opinou a Fazenda.
“A prática decisória da autarquia reconhece explicitamente que concentrações econômicas elevadas podem ser aceitáveis desde que coexistam com eficiências econômicas devidamente demonstradas, em consonância com as diretrizes legais e regulatórias mencionadas acima, ou que sejam mitigadas por meio de remédios antitruste”, informou o Cade.
O TCU também expôs pedido à APS para que “estude, defina e implemente, junto com os terminais portuários, os operadores ferroviários e a FIPS, um conjunto de indicadores de performance, obrigatórios, que busque garantir os tempos carga, descarga e operação dos trens, o que é imprescindível para o atingimento e manutenção das capacidades mínimas necessárias.”
Também advertiu o órgão que administra o porto sobre “fragilidades na gestão e planejamento das soluções para a melhoria da multimodalidade da infraestrutura portuária sob sua gestão, enquanto responsável legal e operacional por garantir a funcionalidade dos acessos”. Alertou quanto a necessidade de “planejar e fiscalizar a exploração dos portos e instalações portuárias, principalmente no tocante ao saneamento dos novos gargalos e da solução da passagens em nível no acesso aos terminais da margem direita [em Santos]”.
O Tecon 10 será instalado em uma área no bairro do Saboó, em Santos, de 622 mil metros quadrados. O projeto é que seja multipropósito, movimentando contêineres e carga solta. O vencedor do leilão será definido pelo modelo da maior outorga: ganha quem oferecer mais dinheiro pelo direito de construí-lo e operá-lo.
A capacidade vai chegar a 3,5 milhões de TEUs por ano (cada TEU representa um contêiner de 20 pés, ou cerca de 6 metros). Será o maior terminal do tipo no país.
Serão quatro berços (local de atracação do navio para embarque e desembarque). A previsão de investimento nos 25 anos de concessão pode chegar a R$ 40 bilhões.
A avaliação é que não haverá, pelo menos em Santos, o maior porto brasileiro, outra concessão de tal envergadura, principalmente pela falta de espaço na região.
O Tecon 10 se tornou alvo de disputas políticas e empresariais nos bastidores.
O governo de São Paulo, de Tarcísio de Freitas (Republicanos), enviou ofício ao Ministério dos Portos e Aeroportos manifestando contrariedade pelo modelo de leilão em duas fases.
Defensores das restrições, entre eles empresas que desejam participar do leilão e denunciam possível concentração econômica, falaram sobre supostas ligações de executivos de terminais portuários com o governador.
A companhia filipina ICTSI, operadora de concessões portuárias no Rio de Janeiro e em Suape (Pernambuco), enviou email ao TCU criticando o parecer do Ministério da Fazenda. Segundo a empresa, uma das que podem fazer oferta no terminal, medidas mitigantes não garantem a desconcentração do mercado.