Demissão de servidor por mau desempenho é pouco usada em outros países, aponta estudo

Uma image de notas de 20 reais

Imagem gerada por IA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A avaliação de desempenho de servidores é pouco usada como motivo para demissões em outros países, de acordo com um estudo de “benchmark” (padrões) sobre essa política publicado pelo Republica.org.

O trabalho também aponta que, geralmente, as metas de cada órgão têm alguma transparência, mas a nota dos próprios funcionários, não.

O tema das avaliações de funcionários públicos recebeu atenção porque, no Brasil, esse é um dos tópicos da reforma administrativa que é negociada na Câmara dos Deputados. Pelo texto apresentado nesta quinta-feira (2), servidores ficam sujeitos a avaliação de desempenho, e os que tiverem bom resultado poderão ganhar bônus anual de até quatro salários.

O bônus financeiro seria calculado com base em metas institucionais e individuais. Por exemplo, cada área de uma secretaria de saúde pode ter objetivos próprios a serem alcançados (como reduzir a fila de espera para consultas), mas também metas individuais para cada servidor, como o número de atendimentos feitos.

O levantamento de informações sobre o mecanismo em outros países foi feito por Rafael Leite, especialista em reforma e modernização do Estado e atualmente bolsista do programa German Chancellor Fellowship da Fundação Alexander von Humboldt.

Entre outros aspectos, Leite avaliou se os países dão nota de acordo com uma distribuição exógena (por exemplo, uma quantidade fixa de notas boas, notas médias e notas ruins), se há um efeito de “cascata” –ou seja, se o desempenho do servidor é, de alguma forma, relacionado a um cumprimento de metas do órgão onde ele trabalha – e se as notas são usadas para, eventualmente, demitir pessoas. Ele estudou Uruguai, Chile, Portugal, Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos.

Alguns países, como Reino Unido e EUA, têm processos claros de desligamento por baixo desempenho, mas raramente os aplicam.

No Chile e em Portugal existe a possibilidade legal de desligar, mas a aplicação disso é limitada.

Uruguai e Alemanha têm “extrema relutância em desligar servidores efetivos, priorizando não-promoção sobre exclusão”, diz o texto.

“Nos EUA e no Reino Unido as avaliações podem levar à demissão por baixo desempenho, mas os servidores pedem demissão quando veem que estão prestes a sere demitidos por baixo desempenho, para evitar ter essa mancha no currículo. Isso não entra no cálculo de pessoas que foram demitidas por desempenho. Há alguns documentos do caso americano que dizem isso.”

O procedimento é o seguinte: se o servidor tem duas ou três avaliações ruins seguidas, instaura-se um processo, que pode demorar até dois anos, para que a pessoa melhore suas notas.

As notas baixas, no entanto, são uma exceção: o normal é que as avaliações tenham um problema diferente, que Leite chama de “inflação de notas”: ou seja, os gestores dão notas altas para todos os subalternos.

Um dos mecanismos para evitar isso foi forçar uma distribuição de notas.

“O modelo de curva forçada agrada muito os economistas, porque deveria forçar os avaliadores a terem um critério para dar as notas, e isso foi tentado em vários departamentos, mas gerava um impacto muito negativo no trabalho em equipe, gerava um efeito negativo na moral da equipe”, ele afirma.

Portugal adotou uma espécie de distribuição forçada que limita as melhores notas: 30% dos servidores podem ter a avaliação “muito bom”, e dentro deste grupo, 10% do total de funcionários alcançam a nota máxima de “excelente”. Adicionalmente, 30% das avaliações são direcionadas para a nota “bom”. O resto das notas pode ser distribuída como os gestores preferirem.

Todos esses países vinculam avaliação a promoções e incrementos salariais, mas as regras são diferentes.

No Chile, por exemplo, há um bônus anual de acordo com a nota. Nos EUA e no Reino Unido também há bônus de desempenho, mas além disso os salários avançam mais. Na Alemanha e no Uruguai os servidores são promovidos de acordo com notas, e Portugal tem um sistema de pontos que contam para progressão na carreira.

EFEITO CASCATA

Um dos temas que o texto de Leite aborda é se há um “efeito cascata” que vincula as notas das instituições à avaliação de desempenho dos servidores que nelas trabalham

“A lógica de que a nota da instituição impacte a do servidor, embora óbvia, não é nova e influencia reformas no setor público desde os anos 1990. O verdadeiro desafio não é o conceito, mas sim aplicá-lo com consistência em todo o governo e permitir comparações entre as diferentes áreas e equipes.”

Ele aponta o caso de Portugal como um exemplo claro desse método: os objetivos estratégicos do órgão de governo são desdobrados em metas para os dirigentes e, por sua vez, em objetivos individuais dos trabalhadores. Ou seja, as entregas individuais –pelas quais eles são avaliados– devem estar vinculadas às prioridades estratégicas do órgão.

TRANSPARÊNCIA

As notas de agências e departamentos costumam ser públicas, mas a avaliação de cada funcionário geralmente permanece confidencial.

O que se observa em muitos sistemas é um meio-termo: a divulgação de dados agregados e anonimizados (ou seja, não é possível identificar a nota de uma pessoa específica). Publicam-se estatísticas, por exemplo, sobre a porcentagem de servidores em cada nível de desempenho dentro de um departamento.

Essa abordagem permite que se analise e compare o rigor da política de avaliação entre diferentes órgãos do governo, o que permite que o público acompanhe o que acontece sem que a identidade do servidor seja revelada.

.

MAIS LIDAS

Voltar ao topo