1º Seminário DC NEWS/Tendências: PIB em marcha lenta e crédito caro redesenham o varejo brasileiro

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Silvio Campos Neto, da Tendências: ajustes obrigatórios no próximo governo, seja qual for
(Andre Lessa/Agência DC News)
  • Economistas da FGV (Ricardo Meirelles de Faria) e da Tendências Consultorias (Silvio Campos Neto) traçam cenários e fazem projeções
  • Socióloga e pesquisadora Estela Brunhara aborda mudança de comportamento dos consumidores: "A régua subiu. Core não é mais suficiente"
Por Da Redação

[AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DC NEWS]
O primeiro seminário promovido pela AGÊNCIA DC NEWS uniu duas visões: a econômica (cenários para o varejo e para a economia) e comportamental (o que move ou afasta o consumidor?). Silvio Campos Neto (sócio e economista-sênior da Tendências Consultoria) e Ricardo Meirelles de Faria (professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo – EAESP-FGV) mostraram que a economia brasileira já iniciou um movimento de desaceleração, embora o mercado de trabalho ainda se mostre fortalecido. Entre um e outro, Estela Brunhara, diretora de Consumer Behavior & Strategy da consultoria Futurebrand, expôs o que leva o consumidor a fazer suas opções de compra – isto é, a escolha de uma marca tem critérios racionais e emocionais. O tema do seminário realizado nesta terça-feira (7) foi justamente Entre o Bolso e a Emoção – Os Desafios do Varejo em Conquistar o Consumidor. “Instigante”, disse o presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Roberto Mateus Ordine, na abertura do seminário: “É nossa espinha dorsal.”

Segundo Campos Neto, o próximo governo, seja qual for, terá de fazer ajustes. “Principalmente do ponto de vista dos gastos, vai ser preciso pôr o pé no freio”, afirmou. “Estamos diante de um esgotamento das margens orçamentárias.” Ele observou que o país conseguiu promover reformas importantes das contas públicas no período de 2016 a 2019. “Já conhecemos o caminho.” Medidas recentes, como aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda, dão fôlego à economia, mas não mudam o cenário. Assim como o mercado de trabalho, cuja atual taxa de desemprego é a menor da série histórica. “Esperamos perda do dinamismo nos próximos meses”, disse Silvio, ao apontar fatores como redução da confiança do consumidor e pressão sobre a situação financeira das famílias. Ao responder a uma pergunta da plateia, o economista fez uma crítica ao governo, que para ele, em relação ao mercado de trabalho, mantém a cabeça nos anos 1980, quando deveria olhar para as transformações que acontecem velozmente. A observação vale para o que ele chama de falta de visão de longo prazo: “A gente precisa de um debate que olhe para questões mais estruturais”.

Para o PIB, o economista-sênior da Tendências projeta crescimento de 2,2% neste ano, ante 3,4% em 2024. A diminuição do ritmo continua em 2026 (1,6%) e 2027 (1,2%), para certa recuperação a partir dos anos seguintes, chegando a 2,3% em 2030. O consumo das famílias, que cresceu 4,8% em 2024, deverá desacelerar para 1,9% neste ano e ainda mais em 2026 (1,3%) e 2027 (0,8%). A inflação (IPCA) de 2025 ficará em linha com a de 2024 (4,8%). Vai desacelerar, mas ainda distante da meta: 4,3% em 2026 e 3,9% em 2027, pelas estimativas da consultoria. A massa de renda continuará crescendo, também em menor ritmo: 4,8% em 2025 e 3,4% em 2026. Crédito mais restrito e inadimplência em alta completam o cenário: “O aumento do comprometimento da renda é ponto de atenção”.

Escolhas do Editor

Na exposição – mediada pela editora da DC NEWS Bruna Lencioni –, Campos Neto também falou sobre o cenário externo. Perda de força da economia norte-americana, maior incerteza institucional e fiscal, com o dólar mais fraco globalmente. A China, com desaceleração em curso, mas com presença ampliada na economia mundial nas duas últimas décadas. “[Temos] abundância de produtos industriais chineses competitivos. A China agora consegue exportar produtos de valor agregado muito mais alto.”

Ricardo Meirelles de Faria da FGV compartilha sua expectativa do varejo para 2026
(Andre Lessa/Agência DC News)

UP/DOWN – No terceiro painel, Faria, da FGV, também destacou os altos e baixos (up/down) da economia brasileira. De um lado, massa salarial em alta, reforma tributária, valorização da moeda. De outro, desaceleração do varejo, pressão fiscal, juros, inadimplência, falta de coordenação entre as políticas monetária e fiscal. Ele apresentou a quinta edição do Indicador de Tendência de Consumo e Varejo (ITCVcev), elaborado pelo Centro de Excelência em Varejo da FGV-EAESP e pela FFC-MDS Serviços. As projeções para o PIB indicam 2,3% neste ano e no próximo. A taxa de desemprego permaneceria em níveis historicamente baixos (5,1% em 2025 e 2026). O dado mais recente, relativo ao trimestre encerrado em agosto, é de 5,6% – menor taxa da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE.

O economista detalhou ainda as projeções para o varejo ampliado e restrito, classificações da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), também do IBGE. Em 2024, o ampliado (que inclui material de construção, veículos/motos/peças e atacado de alimentos) cresceu 4,1%. O restrito, 4,7%. A FGV espera retração de 0,6% neste ano e pequena alta, próxima da estabilidade (0,12%) no próximo para o ampliado. Para o restrito, +1,2% (2025) e +0,7% (2026). O segmento de hiper&supermercados, que abrange o varejo de alimentação, também ficaria bem abaixo de 2024, quando cresceu 4,6%: +1,1% neste ano e +1,5% no próximo.

No documento, apresentado durante o seminário, Faria falou sobre possíveis efeitos positivos da recente Reforma Tributária – com a ponderação de que a mudança ainda suscita dúvidas sobre a carga efetiva. Mesmo considerando que a transição deverá levar uma década, o fim do que o economista chama de “manicômio tributária” deverá reduzir custos operacionais das empresas e a inadimplência, aumento a competitividade. “Enfim uma reforma estrutural que terá impactos extremamente positivos para a economia brasileira.” Mesmo com os dados indicando desaceleração, o tom é de otimismo moderado. “Esperamos que o pior esteja passando”, afirmou, ao responder questionamento do head de Conteúdo da DC NEWS, Edson Rossi, sobre o desafio do empreendedor para navegar em mares revoltos. Com o custo do capital elevado, uma recomendação é evitar atitudes intempestivas: “O custo do crédito não é para amadores”.

Estela Brunhara da consultoria Futurebrand alerta: experiência de compra importa, e muito, no varejo atual
(Andre Lessa/Agência DC News)

MARCA – Entre as duas análises sobre a situação e as perspectivas para a economia, a socióloga Estela Brunhara, que há 15 anos se dedica a pesquisas de mercado e de comportamento, mostrou as idas e vindas daquele que determina os rumos do varejo. A pergunta básica: por que os consumidores fazem suas escolhas? “As pessoas escolhem o que comprar pelos seus valores”, disse a diretora da Futurebrand. Mas quais pessoas? As que se declaram felizes ou que fizeram o Brasil cair no ranking da felicidade das Nações Unidas? As que não têm acesso à internet ou as viciadas em celulares? Entre critérios racionais e emocionais de escolha, um conduz a narrativa: a marca. “Tudo constrói marca. É muito mais que comunicação”, afirmou Estela, em painel conduzido pelo cientista político Rafael Cortez, sócio da Tendências. “A régua subiu muito nos últimos anos. O core [a atividade central de uma empresa] não é mais suficiente.”

Crises e incertezas globais levam a uma situação de um consumidor – agora, um impaciente crônico – que não quer errar na hora da compra. A confiança, diz a pesquisadora, se estabelece na entrega, não na promessa de quem apresenta o produto. “Eles [consumidores] querem vivenciar a marca.” Assim, o mercado deixa a era das love brands, as marcas amadas, para a era da experiência. É a experiência que leva à emoção, não o contrário. Critérios racionais ganham valor simbólico. Outro fator é a chamada omnicanalidade, neologismo para definir a necessidade de as empresas integrarem todos os seus canais de atendimento – do latim omnis (todos) e do inglês channel (canal). “O consumidor já não separa digital de físico”, afirmou Estela. O consumidor “equilibra” bolso, desejo, risco e significado. O racional percebe valor, e o emocional valida. A uma pergunta sobre perfis socioeconômicos, ela relativiza com um exemplo: o cantor Ozzy Osbourne e o Rei Charles III. Ambos de classes sociais próximas, da mesma idade e ingleses. Porém, pessoas completamente diferentes.

O primeiro seminário da DC NEWS mostra, segundo Rossi, que uma agência não pode ser apenas uma propagadora de notícias. “Ela precisa ser polo de discussão. Um centro de debates, de ideias.” A agência realizará mais um seminário neste ano, em dezembro, e cinco no ano que vem. “O nosso país precisa matar as crenças para investir na ciência.” Mas com respeito às tradições – como no Prêmio Comércio Histórico.

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