BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O novo modelo de crédito habitacional deve injetar, de forma imediata, pelo menos R$ 20 bilhões em recursos para a contratação de financiamentos para a compra da casa própria. As mudanças serão anunciadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em evento na próxima sexta-feira (10) em São Paulo.
O desenho ainda deve vir acompanhado do aumento do valor máximo dos imóveis financiados por meio do SFH (Sistema Financeiro de Habitação), que permite o uso do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) para a compra da casa própria. Desde 2019, esse teto é de R$ 1,5 milhão. Segundo quatro interlocutores do governo, o valor pode subir para perto de R$ 2 milhões.
– Como usar o FGTS para comprar um imóvel? Confira as exigências
As mudanças fazem parte de um novo modelo que vem sendo discutido por Executivo, Banco Central e instituições financeiras para criar uma alternativa sustentável ao financiamento habitacional, já que a poupança, hoje principal fonte de recursos baratos para o crédito à compra da casa própria, tem dado sinais de esgotamento diante de outros tipos mais rentáveis de investimento.
A transição para o novo modelo prevê a liberação imediata de uma parcela de 5% dos recursos da poupança, hoje parada em depósitos compulsórios no Banco Central.
A partir disso, o valor adicional efetivamente disponível vai depender da adesão inicial dos bancos que operam o crédito imobiliário. No caso da Caixa Econômica Federal, líder do segmento, esse montante equivale a algo entre R$ 20 bilhões e R$ 25 bilhões.
A Caixa deve entrar forte no novo modelo de crédito habitacional, por isso o valor da liberação de seu compulsório é tratado pelos técnicos como uma espécie de piso para a nova política neste momento.
O valor disponível pode ficar maior à medida que outros bancos que também têm recursos parados no compulsório façam a adesão. Mas a adoção do modelo por outras instituições ainda é incerta, visto que o teto de juros do SFH pode ser um entrave. Hoje, a maior parcela do financiamento dos bancos se enquadra no SFI (Sistema de Financiamento Imobiliário), que concede empréstimos a taxas de mercado.
O período de teste deve durar até o fim de 2026 e foi um pedido do setor da construção civil, que temia os efeitos de uma mudança muito brusca no modelo e defendeu uma fase de testes. O pleno funcionamento do novo desenho, se bem-sucedido, deve se dar a partir de 2027.
Como mostrou a Folha, o novo modelo de crédito habitacional vai fixar um prazo para o uso mais flexível dos recursos da poupança pelas instituições financeiras. Ao fim do período, os bancos precisarão conceder novos financiamentos imobiliários para continuar usufruindo dos recursos da caderneta com maior liberdade na aplicação.
O novo modelo de crédito habitacional prevê maior flexibilidade no uso de recursos do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo), que são uma fonte de captação mais barata para os bancos, pois a remuneração aos poupadores fica abaixo das taxas de mercado.
Hoje, os bancos recebem os depósitos dos clientes na poupança e precisam direcionar pelo menos 65% dos recursos para operações de financiamento imobiliário, além de deixar 20% do valor depositado compulsoriamente no BC.
No novo modelo, não haverá direcionamento da poupança para o crédito imobiliário, nem depósito compulsório. O dinheiro da caderneta ficará sem carimbo, e o banco poderá usá-lo para fazer outras aplicações com rendimentos maiores, desde que tenha concedido financiamentos habitacionais em valor correspondente.
O prazo para esse uso flexível vai variar conforme o valor dos imóveis financiados, de forma a incentivar os bancos a centralizarem seus recursos nas operações dentro do SFH.
Segundo duas pessoas a par das discussões, o prazo padrão será de cinco anos e valerá para os financiamentos fora do SFH, isto é, acima de R$ 2 milhões. Dentro do SFH, haverá dois prazos para a flexibilização da poupança: sete anos no caso de financiamentos de imóveis até R$ 1 milhão e seis anos no caso de operações entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões.
A intenção é quebrar o vínculo direto que existe hoje entre poupança e crédito imobiliário e incentivar a migração para fontes de financiamento (funding) de mercado, usando instrumentos que já existem, como a LCI (Letra de Crédito Imobiliário).
Os ganhos obtidos pelas instituições com o uso flexível da poupança, por sua vez, seriam usados para manter juros menores no crédito habitacional, amenizando o repasse do custo de mercado para os mutuários. Simulações feitas pelos técnicos indicam que usar a poupança para fazer essa equalização é suficiente para manter estável o custo do crédito imobiliário para os tomadores.
Na prática, o novo modelo funcionará da seguinte maneira: o banco empresta R$ 100 em crédito imobiliário, tendo como fonte de recursos R$ 100 captados no mercado por meio de LCI. A concessão do financiamento habitacional desbloqueia R$ 100 da poupança para uso livre.
Inicialmente, o Banco Central pretendia aceitar qualquer tipo de financiamento habitacional como contrapartida ao uso livre da poupança, descontando apenas operações do FCVS (Fundo de Compensação de Variações Salariais), fundo público criado para regularizar passivos do antigo sistema de habitação, e prejuízos acumulados em função de aquisições feitas no passado.
No governo, porém, havia uma preocupação de que isso acabasse concentrando recursos apenas em financiamentos para famílias de maior renda.
Pelo desenho final, segundo pessoas que participam das discussões, além do incentivo por meio dos prazos diferenciados, 80% do valor liberado irá para o SFH, com taxa de juros máxima de 12% ao ano. Os outros 20% irão para o SFI. A divisão valerá inclusive para os recursos liberados do compulsório.
Nesta terça-feira (7), o ministro Jader Filho (Cidades) confirmou que o novo modelo será anunciado na próxima sexta-feira.
Havia a expectativa de que a linha de crédito para reformas também fosse anunciada nesta sexta. No entanto, isso deve ocorrer em outro momento, já que o governo ainda faz ajustes no sistema que vai operacionalizar esses financiamentos.